A prova no processo do trabalho: a aplicabilidade do código de processo civil para o asseguramento dos direitos fundamentais e sociais no direito trabalhista brasileiro

AutorMaria Cecília Máximo Teodoro/Márcio Túlio Viana/Cleber Lúcio De Almeida/Sabrina Colares Nogueira
Páginas278-286

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Apresentação

O presente artigo científico aborda as alterações instituto da prova pela Lei n. 13.105/2015 e a sua adequabilidade e harmonização com o art. 769 da CLT, como resultado da evolução conjunta da ciência processual. Serão analisados, com isso, a autonomia do processo do trabalho e os requisitos trabalhistas para a aplicação subsidiária e supletiva das normas do processo civil, quais sejam, a omissão e a compatibilidade. Com isso, serão analisados institutos como a cooperação processual, a teoria dinâmica do ônus da prova e as demais inovações probatórias, buscando investigar sua (in)aplicação ao processo do trabalho. A pesquisa ainda teve como foco os Direitos Fundamentais processuais. Referências Teórico-metodológicas: Adota-se a teoria constitucionalista do processo, no Estado Democrático de Direito, por Héctor Fix-Zamudio (México, 1982), José Alfredo de Oliveira Baracho (Brasil, 1984) e Ítalo Andolina/ Giuseppe Vignera (Itália, 1990), com pesquisa bibliográfica e utilização do método jurídico-dedutivo.

1. Introdução

O presente artigo científico analisa as alterações ocorridas no instituto da prova pela Lei n. 13.105/2015 — atual Código de Processo Civil (CPC/2015) — e sua aplicabilidade no processo do trabalho, em conformidade com o art. 769 da Consolidação das Leis Trabalhistas.

Serão analisados, com isso, os limites e métodos de aplicação subsidiária e supletiva das normas do processo civil, à luz de seu art. 15 (CPC/2015), ao processo do trabalho, dentre as hipóteses de omissão e a compatibilidade sistêmica do processo civil com os princípios próprios do processo trabalhista.

O tema é problematizado quando se percebe no CPC/2015 a inovação nos elementos e meios de prova. A partir disso, passa-se a ser questionado se, por exemplo, a utilização de documentos eletrônicos, o depoimento pessoal e a oitiva de testemunha por videoconferência, a prova técnica pericial simplificada e, com destaque, a distribuição dinâmica do ônus da prova, harmonizam-se com a produção da prova nas relações trabalhistas.

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Objetiva-se, assim, trazer à comunidade acadêmica o estudo da correlação entre os sistemas probatórios do processo civil e trabalhista, a fim de proporcionar maior segurança ao direito processual trabalhista, superando uma interpretação isolada das normas processuais no sistema normativo brasileiro, dentro de um contexto processual constitucionalizado. A pesquisa ainda teve como foco os Direitos Fundamentais processuais.

Adota-se, como marco teórico, a teoria constitucionalista do processo, no Estado Democrático de Direito, por Héctor Fix-Zamudio (México, 1982), José Alfredo de Oliveira Baracho (Brasil, 1984) e Ítalo Andolina/Giuseppe Vignera (Itália, 1990), com pesquisa bibliográfica e utilização do método jurídico-dedutivo.

2. Devido processo constitucional na perspectiva trabalhista

Na perspectiva processual constitucional deve o processo do trabalho se expressar como “metodologia norma-tiva de garantia dos direitos fundamentais” (DIAS, 2010, p. 75), sob contundente crítica à compreensão do processo como instrumento técnico da jurisdição ou como “mero calhamaço de papéis no qual o juiz profere sentença após a prática desordenada de atos pelos sujeitos processuais, como vem ocorrendo, de forma lamentável, não poucas vezes” (DIAS, 2010, p. 75).

Supera-se, portanto, a teoria do processo como relação jurídica e sua corrente instrumentalista, ainda de aceitação majoritária no Brasil.

Por sua vez, a base de sustentação do processo constitucionalizado está no devido processo constitucional que se forma, precipuamente, pelo direito de ação e que se refere ao direito de se obter do Estado a prestação jurisdicional por meio da jurisdição trabalhista, do direito à ampla defesa, resguardados todos os meios legais e morais de prova, a ele inerentes. Compreende, com isso, a auto-defesa e a defesa técnica produzida por um advogado; a garantia da não surpresa das decisões, a revisão das decisões por um órgão colegiado, consectário do duplo grau de jurisdição, garantia de tratamento isonômico, fundamentação das decisões e boa-fé processual1.

