Recuperação judicial. Cessão fiduciária de direitos creditórios

AutorPaulo Fernando Campos Salles de Toledo
Páginas272-288
REVISTA DE DIREITO MERCANTIL 166/167
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I. A consulta
Os ilustres Advogados AA, que
representam em juízo BB, nos processos
de recuperação judicial impetrados por
empresas que o integram, honram-me com
a consulta abaixo reproduzida.
Considerando os fatos descritos
abaixo:
I – Da relação entre BB e CC
Em 4.7.2013, a empresa DD S.A. emi-
tiu 3 (três) Cédulas de Crédito à Exportação
(“CCEs”) emitidas pelos Bancos EE, FF, e
CC, atual denominação de QQ, fi gurando
o EE como Banco Líder da operação. Por
meio destas CCEs, assumiu-se a promessa
de pagamento do valor histórico de R$
100.000.000,00 (cem milhões de reais).
1. Tais CCEs estavam garantidas
por meio da cessão fi duciária de direitos
creditórios decorrentes e a serem pagos
pela empresa HH do contrato (“Contrato”)
celebrado com a empresa DD S.A., confor-
me previsto no “Instrumento Particular de
Contrato de Cessão Fiduciária de Direitos
Creditórios em Garantia e Outras Avenças”
(“Instrumento de Cessão”).
2. Referida garantia fiduciária foi
concedida simultaneamente de forma “sin-
dicalizada” a três CCEs distintas, emitidas
pelos Bancos EE, FF e CC, fi gurando o EE
como Banco Líder da operação.
3. O Instrumento de Cessão previ a,
como garantia do pagamento da CCE,
50% dos direitos creditórios, principais e
acessórios – incluindo os direitos, prerro-
gativas e privilégios – presentes e futuros,
de titularidade da DD S.A. em face da HH,
oriundos do Contrato.
4. Posteriormente, em 29.8.2014 foi
ajuizado o pedido de recuperação judicial
das empresas que são denominadas, con-
juntamente, “BB” ou “Recuperandas”.
Em decisão proferida em 15.9.2014, foi
deferido o processamento da recuperação
judicial conjunta das nove empresas. O
Plano de Recuperação Judicial (“Plano”) foi
aprovado em sede de Assembleia Geral de
Credores (“AGC”) realizada em 13.5.2015
– 2a Convocação, atendendo os quóruns le-
gais previstos no art. 45 da Lei 11.101/2005
(“LFRE”), e homologado pelo D. Juízo da
Recuperação em decisão proferida na data
de 21.5.2015.
5. Na ocasião do ajuizamento, o crédi-
to detido por CC foi arrolado como crédito
extraconcursal pelo fato de que estava ga-
rantido pela cessão fi duciária de recebíveis,
o que foi posteriormente confi rmado pela Il.
Administradora Judicial quando da elabo-
RECUPERAÇÃO JUDICIAL.
CESSÃO FIDUCIÁRIA DE DIREITOS CREDITÓRIOS
P F C S  T
I. A consulta. II. O parecer: 1. Considerações iniciais. 2. Cessão duciária de
recebíveis: 2.1 Cessão de créditos atuais e futuros; 2.2 Aplicação nos proces-
sos concursais; 2.3 Bens essenciais à atividade empresarial; 2.4 Competência
do juízo da recuperação. 3. A bússola: a preservação da empresa. 4. Respostas
aos quesitos.
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PARECERES
ração da sua relação de credores conforme
prevê o § 2o do art. 7o da LFRE.
6. Após o deferimento do pedido de
recuperação judicial, a HH notifi cou a DD
S.A., na data de 1.12.2014, comunicando
a rescisão unilateral do contrato celebrado
entre as partes em função de alegados des-
cumprimentos contratuais pela DD S.A.
Discordando da rescisão unilateral, a DD
S.A. ajuizou Medida Cautelar de Produção
Antecipada de Provas autuado perante a
Vara Cível da Comarca do Rio de Janeiro,
com a intenção de se apurar futura indeni-
zação em face de HH.
