O Estado de Direito como meio racional de integração em sociedades complexas: a evolução do direito moderno em Jürgen Habermas

AutorPablo Holmes
CargoDoutorando em sociologia pela Universität Flensburg, Alemanha, sob orientação do Prof. Dr. Hauke Brunkhorst (Bolsa do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico - DAAD).
Páginas153-172
O Estado de Direito como meio racional
de integração em sociedades complexas:
a evolução do direito moderno em Jürgen
Habermas*
Pablo Holmes* *
1. Introdução
Habermas propôs, já em 1976, a reconstrução do materialismo his-
tórico na forma de uma teoria da evolução social1. Sua intenção aparente
era defender a possibilidade de sociedades modernas, mesmo diante de
crescentes condições de complexidade social2, ainda serem capazes de de-
senvolver uma auto-consciência3. Ele queria, assim, explicar o advento
de uma forma moderna de racionalidade que integrasse os agentes sociais
mediante uma solução intermediária entre aquela de uma descrição do
desenvolvimento exclusivamente referido a formas de integração sistêmica
ligadas ao processo de especialização funcional4, sobre os quais o próprio
Marx havia fundamentado sua formulação5, e a de interações que se dão
* Produzido com o auxílio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Tecnológico – CNPq e do Serviço
Alemão de Intercâmbio Acadêmico – DAAD.
** Doutorando em sociologia pela Universität Flensburg, Alemanha, sob orientação do Prof. Dr. Hauke
Brunkhorst (Bolsa do Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico – DAAD). Mestre em Direito pela
Faculdade de Direito do Recife – UFPE. Email: pabloholmes@gmail.com.
1 HABERMAS, 1983, p. 11-43; CORTINA ORTS, 1986, p. 170-75.
2 McCARTHY, 2002, p. 177-215.
3 Idem, 178.
4 LUHMANN, 1998, p. 88.
5 HABERMAS, 1983, p. 16 seg.
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no plano que, para aquela tradição materialista, seria o da superestrutura6,
mas que para ele seria o domínio da integração social7.
Para Habermas, seria possível reconstruir a história das imagens de
mundo compartilhadas socialmente pelos grupos humanos, desde os pe-
ríodos pré-históricos até as formas mais desencantadas da contempora-
neidade, em termos de uma lógica do desenvolvimento homóloga àquela
elaborada por Jean Piaget e Lawrence Kohlberg8 para o desenvolvimento
moral-cognitivo de crianças. Assim, pensava poder demonstrar como a
perda dos conteúdos tradicionais, que a Weber interessavam como fun-
damentos da autoridade gradativamente desencantada pela racionalização
social – ou que podemos também atribuir a uma hipostasiação das esferas
de integração sistêmica9não seria realizada ao custo da própria capacida-
de de orientação das ações de acordo com valores10.
O desenvolvimento das sociedades humanas poderia ser, assim, es-
truturado logicamente, ao modo da psicologia genética, como um pro-
cesso de descentração dos mundos da vida, por meio do qual os indi-
víduos disponibilizariam, para si mesmos, o potencial coordenativo de
ações intersubjetivamente implicadas contido na linguagem a partir da
força geradora de convicções normativas contida nas pretensões de vali-
dade criticáveis. Habermas esclarece, no entanto, que não postula, com
isso, uma homologia forte, ou seja, uma correspondência absoluta entre
a ontogênese do desenvolvimento físico-natural das competências cog-
nitivas e morais de seres humanos individuais e a f‌ilogênese dos modos
coletivos de relacionamento com a realidade externa e interna de grupos
sociais11. Isso porque, mesmo em sociedades primitivas com explicações
mágico-animistas para os fenômenos sociais e naturais, poderia haver o
desenvolvimento de categorias lógico-operacionais – as mais avançadas
e complexas – nos seus membros, não estando relacionado diretamente
o nível cognitivo individual com os modos simbólicos pelos quais uma
sociedade humana se reproduz socialmente12.
6 MARX, 2002a, p. 45, 171 seg.
7 HABERMAS, 1983, p. 38 seg.
8 HABERMAS, 1983, p. 14 e seg; HOLMES, 2006, p. 61-86.
9 LUHMANN, 1980, pp. 29-47.
10 McCARTHY, 2002, p. 18.
11 HABERMAS, 1983, pp. 14-21.
12 Idem, p. 17 e seg.
Pablo Holmes
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