Com isso, extrai-se que no processo trabalhista constitucionalizado as partes se tornam sujeitos processuais ativos na construção da decisão judicial, num contexto processual de atenção às garantias constitucionais e de efetiva participação.

3. A prova como instituto jurídico

A existência do direito constitucional à prova é encontrada, no ordenamento jurídico brasileiro, desde 1891, mas foi consagrado na Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 (CR/1988), em seu art. 5º, inciso LV (BRA- SIL, 1988), como decorrência dos direitos fundamentais do contraditório e da ampla defesa.

Conforme ensina Rosemiro Pereira Leal (2009, p. 196), trata-se a prova de um instituto de grande complexidade teórica, pois provar consiste em representar e demonstrar os elementos da realidade objetiva mediante meios lógico-jurídicos autorizados em lei. Opera-se em um ciclo de constante transformação que não possui fim, já que os instrumentos de prova (ex.: um documento) transformam-se em novos elementos de prova (ex.: uma testemunha) que, através dos meios de prova (ex.: o testemunho), produzem novos instrumentos de prova.

Nas lições de Cléber Lúcio de Almeida:

O direito à prova constitui aspecto fundamental do direito à ampla defesa e ao contraditório, que, por sua vez, constituem projeção do devido processo legal, abrangendo o direito à produção da prova dos fatos alegados na ação ou defesa, o direito à produção da prova contrária à produzida pela outra parte, e o direito à efetiva e adequada valoração da prova produzida pelo juiz (de nenhum proveito é a prova desprezada pelo juiz na formação do seu convencimento). (ALMEIDA, 2006, p. 552.)

Dessa forma, constituem objetos de prova todos os fatos alegados pelo autor, desde que sejam precisos, controvertidos, relevantes e pertinentes, não se constituindo em objeto de prova os fatos notórios, confessados pela parte contrária, incontroversos ou que tenham presunção legal de existência ou veracidade, de acordo com o art. 374 do CPC de 2015 (BRASIL, 2015).

A finalidade das provas é demonstrar, pelos meios em direito admitidos, a situação fática alegada. Assim, provar não significa alcançar a verdade dos fatos, mas sim a realidade comprovável, a partir do devido processo constitucionalizado. Como preceitua Francesco Carnelutti, “provar significa determinar e fixar formalmente os fatos” (CARNELUTTI, 1982, p. 44).

4. Princípios e apreciação da prova no processo do trabalho democrático

Pode-se estabelecer uma divisão dos princípios aplicáveis às provas, neste contexto de normatividade e viés constitucionalizado, em dois blocos: princípios constitucionais probatórios e princípios infraconstitucionais probatórios.

Os primeiros guardam sintonia notadamente com as garantias constitucionais da ampla defesa, contraditório e isonomia, tratados por Dhenis Cruz Madeira como Princípios Institutivos do Processo (MADEIRA, 2008).

Em relação aos princípios infraconstitucionais2 no processo do trabalho, deve-se destacar o princípio da

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concentração dos atos processuais, que exige das partes a apresentação de documentos com a inicial ou defesa, bem como a indicação dos meios de prova que pretendem produzir seja com apresentação de quesitos, assistente técnico ou rol de testemunhas e o princípio da oralidade, que resulta na realização dos atos de interrogatório, depoimentos, oitiva de testemunhas e alegações finais, praticados todos, em regra, na audiência una3.

Quanto à apreciação das provas, ainda se percebe no processo do trabalho resquícios do sistema de persuasão racional, merecendo críticas pelo potencial de autoritarismo e ampla liberdade do julgador; ao contrário, tem-se que o CPC/2015 manteve como norte o princípio do “livre convencimento motivado” numa perspectiva constitucional, como se percebe, por exemplo, no dever de ampla fundamentação das decisões do art. 489 do CPC/15 (BRASIL, 2015).

5. A autonomia do processo do trabalho e a aplicação subsidiária do processo civil

As normas processuais de natureza trabalhista encontram-se previstas, assim como as normas de direito material, notadamente na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), malgrado sejam encontradas normas trabalhistas em leis especiais.

Ocorre que os arts. 769 e 889, ambos da CLT, estabelecem que, nos casos omissos, o direito processual comum deve ser aplicado como fonte subsidiária do direito processual do trabalho, quando for compatível. Destaque-se que o referido art. 769 faz referências ao direito processual comum, ou seja, não somente ao CPC/2015.

No mesmo sentido, dispõe o art. 15 do CPC/2015 que: na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente.” — grifo nosso (BRASIL, 2015.)

Percebe-se, portanto, inegável compatibilidade entre o CPC/15 e a CLT, por força dos arts. 15 e 769, respectivamente.

Com isso, surge a indagação...

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