As provas de unidade econômica ou profissional para fins de exigência do issqn

AutorFabiana del Padre Tomé
CargoMestre e Doutora em Direito Tributário pela PUC/SP
Páginas51-58

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1. Considerações iniciais: a rígida discriminação das competências tributárias e o problema relativo ao âmbito territorial de incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN

Sabemos que o constituinte brasileiro foi extremamente minucioso ao traçar as competências tributárias. Tal rigor objetiva, a um só tempo, (i) conferir segurança aos contribuintes, assegurando-lhes que só serão tributados na forma prevista pelo Texto Maior, e (ii) implementar a autonomia e isonomia das pessoas de direito constitucional interno, atribuindo-lhes poderes para instituir e exigir tributos, importantes fontes de receitas e instrumentos para a consecução das atividades estatais.

Nessa linha de raciocínio, cada pessoa política tem permissão para atuar dentro de específico campo que lhe foi atribuído, não podendo ultrapassá-lo, sob pena de violar direitos do contribuinte e de invadir competência tributária alheia.

É nesse contexto que tem lugar a problemática inerente à exigência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN. Nos termos do art. 156, III, da Constituição de 1988, "Compete aos Municípios instituir impostos sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar". Todos os Municípios, portanto, são titulares dessa competência.

Advém, assim, a pergunta: como delimitar qual o Município competente para a exigência do IS SQN sobre determinada prestação de serviço? Sabemos que, em virtude do princípio da territorialidade, a lei tributária municipal não atinge fatos ocorridos fora de sua delimitação espacial. Mas isso não soluciona todos os problemas, visto serem

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inúmeras as ocasiões em que o prestador de serviços localizado em um determinado Município exerce atividades em outros entes municipais.

Para o deslinde da questão, não basta a análise literal do texto da Constituição. Pelo contrário, como ensina Paulo de Barros Carvalho,1 o plano de expressão figura somente como ponto de partida. Necessário se faz a análise sistemática, considerando as normas jurídicas nas relações de subordinação e de coordenação. Por isso, é imprescindível o estudo das normas gerais de direito tributário e da legislação municipal.

Feita essa análise, o próximo passo deve consistir em examinar os requisitos postos pela legislação em vigor (constitucional, complementar e municipal) para que o Município faça jus à exigência do ISSQN. E, por fim, cumpre verificar que tais pressupostos estão presentes no caso concreto, de modo que se opere a incidência tributária, com o surgimento do respectivo crédito. Para tanto, necessário se faz adentrar no tema da produção probatória, pois somente a partir das provas será possível determinar o local em que se verificou o fato jurídico tributário, dando ensejo ao direito de o Município exigir o tributo correspondente.

É sobre o que discorreremos a seguir.

2. Normas gerais de direito tributário e o critério espacial do ISSQN

Muito embora a distribuição das com-petências tributárias tenha sido feita de modo minucioso, não cabendo ao legislador infraconstitucional introduzir inovações a respeito do assunto, verifica-se haver ocasiões em que os campos da incidência tributária ensejam dúvidas sobre o ente constitucio-nalmente autorizado a exigir tributos com relação a determinados fatos. Em vista disso, o próprio constituinte indicou o mecanismo apropriado para disciplinar tais pendências: a lei complementar, veículo normativo de natureza ontológico-formal. Nos termos do art. 146,1, da Constituição, está expressa a sua incumbência para prevenir conflitos e, por conseguinte, invasões de competência.

Esse é o motivo pelo qual concordamos com a assertiva de Paulo de Barros Carvalho,2 segundo a qual a legislação complementar cumpre, em termos tributários, relevante papel de mecanismo de ajuste, calibrando a produção legislativa ordinária em sintonia com os mandamentos supremos da Constituição da República.

Voltando nossa atenção ao ISSQN, e tomando por premissa o arquétipo consti-tucionalmente veiculado, concluímos que o Município detém competência para instituir esse imposto, nos seguintes moldes:

Hipótese:

• critério material: prestar serviços de qualquer natureza, excetuando-se os serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação;

• critério espacial: âmbito territorial do Município;

• critério temporal: momento da prestação do serviço.

Consequência:

- critério pessoal: sujeito ativo: Município;3 sujeito passivo: prestador do serviço;

• critério quantitativo: base de cálculo: preço do serviço; alíquota: aquela prevista na legislação do imposto.

Essa disciplina, todavia, não é suficiente, ensejando dúvidas sobre a amplitude semântica dos citados critérios. Daí o advento da Lei Complementar n. 116/2003, exercendo

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função de norma geral de direito tributário, dirigida, portanto, a todos os entes municipais, para dar uniformidade ao tratamento do ISSQN.

Dentre os pontos abrangidos por essa Lei Complementar está a indicação de requisitos para determinar o "local da prestação de serviços" e, desse modo, o âmbito territorial em que o ISSQN se considera desenvolvido. Essa disciplina tem repercussão direta nos demais critérios normativos, visto que, a partir da identificação do local em que se prestam os serviços (ou seja, o critério espacial, âmbito territorial do Município em que se operou a prestação de serviços) é possível certificar o sujeito ativo correspondente, bem como a legislação aplicável.

Sobre o assunto, a Lei Complementar n. 116/2003 enuncia: "Art. 3e. O serviço considera-se prestado e o imposto devido no local do estabelecimento prestador ou, na falta do estabelecimento, no local do domicílio do prestador, exceto nas hipóteses previstas nos incisos I a XXII, quando o imposto será devido no local: (...)".

Salvo as exceções expressamente indicadas, em que o ISSQN é devido nos locais ali especificados, nas demais hipóteses o critério espacial é determinado pelo "local do estabelecimento prestador" ou pelo "domicílio do prestador".

Deixemos de lado, por não ser o ob-jeto deste estudo, as discussões a respeito da constitucionalidade de tal disposição. Tomando como premissa o fato de que se trata de enunciado constante do ordenamento brasileiro, impondo o recolhimento do ISSQN no "local do...

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