7. Em função da rescisão contratual,
BB ajuizou, em 5.2.2015, impugnação de
crédito contra a lista elaborada pela Il. Ad-
ministradora Judicial, visando a retifi cação
da classifi cação do crédito da CC para a
classe dos credores quirografários, demons-
trando que (i) a garantia do crédito da CC
se esvaziou ante a rescisão contratual aper-
feiçoada e apenas noticiada pela HH; (ii) a
natureza do crédito era consequentemente
quirografária, apenas caracterizada como
extraconcursal em decorrência da garantia
anteriormente constituída; (iii) a CC, ao
penhorar outros bens da BB, abriu mão de
sua garantia (“Impugnação de Crédito CC”).
8. Em paralelo, a CC ajuizou ação de
execução de título extrajudicial em face da
BB, em trâmite perante o D. Juízo da Execu-
ção, oportunidade em que requereu o arresto
de diversos bens de titularidade da BB.
9. Partindo da premissa de extracon-
cursalidade do crédito, nos termos do art.
49, § 3o, da LFRE, o D. Juízo da Execução
deferiu a penhora dos créditos da II junto
a JJ, que estavam consignados na ação
em trâmite perante o D. Juízo da Vara da
Fazenda Pública da Comarca de São Paulo.
10. Contra essa decisão, BB interpôs
Agravo de Instrumento 203, o qual foi dis-
tribuído para a Câmara Reservada de Direito
Empresarial do E. Tribunal de Justiça de São
Paulo (“TJSP”), em função da prevenção
para julgar recursos que envolvam questões
da recuperação judicial, visando a reforma
da r. decisão para que fosse reconhecido (i)
a concursalidade do crédito da CC e (ii) a
impossibilidade de penhora de outros bens
diversos à garantia prestada. Este recurso foi
desprovido com observação pelo E. TJSP,
consignando que o arresto deveria respeitar
os limites da garantia prestada. Atualmente
este recurso encontra-se em fase de recurso
especial, aguardando elaboração de pare-
cer pela D. Procuradoria Geral de Justiça
(“PGJ”) para posterior juízo de admissibi-
lidade pelo E. TJSP.
11. Paralelamente à interposição do
Agravo de Instrumento 203, BB pleiteou
ao D. Juízo da Recuperação a suspensão da
execução movida pela CC ou, sucessiva-
mente, que os atos constritivos recaíssem
apenas sobre a sua garantia. Em sequência,
o D. Juízo da Recuperação decidiu que o
crédito da CC é extraconcursal até o limite
de sua garantia, podendo a execução recair
apenas sobre os direitos decorrentes do
contrato fi rmado com HH.
12. Tal decisão foi objeto de recurso
tanto pela CC (Agravo de Instrumento 210),
o qual já transitou em julgado, e por BB
(Agravo de Instrumento 202), que por sua
vez encontra-se em fase de recurso especial,
aguardando elaboração de parecer pela D.
PGJ para posterior juízo de admissibilidade.
13. Ambos os recursos foram des-
providos, tendo o E. TJSP ratificado o
posicionamento de extraconcursalidade do
crédito, a limitação da extraconcursalidade
aos bens dados duciariamente em garantia
e a competência do D. Juízo da Recuperação
para analisar atos de constrição sobre o
patrimônio das empresas da BB, para que
não haja perigo de dano à preservação da
empresa.
14. Independente dessa controvérsia,
em 28.11.2014 o EE resgatou o valor de 4
(quatro) Certifi cados de Depósito Bancário
(“CDBs”) de propriedade da DD S.A. na
intenção de satisfazer seu crédito e repassar,
nas proporções previamente estabelecidas,
ao demais Bancos integrantes do Sindicato.
BB, entendendo que tais CDBs não eram
vinculados às CCEs objeto de garantia
(muito menos a duciária) concedida ao EE,
requereram ao D. Juízo da Recuperação a
restituição de tal quantia, o que foi deferido
e o EE, em cumprimento a determinação ju-
dicial, depositou os valores correspondentes
na conta vinculada à recuperação judicial.
15. Esta decisão foi objeto de Agravo
de Instrumento 201, interposto pelo EE, o
qual foi provido pelo E. TJSP e atualmente
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