Razões do recurso de agravo na execução penal

AutorOctahydes Ballan Junior
Ocupação do AutorPromotor de Justiça no Estado do Tocantins. Coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal (2012/2014). Bacharel em Direito pela Faculdade de Direito de Franca
Páginas346-369

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Autos de Execução Penal nº ...............

Juízo de Direito da Execução Penal da Comarca de .................

Agravante: Ministério Público do Estado do(e) .......................

Agravado: "A"

Egrégio Tribunal,

Colenda Câmara,

Douto Procurador de Justiça:

Foi prolatada decisão de fls. .../... pelo Juízo de Direito da comarca de ......................, concedendo progressão do regime fechado para o semiaberto ao sentenciado "A" nos autos do processo de execução criminal nº ............., sob o fundamento de estarem presentes os requisitos objetivo e subjetivo previstos no art. 112 da Lei nº 7.210/84, sem realização de prévio exame criminológico para comprovação do mérito do reeducando. O Magistrado ainda aplicou o regime semiaberto "nos moldes domiciliar", autorizando o recolhimento do reeducando no período noturno, nos feriados e finais de semana na sua residência em vez de permanecer recolhido na Cadeia Pública de ...............

Consta dos autos do processo de execução que o agravado foi condenado pelo cometimento de 2 (dois) crimes, sendo um de homicídio simples e outro de latrocínio, ambos consumados, praticados na comarca de ..............., nos dias .../.../..... e .../.../....., aplicando-se pena privativa de liberdade unificada de 26 (vinte e seis anos) anos de reclusão, determinando-se o início do cumprimento da pena em regime fechado.

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Contudo, foi deferido o pedido de progressão para o regime semiaberto em decisão proferida em audiência no dia ... de ............ de ....., sob o argumento de o agravado ter cumprido 1/6 (um sexto) da pena e por não se entender necessário o exame criminológico para demonstração de mérito do sentenciado, com ainda foi agraciado com a possibilidade de cumprir o regime semiaberto na forma de "aberto domiciliar".

Inconformado com a decisão, o Ministério Público, por meio do Promotor de Justiça signatário, interpôs recurso de Agravo em Execução Criminal com base no art. 197 da Lei nº 7.210/84, no prazo legal, no dia ... de ............ de ......

Este é o breve relatório.

Preliminarmente, cumpre ponderar que o recurso foi interposto no prazo legal, considerando que a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está consolidada no sentido de aplicar-se a forma de processamento do recurso em sentido estrito para o recurso de agravo previsto no art. 197 da Lei nº 7.210/84 por falta de regulamentação própria (STF, 2ª T - Agravo de Instrumento nº 184.738-1/RS, Rel. Min. Neri da Silveira, DJU Seção I, 24.02.1997, p. 3.239). No mesmo sentido, o teor da Súmula n° 700 do Supremo Tribunal Federal: "É de cinco dias o prazo para interposição de agravo contra decisão do juiz da execução penal".

No mérito, a decisão que concedeu progressão para o regime semiaberto ao reeducando "A" deve ser reformada, pois flagrantemente equivocada.

Com efeito, consoante cálculo de liquidação de pena de fl. .., o reeducando cumpriu 1/6 (um sexto) da pena em ... de............ de ....., observando-se a presença do requisito objetivo exigido tendo em vista a regra do art. 112 da Lei n° 7.210/84 e o disposto na Súmula Vinculante n° 26 do Supremo Tribunal Federal.

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Cumpre sopesar, contudo, que o mérito do condenado não foi demonstrado, tendo em vista a ausência de exame criminológico. De observar-se que o agravado foi condenado por dois crimes violentos, sendo um de homicídio e outro de latrocínio, este hediondo, ambos consumados, e a realização do exame criminológico no caso é imperiosa como forma de examinar se a pena até o presente momento tem servido para reconstruir e reeducar a personalidade do sentenciado, voltada para a criminalidade e para a violência, de modo a comprovar-se sua aptidão psicológica e possibilidade de retorno ao convívio social.

Consigne-se que a Lei nº 10.792/03 não revogou o sistema de execução criminal e a realização do exame criminológico continua legítima quando necessária e justificada pelas condições concretas do reeducando, conforme autoriza o art. 66, III, letra "b", da Lei nº 7.210/84, bem como a Súmula Vinculante n° 26 do STF e a Súmula n° 439 do STJ para demonstração do mérito do condenado e do requisito subjetivo para legitimar a progressão. O exame, outrossim, continua expressamente previsto nos arts. 34 e 35 do Código Penal.

Além disso, a execução penal tem por escopo, nos termos do art. 1° da Lei n° 7.210/84, "efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado". Desse modo, percebe-se que é necessário apurar se o reeducando adquiriu as condições mínimas para retorno à sociedade, com prognóstico de não cometimento de novo crime, até porque a sentença determinou o cumprimento de pena no regime inicialmente fechado.

Observe-se, por relevante, que o mero atestado de comportamento carcerário elaborado por diretor de estabelecimento prisional não constitui comprovação idônea da reconstrução da personalidade do apenado e muito menos de sua ressocialização, não provando o seu mérito e a presença do requisito subjetivo exigido para progressão de regime.

