As raízes filosóficas da busca da verdade e sua influência no Processo Civil

AutorKühn, Vagner Felipe
Páginas55-66

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Vagner Felipe Kühn

Para este filósofo grego, “Nihil est in intellectu quod non prius juerit in sensu”, isto é, nada havia no intelecto que antes não tivesse passado pelos sentidos. Aristóteles também agregava à racionalidade importância para se aproximar da verdade, mas esta não estava no inconsciente humano; estava fora dele. As emanações do ser eram abstraídas e compunham um mosaico de racionalidade, o qual, necessariamente, deveria ficar cada vez mais abstrato, de modo a superar as deficiências sensoriais humanas. (DURANT, 2000, p. 69-107).

A grande ferramenta de construção dessa espiral de abstração até as proximidades da verdade é conhecida, até hoje, por um conceito sinônimo de algo verossímil: a lógica. (ARISTÓTELES, 384-322, p. 81-110).

Esses pensadores influenciaram diversas correntes de pensamento filosófico e jurídico até hoje, sendo seus conceitos utilizados até mesmo pelos estudiosos que pretendiam contrapor suas noções de gnosiológicas, como Kant e Bacon. (DURANT, 2000, p. 69-107).

De fato, tanto as construções filosóficas atinentes à exacerbação do racionalismo, como a de Kant, quanto as relacionadas ao aumento da acuidade dos sentidos, da percepção das emanações no objeto, à verdade perceptível, tal qual Bacon, constituem-se sob modelo gnosiológico de Aristóteles. (VILLEY, 2009).

Sem a lógica qualquer uma das diversas correntes derivadas das indagações dos filósofos gregos não poderiam ser desenvolvidas ou rechaçadas. Mesmo as descobertas científicas que ampliam enormemente os sentidos humanos, como testes de DNA, nada valem se estabelecidas sobre uma hipótese não lógica. Por exemplo, não será lógico utilizar o referido teste para verificar qual dos gêmeos idênticos é o pai de uma criança, pois essa espécie de irmãos apresenta carga genética idêntica. (ARISTÓTELES, 384-322).

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Asserção: Da Teoria ao Princípio de Direito Processual Civil

Certamente um perito instado a fazer tal exame constatará a similitude de carga genética pelos elementos disponíveis em abstrato (paternidade discutida entre gêmeos idênticos e previsibilidade lógica do resultado), sendo a priori em conformidade com a verdade a conclusão sobre um determinado caso concreto.

Em campos do conhecimento onde existem diversos entraves à verificação de resultados necessários, como no caso do direito processual civil, a compreensão do conceito geral de lógica demonstra-se inafastável para a busca da verdade.

3.1 A lógica como ferramenta do processo civil na

busca da verdade

A criação original da lógica é atribuída a Aristóteles (384-322) e constitui um marco ainda na filosofia grega, como ressalta Durant (2000, p. 76, grifo nosso): “a inteligência grega era indisciplinada e caótica até que as fórmulas implacáveis de Aristóteles proporcionaram um método rápido para o teste e a correção do pensamento”.

Depois de Aristóteles, a Grécia observou profunda decadência, não apenas na esfera econômica, mas também no plano político, o que enfraqueceu o caráter do pensamento helênico, do qual esse filósofo é indissociável. Apenas muitos séculos depois, com a tradução do conjunto de obras de Aristóteles intituladas Órganon (ARISTÓTELES, 384-322), pelo filósofo romano Boécio [1200?], que se cunhou o modelo de pensamento medieval, origem da filosofia escolástica, a qual se pode referir que “constituiu a terminologia da ciência moderna e lançou as bases daquela mesma maturidade de mentalidade que iria sobrepujar e derrubar o sistema e os métodos que lhe haviam dado origem e sustento”. (apud DURANT, 2000, p. 76-77).

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A primeira contribuição da lógica ao contexto da filosofia e das ciências foi a exigência da definição dos termos de qualquer investigação, cuidado esse que é revelado também pelo fato de Aristóteles (384-322, p. 39-80) ter dedicado parcela significativa de seu Organon a definições.

Em seguida, para as construções racionais, Aristóteles (384-322, p. 81-110) cunhou a ideia de conceitos universais: “qualquer nome capaz de uma aplicação universal aos membros de uma classe: assim, animal, homem, livro, árvore são universais”. Em seguida, demonstrou com o silogismo que era possível combinar premissas com conceitos universais (maiores) e premissas com conceitos concretos (menores), gerando resultados racionais e possivelmente em conformidade com a verdade (pois sempre será um exercício de aproximação paulatina).

Esses conceitos universais são, como se verá em tópicos posteriores, elementos indispensáveis ao raciocínio dos juristas, que, em muito, se utilizam de Standards.

Se por um lado a lógica não constitui um manual apto a descrever, com breves e simples métodos, todos os contornos do caminho à verdade, por outro, é nítido que esse instrumento consiste nos “cânones da consistência teórica” de todos os debates científicos. (DURANT, 2000, p. 79).

No processo civil, por seu curso, a lógica e a sua exigência de precisão terminológica demonstram importância singular, sendo inafastável instrumento para a identificação e para a compreensão dos princípios que regem esse campo da ciência jurídica. As etapas de discussão, seu regime de prejudiciais e de preclusões tem íntima relação com os preceitos da lógica, pois sua justificação não é decorrente apenas...

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