Recurso Ordinário - Programa 'Operação Trabalho' do Município de São Paulo - Contratação Precária de Empregados Bolsistas - Concessão de Efeito Suspensivo a Recurso do Município

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EXMO. SR. DR. JUIZ PRESIDENTE DO EG. TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA SEGUNDA REGIÃO

Processo TRT/SP n. 00112.2009.000.02.00-6

O Ministério Público do Trabalho da 2ã Região, por sua Procuradora Regional do Trabalho, nos autos da ação cautelar ajuizada pelo Município de São Paulo e com base nos arts. 746, f, da CLT c/c o art. 83, VI, da Lei Complementar n. 75/93, vem, mui respeitosamente, à presença de V. Exa. interpor o presente

RECURSO ORDINÁRIO

ao Colendo Tribunal Superior do Trabalho, em face do v. acórdão proferido pela Eg. 9ã Turma deste Regional, nos termos do art. 895, inciso II, da CLT, com a redação dada pela Lei n. 11.925/09, pelas razões anexas.

Requer seja o presente apelo regularmente processado, com a consequente remessa dos autos à Colenda Superior Instância.

Termos em que, pede deferimento. São Paulo, 15 de dezembro de 2009.

Sandra Borges de Medeiros Procuradora Regional do Trabalho

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Processo n. 00112.2009.000.02.00-6 Recorrente: Ministério Público do Trabalho Recorrido: Município de São Paulo

RAZÕES DE RECURSO ORDINÁRIO

Egrégio Tribunal, Colenda Turma,

I Dos fatos

Este Ministério Público, no uso de suas atribuições institucionais, propôs Ação Civil Pública em face do Município de São Paulo — Secretaria Municipal do Trabalho, objetivando por fim à situação denominada "Operação Trabalho", por se tratar de prática violadora de Direitos Fundamentais como o da dignidade do trabalhador, sob pena de aplicação de multa diária, além de pagamento de indenização pelo dano genérico causado, reversível ao FAT.

A ação foi julgada procedente em parte "1. Determinar que a reclamada cesse a contratação dos trabalhadores que se encontrem vinculados ao programa "operação trabalho", pagando-lhes o fundo de garantia por tempo de serviço; 2. Proibi-la de manter contratações por meio desse programa, pena de multa; 3. Condenar a reclamada a pagar aos trabalhadores que já integraram o referido programa, em 30 dias do trânsito em julgado, pena de multa, a indenização pelo fundo de garantia do tempo de serviço do período e 4. Condenar a reclamada a pagar ao FAT indenização por danos morais coletivos".

Na mesma decisão, foi concedida a tutela antecipada requerida na petição inicial, porque preenchidos os requisitos do art. 273, do Código de Processo Civil.

Inconformado, o município réu apresentou Recurso Ordinário e, além disso, ajuizou junto ao Eg. TRT 2ã Região ação cautelar com pedido de tutela liminar inaudita altera parte, a fim de conferir efeito suspensivo ao apelo interposto.

A liminar foi deferida e os magistrados da Eg. 9ã Turma do Regional julgaram procedente a ação cautelar para "confirmando a liminar deferida às fls. 294/296, suspender os efeitos da tutela antecipada concedida na r.sentença prolatada nos autos da ação civil pública distribuída sob número 01901.2008.089.02.00-9 perante o MM. Juízo da 89ã Vara do Trabalho de São Paulo, até o julgamento do reexame necessário e do apelo voluntário" (acórdão n. 20090849692).

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II Das razões do pedido de reforma

Contudo, data máxima vênia, do entendimento exarado pelos ilustres julgadores da 9ã Turma, a concessão de efeito suspensivo ao recurso ordinário impede que se dê efetividade ao comando exarado na sentença em conformidade com os princípios constitucionais norteadores da proteção do trabalho, violando direitos sociais dos trabalhadores tutelados em sede de ação civil pública.

Permitir a continuidade da citada "operação trabalho" mantida pelo Município de São Paulo equivale a negar vigência aos princípios da dignidade da pessoa humana e da igualdade, constitucionalmente assegurados pela Carta Magna em vigor.

Nos autos da ação civil pública restou evidenciado que o Município de São Paulo mantém trabalhadores lhe prestando serviços sem que se enquadrem em regime celetista ou estatutário, recebendo apenas quantia próxima de R$ 399,00, sem depositar-lhes FGTS, contribuições previdenciárias ou fornecer-lhes gratificações natalinas, simplesmente por entender que tais obreiros participam de um "Programa Social".

Tal grau de desrespeito à ordem trabalhista vigente foi constatado pelo Exmo. Juiz do Trabalho Dr. Marcos Neves Fava, da 89ã VT/SP, que brilhantemente julgou procedente em parte a ação civil pública, deferindo a liminar requerida pelo Ministério Público do Trabalho com vistas a cessar imediatamente a prática irregular.

Cumpre ressaltar que já no seu primeiro artigo, no inciso III, a Constituição erige a dignidade humana como fundamento da República Federativa do Brasil. E, igualmente, no mesmo artigo, no inciso IV, o constituinte elegeu o valor social do trabalho também como fundamento do Estado Brasileiro, posicionando o trabalhador como titular de direitos de igual dignidade.

O art. 3e, incisos III e IV, da Constituição Federal, por seu turno, menciona como objetivos da República Federativa do Brasil a erradicação da pobreza e a margina-lização, com a redução das desigualdades sociais e regionais, bem como promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, etnia, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Interpretando-se sistematicamente a previsão dos arts. 1e e 3e, da Constituição Federal, verifica-se que estes dispositivos afastam a compreensão meramente individualista da dignidade, para encartá-la em uma dimensão comunitária (ou social) justamente por serem todos iguais em dignidade e direitos (na iluminada fórmula da Declaração Universal de 1948) e pela circunstância de nesta condição conviverem em determinada comunidade.

Assim, quando a Constituição Federal entabula o valor da pessoa humana como um princípio fundamental no art. 1e, inciso III, conjugado com o art. 3e, verifica-se que este deve ser efetivado sob diferenciados aspectos no contexto societário, seja no tocante ao próprio interesse individual da pessoa, seja no plano econômico ou social.

Observa-se, ainda, que a Lei Maior garante amplitude temática ao princípio da dignidade da pessoa humana, descrevendo dimensões deste princípio, especialmente em seu art. 5e, ao garantir a igualdade de todos perante a lei e a inviolabilidade de seus direitos, no art. 170, ao determinar que a ordem econômica garanta a todos uma existência digna e, em seu art. 193, ao exigir que a ordem social tenha como objetivos

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o bem-estar e a justiça social, sempre tendo como foco central o princípio da dignidade da pessoa humana e como princípio fundamental de todo o ordenamento jurídico brasileiro.

Seguindo essa esteira de raciocínio Carmen Lúcia Antunes Rocha afirma que a Constituição Federal de 1988 contemplou a dignidade sob dois enfoques distintos, o do direito à vida digna (art. 5e, caput: "Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:...") e o do direito à existência digna (art. 170: "A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os...

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