Recursos

AutorChristovão Piragibe Tostes Malta
Ocupação do AutorAdvogado. Juiz aposentado
Páginas413-480
413
PRÁTICA DO PROCESSO TRABALHISTA
21º Capítulo RECURSOS
449449
449449
449 GeneralidadesGeneralidades
GeneralidadesGeneralidades
Generalidades. A matéria recurso está ligada ao princípio do duplo grau de jurisdição.
Antigamente e ainda hoje, em alguns Estados, a Justiça era uma emanação do poder real. O rei
assegurava a distribuição da Justiça. Surgiu, então, a possibilidade de a parte, inconformada
com a decisão de quem julgasse o feito, recorrer ao rei, que era o órgão supremo do Estado.
Assim, nasceu a ideia do recurso, que encontrou grande resistência através dos tempos.
Encontram-se precedentes do recurso na legislação babilônica, na canônica, na egípcia, na
grega, na hebraica e na romana. Depois da Revolução Francesa, o princípio ficou consagrado
universalmente. Debatendo-se a respeito dessa dupla jurisdição, argumenta-se que, se o juiz
funciona como órgão imparcial, não há necessidade de se reverem suas sentenças. Ademais, se
reformadas as decisões, haveria, em consequência, o desprestígio da Justiça, por concluir-se
que a primeira ou a segunda decisão estava errada. O princípio do duplo grau de jurisdição,
contudo, tem suas vantagens. Faz com que os juízes sejam mais cautelosos em suas decisões,
sabendo que elas serão revistas. Por outro lado, presume-se que os juízes da segunda instância
sejam mais experimentados e que tenham mais conhecimento do que os da primeira, dessa
forma contribuindo os recursos para o aprimoramento da solução dos conflitos de interesses.
Isso, contudo, é bastante discutível no Brasil, desde que os juízes do primeiro grau são
concursados e parte dos juízes dos graus superiores não. Argumento mais interessante em
favor da dupla jurisdição é o de que as partes normalmente não se conformam com uma decisão
única. Assim, a existência de recursos é uma necessidade psicológica e concorre para maior
segurança e tranquilidade sociais, pois, na eventualidade de um erro na prestação jurisdicional,
tem-se oportunidade de ver a matéria novamente discutida em segunda instância, onde os
órgãos em geral são colegiados. Tudo isso contribui para evitar-se o arbítrio indesejável do juiz
único e de pronunciamento imutável. É bem verdade, entretanto, que os recursos tornam os
processos mais morosos, principalmente quando admitidos de decisões interlocutórias, o que
não se verifica no processo trabalhista. Outro fundamento importante em favor dos recursos é
o de que contribuem para a uniformização da jurisprudência, principalmente os extraordinários
(revista etc.).
Nosso sistema recursal, como todo o direito processual, é incrível e inutilmente
complicado, inclusive dando uma importância exagerada a certos recursos. Assim, a
uniformização da jurisprudência prevalece sobre a celeridade processual, o que, em incontáveis
demandas contribui para que não seja feita justiça.
Os vícios da prestação jurisdicional que se podem impugnar mediante recursos são
endógenos, isto é, da decisão em si, como a violação literal da lei, ou exógenos, estranhos ao texto
da sentença, como ocorre quando é prolatada por ter o juiz sido corrompido(1).
Recurso, no processo civil e trabalhista brasileiro, é o remédio idôneo para obter-se, dentro
do mesmo processo, a reforma, a invalidação, o esclarecimento ou a integração da prestação
(1) MARTINS, Sergio Pinto. Direito processual do trabalho. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2005. p. 400.
414 TOSTES MALTA
jurisdicional (sentença, acórdão). É um prosseguimento da ação em que se prolatou a decisão
recorrida.
Dos despachos, não cabe recursos (CPC 504).
Havendo mudança da lei durante o processo, o recurso cabível é o previsto na lei vigente
quando prolatada a sentença e não a em vigor no dia da interposição do apelo, salvo se a matéria
for de natureza constitucional, quando, segundo o STF, se aplica a lei do dia do recurso.
Há controvérsia entre os estudiosos a propósito da natureza dos recursos, sendo apontados
como ação, como direito subjetivo etc. A ação na verdade compreende o direito de recorrer.
O recurso se distingue das ações autônomas de impugnação de decisões porque, sendo
interposto no mesmo processo em que está a decisão impugnada, não pode voltar-se contra a
prestação jurisdicional transitada em julgado, diversamente do que ocorre com ações autônomas,
como a rescisória. Já o mandado de segurança, que, em alguns casos, pode ser utilizado como ação
autônoma de impugnação de sentença, não pode atacar decisão transitada em julgado.
Etimologicamente, recurso significa retorno, caminho de volta, regresso.
Quanto à extensão, os recursos são totais ou parciais, conforme se dirijam a modificar
toda a decisão recorrida ou apenas parte dela.
A doutrina dominante considera o recurso como total quando não esclarece a parte da
decisão que impugna. Coerentemente com as exigências da lei quanto às formalidades das
petições iniciais, que devem ser claras, precisas, o recurso que não esclarece o que reivindica é
inepto e deve ser indeferido.
