Purify the territory: the struggle against immigration as a security laboratory (1968-1974)/Purificar o territorio: a luta anti-imigratoria como laboratorio securitario (1968-1974).

AutorRigouste, Mathieu
CargoReport

A institucionalizacao moderna da xenofobia comeca com o Estado-nacao e seu principio de discriminacao pelo lugar de nascimento. O estrangeiro e no Estado-nacao, por principio, banido de direito e superexplorado de fato, ele e vigiado e submetido estruturalmente aos principios de excecao. (1) Toda forma de nacionalismo, assim, trata o estrangeiro como um suspeito por natureza. Nos podemos, portanto, estudar os mecanismos que determinam esses periodos em que o Estado implementa uma luta sistematica contra os estrangeiros. Geralmente, nos explicamos esses fenomenos com base nas variaveis economicas. Confrontado com o aumento do desemprego e com a baixa do crescimento, o Estado buscara favorecer o emprego dos nacionais. A "preferencia pelo nacional", deste ponto de vista, se revela como sendo menos uma reivindicacao da extrema direita do que um principio que dirige todo o direito desde o fim do antigo regime. E preciso admitir, entretanto, que a economia capitalista depende continuamente da manutencao de um subproletariado precarizado, ao qual o Estado nega a igualdade e que, no entanto, deve ser reproduzida para assegurar a realizacao das tarefas mais desprezadas. Como compreender, nesse quadro, a ofensiva antiimigratoria do comeco dos anos 1970, que deu inicio ao periodo no qual ainda vivemos, em que o imigrante pos-colonial se caracteriza por um tipo de bode expiatorio transversal? Nos tentaremos mostrar que a designacao de inimigos internos a partir de criterios socio-etnicos pelo Estado deve ser analisada paralelamente como uma tecnica de protecao da ordem politica e geopolitica. A genese do esquema de dominacao securitaria se da especialmente pela reconversao dos principios contra- subversisvos na luta anti-imigratoria, isto e, aplicando ao conjunto da populacao os dispositivos que visavam proteger a ordem imperial e empregando os corpos dos imigrantes como laboratorio e vitrine de uma "nova ordem".

Os corpos imigrantes como moeda de troca e alavanca geopolitica

Os tratados de "independencia" foram os primeiros textos a terem definido as relacoes de circulacao entre as ex-colonias e a metropole e, assim, a terem estabelecido as bases de um discurso estatal sobre a imigracao pos-colonial. Os acordos de Evian, (NT) como a maior parte desses textos que visam reconduzir as relacoes de tutela e subordinacao coloniais por meio de um imaginario de associacao, de comunidade e de cooperacao, derivam de uma luta pela conservacao dos interesses energeticos, economicos, estrategicos, nucleares e militares. Deixando transparecer uma serie de interesses, como o privilegio de dirigir os Estados pos-coloniais e a garantia de apoio militar frances na repressao das revoltas populares contra as novas elites coloniais, o Estado frances negociou o estatuto dos imigrantes pos-coloniais como uma moeda de troca, garantindo uma soberania partilhada sobre a exploracao das riquezas e dos seres humanos entre o Estado frances e seus novos subcontratantes.

Desde 1959, a perspectiva de independencia argelina havia levado a reconsideracao do estatuto de "muculmanos franceses residentes na metropole", que passaram a ser designados "imigrantes argelinos". A primeira vez que a figura do imigrante foi mobilizada pela instituicao militar e pelo pensamento do Estado foi como fonte de trabalho para a Franca e de capital para a Argelia, e, assim, como uma garantia de conservacao da influencia francesa sobre o governo argelino. Tratava-se de uma prevencao quanto ao risco de que o petroleo argelino fosse nacionalizado, o que fornecia a Argelia uma alavanca sobre a Franca no controle de sua principal fonte de fornecimento de hidrocarbonetos. O mesmo ocorria com a presenca militar francesa no Saara e com a conservacao de sitios nucleares que la se encontravam. A nota de introducao intitulada "Coesao economica entre metropole e Argelia" fornecida pela direcao do Instituto de Altos Estudos da Defesa Nacional, (2) o principal think thank civil-militar frances, a seus auditores na sessao 1959-1960, apresentava "as razoes que efetivamente levaram o ocidente a se esforcar para elevar rapidamente o nivel de vida nos paises sub-desenvolvidos". As "trocas humanas" foram ali apresentadas como "o fator decisivo" de uma coesao economica entre a metropole e a colonia. "O aporte, para uma economia [argelina] em sobre-emprego, de trabalhadores muculmanos residentes na metropole" foi concebida paralelamente como uma forma de liberar "a mao-de- obra metropolitana, geralmente mais qualificada, das tarefas cuja execucao exigia, de qualquer modo, uma certa imigracao". "Alem do mais, e muito improvavel que algum outro territorio alem da metropole esteja em condicoes de oferecer o emprego que lhes e atualmente assegurado", acrescentava o documento.

A sintese dos trabalhos produzidos a partir dessa nota pelos comites de auditores dessa mesma sessao se interessava precisamente pelo controle dos "fluxos migratorios" e pelo enquadramento dos argelinos emigrados para a Franca apos a independencia. (3) "O conjunto dos problemas ligados a estadia dos trabalhadores muculmanos na metropole" estava ligado, para os auditores, a "expansao demografica excepcional que Argelia experenciava" e "a revolucao politica e social que chacoalhava de ponta a ponta os paises sub-desenvolvidos". Segundo os auditores, havia uma solucao: "antes de mais nada, controlar, para o proprio bem deles, a vinda para a metropole dos trabalhadores argelinos". "Parece necessario criar na Argelia orgaos de designacao que teriam por missao realizar uma primeira selecao de muculmanos que possuem um certo dominio oral do frances bem como uma qualificacao profissional inicial", explicava a sintese.

Nos vimos surgir, ja nos primeiros momentos da reflexao sobre a imigracao poscolonial, um certo numero de dispositivos que organizavam o pensamento dominante do controle da imigracao na 5a Republica: politica de cotas e selecao segundo a origem, a profissao ou o nivel de escolaridade, vigilancia politica, restricao, reagrupamento familiar e controle da "integracao". A cultura militar se apossou do corpo do imigrante como uma moeda de troca para a manutencao da influencia externa, e o tornou um suspeito de subversao cuja fidelidade ou silencio deveriam ser permanentemente assegurados.

Um certo numero de documentos mostra que realmente houve um investimento sobre o corpo imigrante, no sentido de um calculo de perdas e ganhos. Os discursos estatais sobre a imigracao argelina necessariamente evoluiram a partir do golpe de Estado de Houari Boumediene em 1965. No mesmo ano, uma primeira circular visava restringir a entrada de trabalhadores argelinos no territorio frances. Em 1968, a ultima circular evacuou a base militar em Mers el Kebir, ocupada pela Franca. Em 27 de dezembro do mesmo ano, um acordo franco-argelino sobre a circulacao, o emprego e a estadia dos migrantes fixou as cotas e impos a necessidade de uma autorizacao de imigracao e a garantia de contratacao na Franca para poder emigrar. A relacao de forcas entre os Estados havia sido abalada, o Estado acentuou a desvalorizacao do corpo imigrado e a instituicao militar reinventou a ameaca...

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