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Aliás, o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, por meio da Resolução n. 07, de 10 de agosto de 2004, chegou a se posicionar sobre o famigerado atestado de comportamento carcerário, tido pelo juízo monocrático como suficiente para a comprovação do mérito do condenado. Conforme a mencionada Resolução:

O CONSELHO NACIONAL DE POLÍTICA CRIMINAL E PENITENCIÁRIA, reunido em sessão ordinária aos 10 dias do mês de agosto do ano de 2004, em Brasília, tendo em vista o disposto na Lei Federal 10.792/03, no que respeita a classificação do comportamento carcerário, destinado a instruir incidentes de execução penal, RESOLVE:

1. Recomendar, quando da expedição dos atestados de comportamento carcerário, para fins de instrução de pleitos em sede de execução penal relacionados ao Livramento Condicional, Progressão de Regime, Indulto, Comutação de Pena e outros, a adoção dos critérios estabelecidos no Projeto de Lei 5.075/01, no que se refere à classificação da conduta, assim como às questões relacionadas à reclassificação e prescrição das faltas disciplinares, verbis:

"Art. 52-A. A conduta será classificada como:

I - boa, quando não existir punição por falta média ou grave;

II - regular, quando houver punição por falta média;

III - má, quando houver punição por falta grave.

§ 1º. Três punições por faltas leves, no prazo de 6 (seis) meses, considerar-se-á uma falta média.

§ 2º. Três punições por faltas médias, no prazo de 1 (um) ano, considerar-se-á uma falta grave." (NR)

"Art. 52-B. A reclassificação da conduta, de regular para boa, dependerá da inexistência de punição por falta disciplinar média, durante o período de 6 (seis) meses, observado o disposto nos §§ 1º e 2º do art. 52-A." (NR)

"Art. 52-C. A reclassificação da conduta, de má para regular, dependerá da inexistência de punição disciplinar por:

I - falta grave prevista no artigo 50, incisos I, II e III, desta Lei, no prazo de 2 (dois) anos;

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II - qualquer outra falta grave, ou por 3 (três) faltas médias, no prazo de 1 (um) ano." (NR).

Art. 52-D. Prescreve a falta disciplinar, para o fim do art. 59 desta Lei, nos seguintes prazos:

I - em 1 (um) ano, da falta grave;

II - em 6 (seis) meses, da falta média;

III - em 3 (três) meses, da falta leve.

§ 1º. O prazo da prescrição começa a correr a partir do conhecimento da infração e sua autoria, pela Administração;

§ 2º. Em iguais prazos prescrevem as sanções disciplinares, que impostas não venham a ser executadas.

§ 3º. Não corre a prescrição da falta disciplinar, enquanto o condenado estiver foragido. (NR)".

2. Esta Resolução entra em vigor a partir da data de sua publicação. Brasília, 10 de agosto de 2004.

ANTONIO CLÁUDIO MARIZ DE OLIVEIRA - Presidente

Sobre o assunto, considerando a Resolução acima transcrita, Luiz Carlos Gonçalves Filho, em trabalho de mestrado apresentado à Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, enfatiza:

(...) o bom comportamento, por si só, não pode ser confundido com o conceito de mérito, o qual é mais amplo e se refere à aptidão e adaptação do reeducando ao regime almejado. O mérito ora exigido, decorre da natureza do sistema progressivo adotado com a grande reforma do Código Penal em 1984, recepcionado pela Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º., inciso XLVI.13

Ora, como está evidente, o atestado de bom comportamento fornecido pelo diretor do estabelecimento serve para dizer que não existe punição por falta média ou grave. Não é documento hábil a comprovar que o apenado possui boas

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condições de retorno à sociedade, não se confundindo com o mérito esperado durante a execução da pena, o que torna imprescindível, no caso em apreço, a realização do exame criminológico.

A respeito da realização do exame criminológico, tem decidido o Supremo Tribunal Federal que o Juiz da Execução Criminal pode determiná-la com base no art. 66, III, letra "b", da LEP, para aferição da personalidade e do grau de periculosi-dade do sentenciado:

Crime hediondo ou delito a este equiparado - Imposição de regime integralmente fechado - Inconstitucionalidade do § 1º do art. 2º da Lei 8.072/90 - Progressão de regime - Admissibilidade - Exigência, contudo, de prévio controle dos demais requisitos, objetivos e subjetivos, a ser exercido pelo Juízo da Execução (LEP, art. 66, III, b) excluída, desse modo, em regra, na linha da jurisprudência desta Corte (RTJ 119/661, 125/578; RT 721/550), a possibilidade de o STF, examinando pressupostos de índole subjetiva na via sumaríssima do habeas corpus, determinar o ingresso imediato do sentenciado em regime penal menos gravoso - Reconhecimento, ainda, da possibilidade de o Juiz da Execução ordenar, mediante decisão fundamentada, a realização de exame criminológico - Importância do mencionado exame na aferição da personalidade e do grau de periculosidade do sentenciado (RT 613/278) - Edição da Lei 10.792/2003...

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