De toda sorte o recurso pode voltar-se contra toda a sentença ou apenas contra uma
parte.
Há muitas classificações propostas pelos doutos para os recursos. Os recursos, por
exemplo, podem ser suspensivos, quando impedem que se proceda à execução da decisão
recorrida, e devolutivos, quando autorizam a execução provisória da decisão; reiterativos, quando
julgados por tribunal diverso do que prolatou a decisão recorrida; comuns ou ordinários, quando
a mera sucumbência autoriza sua interposição, como sucede com o recurso ordinário; e especiais
ou extraordinários, quando, além da sucumbência, é necessário que o recorrente evidencie que
atendeu a exigências especiais previstas na lei, como se dá com os recursos de revista e
extraordinário.
Alguns autores dividem os recursos em dirigidos ou não contra o mérito da decisão impugnada.
De um modo geral, no entanto, o mesmo recurso pode ser dirigido contra o mérito e questão
estranha a este, pedindo o recorrente, por exemplo, que se anule a decisão recorrida por
cerceamento de defesa ou que seja dado provimento ao recurso, no mérito, para julgar-se a
reclamação procedente.
Conforme outro critério, os recursos podem ser retroativos ou impróprios, quando julgados
pelo órgão judiciário que prolatou a decisão recorrida, como sucede com os embargos de
declaração, e não retroativos ou próprios, quando julgados por outro órgão, de maior hierarquia,
como o recurso ordinário(2).
(2) GONÇALVES, Odonel; MANUS, Pedro Paulo Teixeira. Recursos no processo do trabalho. São Paulo: LTr, 1997.
p. 7.
415
PRÁTICA DO PROCESSO TRABALHISTA
As questões de fato que não forem suscitadas na instância recorrida só podem ser arguidas
no recurso se a parte provar que deixou de fazê-lo anteriormente em razão de força maior (CPC
517).
A matéria de direito, segundo tem sido sustentado, pode ser debatida mediante os recursos
ordinários independentemente de prequestionamento. Quanto aos recursos extraordinários
(revista, por exemplo), prevalece o entendimento de que só podem ser interpostos a propósito
do que foi tempestivamente prequestionado. A matéria concernente a fatos posteriores ao recurso
cuja decisão é impugnada, obviamente, não poderia ter sido prequestionada e pode ser objeto
de recurso extraordinário. Ex.: um juiz impedido é convocado para o julgamento de um recurso
ordinário. Essa questão pode ser debatida no recurso de revista.
No processo trabalhista, prevalece o princípio de unirrecorribilidade dos recursos, isto é,
não podem ser interpostos simultaneamente pela mesma parte dois ou mais recursos.
450450
450450
450 Ônus prÔnus pr
Ônus prÔnus pr
Ônus processualocessual
ocessualocessual
ocessual. O recurso é um ônus processual. Quem recorre não exerce
propriamente um direito, porque não há um dever contraposto à interposição de recurso.
Quem recorre se desincumbe de um ônus; ao recorrer, apenas pretende uma vantagem que
perderia se não recorresse.
451451
451451
451 Objeto do rObjeto do r
Objeto do rObjeto do r
Objeto do recursoecurso
ecursoecurso
ecurso. O recurso visa a provocar a revisão de uma decisão judicial; não cria
outra relação processual, mas um segundo grau de jurisdição. Na realidade, quando a parte
recorre, ela amplia, prorroga a instância, a relação processual. Com a sentença extingue-se a
instância ou o grau de jurisdição; mas, a parte vencida pode impedir, mediante recurso,
a formação de coisa julgada.
452452
452452
452 PrPr
PrPr
Pressupostos dos ressupostos dos r
essupostos dos ressupostos dos r
essupostos dos recursosecursos
ecursosecursos
ecursos. São as condições indispensáveis para a sua válida
interposição. Consoante a doutrina, são objetivos e subjetivos, também ditos extrínsecos e
intrínsecos.
Pressupostos objetivos ou extrínsecos são os que dizem respeito ao recurso em si.
É pressuposto objetivo a adequação. É preciso que a parte recorrente escolha o recurso
adequado, sem o que o recurso não será sequer conhecido pelo tribunal ad quem.
Como pressupostos objetivos secundários encontram-se as formalidades reguladas pela lei,
como o pagamento de custas, a obediência a prazo e a efetivação de depósito.
Pressuposto subjetivo ou intrínseco ou lesividade: sucumbência. É a situação desfavorável
em que uma das partes fica, em razão de ter sido vencida. É o pressuposto fundamental do
recurso. Traduz o direito de recorrer. Assim, só pode recorrer aquele que tenha sido vencido,
embora parcialmente. Não há sucumbência quando o juiz, conquanto não atendendo aos
fundamentos jurídicos da parte, decide em seu favor.
A parte que aceitar expressa ou tacitamente uma decisão da mesma não pode recorrer
(CPC 503). Ocorre renúncia ao direito de recorrer.
O terceiro interessado e o Ministério Público, este tanto nos processos em que é parte
como naqueles em que atua como custos legis podem recorrer.
O INSS pode recorrer da parte da sentença que fixa o valor sobre o que incidirá a
contribuição previdenciária (CLT 831).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT