O reconhecimento pelo supremo tribunal federal da covid-19 como doença ocupacional

AutorProfa. Dra. Lívia Mendes Moreira Miraglia; Doutorando Jeibson dos Santos Justiniano
CargoProfessora Adjunta de Direito do Trabalho da graduação e da pós-graduação da UFMG. Pós-doutoranda pela UNB. - Professor Assistente de Direito Empresarial da graduação da UEA. Doutorando pela UFMG
Páginas175-194
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O RECONHECIMENTO PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL DA
COVID-19 COMO DOENÇA OCUPACIONAL
RECOGNITION BY THE COVID-19 SUPREME FEDERAL COURT AS
A LABOUR DISEASE
Lívia Mendes Moreira Miraglia
1
Jeibson dos Santos Justiniano
2
RESUMO: A MP 927/2020 possui regra que parece excluir os casos de contaminação pelo Novo Coronavírus
(SARS-CoV-2) do enquadramento de doença ocupacional. O objetivo do art. 29, da MP 927/2020 é contingenciar
os impactos financeiros para os empregadores decorrentes de responsabilidade civil e previdenciária pelo contágio
de trabalhadores por COVID-19. Na análise da compatibilidade dessa regra com o sistema jurídico-constitucional,
é necessário avaliar todo o arcabouço protetivo do meio ambiente do trabalho. O STF, ao determinar a suspensão
da eficácia do art. 29, da MP 927/2020, impediu a presunção automática de que a COVID-19 pelo trabalhador não
se enquadra como doença ocupacional, sob o argumento de que a norma seria inconstitucional. O artigo pretende
analisar se tal decisão sob o aspecto na necessidade e adequação.
PALAVRAS-CHAVE: COVID-19; Meio ambiente do trabalho; Doença ocupacional; Direito fundamental;
Normas técnicas.
SUMÁRIO: 1 Introdução. 2 O meio ambiente de trabalho enquanto direito fundamental do trabalhador. 3 A lei
brasileira e o conceito de doença ocupacional. 4 A declaração de inconstitucionalidade do art. 29 da MP 927/2020
pelo STF: retórica ou necessidade? A técnica do feixe de indícios como balizadora da interpretação da decisão do
STF. 6 Conclusão. 7 Bibliografia.
ABSTRACT: MP 927/2020 rules that the cases of coronavirus contamination ( covid-19) are not included in the
framework of occupational diseases. The purpose of art. 29, of MP 927/2020 is to reduce financial impacts of civil
and social security liability of the employers in cases of COVID-19 contagion. The Supreme Court has suspended
the effectiveness of article 29 of MP 927/2020, preventing the automatic presumption that the illness of COVID -
19 it´s not an occupational disease, once this presumption would be unconstitutional. The aim of the article is to
analyze if this decision was really necessary or if it was mere rhetoric.
KEYWORDS: COVID-19; Work environment; Occupational disease; Fundamen tal right; Technical standards.
SUMMARY: 1 Introduction . 2 The working environment as a fundamental right of the worker. 3 Brazilian law
and the concept of occupational disease. 4 The declaration of unconstitutionality of art. 29 of MP 927/2020 by the
Supreme Court: rhetoric or necessity? The technique of the beam of evidence as a beacon for the interpretation of
the STF decision. 6 Conclusion. 7 Bibliography.
Artigo recebido em 30/01/2021
Artigo aprovado em 22/02/2021
1
Professora Adjunta de Direito do Trabalho da graduação e da pós-graduação da UFMG. Pós-doutoranda pela
UNB.
2
Professor Assistente de Direito Empresarial da graduação da UEA. Doutorando pela UFMG
RDRST, Brasília, Volume 5, n. 3, 2020, p 174-193, SET-DEZ/2020
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1 INTRODUÇÃO
A pandemia do Novo Coronavírus (SARS-CoV-2) vem causando impactos profundos
na estrutura da sociedade brasileira. As determinações do Poder Público de medidas de
quarentena, isolamento e distanciamento sociais, limitaram a iniciativa privada no
desenvolvimento normal de suas atividades econômicas, gerando dificuldades ao cumprimento
das obrigações legais, tributárias, previdenciárias e trabalhistas.
Diante desse contexto, o Poder Executivo Federal vem produzindo atos jurídicos com a
finalidade de contingenciar as complexidades do momento. No âmbito trabalhista, destacam-se
as Medidas Provisórias nº 927 e nº 936/2020.
O artigo 29 da MP nº 927/2020 estabelecia como regra que os casos de contaminação
pelo Novo Coronavírus (SARS-CoV-2) não deveriam ser considerados como doenças
ocupacionais, excetuando as hipóteses em que houvesse comprovação do nexo causal entre a
contração do vírus e o exercício das atividades laborativas, nos seguintes termos: Art. 29. Os
casos de contaminação pelo coronavírus (covid-19) não serão considerados ocupacionais,
exceto mediante comprovação do nexo causal”.
Segundo alguns doutrinadores e juristas, o dispositivo em comento poderia levar à
ausência de responsabilização dos empregadores, mesmo aqueles que exercem atividades
essenciais na linha de frente de combate ao vírus. Significaria, também, excluir de plano e a
princípio em todos os casos, a responsabilidade do empregador, delegando ao empregado a
prova cabal e inequívoca do nexo causal, o que seria quase impossível ou de extrema
onerosidade.
Para buscarmos parâmetros seguros a fim de subsidiar uma interpretação sistêmica e
constitucional do art. 29, da MP 927/2020, foi necessária a construção de uma pesquisa que
gravitou em torno de uma linha de raciocínio sedimentada na teoria crítica, buscando responder
alguns pontos chaves, como, por exemplo: A decisão do STF sobre o reconhecimento da
COVID-19 como doença ocupacional foi retórica ou uma necessidade? Com a decisão do STF
houve o reconhecimento da aplicação da teoria dinâmica do ônus da prova?
Assim, foi empreendida uma avaliação com perspectiva de contextos sociais, políticos
e econômicos que a Medida Provisória n. 927/2020 está inserida, com base numa vertente
jurídico-sociológica, buscando na relação entre a novel legislação e o contexto da pandemia da

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