Proposal of a protocol for the study of intuition and the decision-making process/Proposicao de um protocolo para estudo sobre a intuicao e o processo de tomada de decisao/Proposicion de un protocolo para estudio sobre la intuicion y el proceso de tomada de decision.

AutorAndriotti, Fernando Kuhn
CargoArtigo--Administracao Geral
  1. INTRODUCAO

    O conceito de intuicao circula na sociedade ha muitos anos. No campo das ciencias sociais, esse tema vem ganhando destaque desde os anos 90, abordado em seus aspectos cognitivos, emocionais e comportamentais. Contudo, mesmo na atualidade e dificil definir a intuicao, encontrar um consenso sobre quais sao seus componentes, compreender como ela e ativada, como pode ser desenvolvida e como pode ser utilizada de forma intencional na tomada de decisao. Isso demonstra que o campo de estudos sobre a intuicao continua aberto e carece de pesquisas que auxiliem em sua compreensao.

    O interesse na intuicao como um elemento importante da tomada de decisao comeca com a revolucao da informacao iniciada ha algumas decadas. Com o advento da informatica e do acesso quase irrestrito a informacao, o ambiente tornou-se mais complexo e, paralelamente, as exigencias de resultados positivos tambem cresceram. Os gestores passaram a decidir em ambientes onde ha muitas variaveis, risco elevado, alto nivel de incerteza e uma crescente necessidade de agir rapidamente para aproveitar oportunidades e, por conseguinte, evitar potenciais ameacas. De acordo com Ugur (2005), o mundo e caracterizado pela incerteza; o uso de metodos convencionais de gestao de risco resulta em decisoes abaixo do ideal, pois os individuos nao possuem habilidades e capacidades suficientes para lidar com todas as variaveis que podem influencia-lo no momento de decidir. De acordo com uma recente pesquisa, 59% do tempo dos gestores e gasto em resolver problemas urgentes (CIO BRASIL, 2010).

    Dean e Sharfman (apud EISENHARDT, ZBACKARI, 1992) afirmam que situacoes urgentes, ameacadoras, de ambiente incerto acabam afetando a racionalidade do individuo; em consequencia, o resultado nem sempre sera o desejado. Como ressalta Bernstein (2008:17), os seres humanos estao longe de serem "automatos hiper-racionais", ou seja, ha algo mais, nao declarado. De acordo com um estudo realizado em 2004 pela empresa de consultoria PriceWaterhouse Coopers, que envolveu 200 empresas de setores diversos da economia, localizadas em 30 diferentes paises, de um total de cerca de 10 mil projetos apenas 2,5% foram considerados bem-sucedidos; quanto aos demais 97,5%, seu insucesso pode ser atribuido a decisoes precipitadas, com pouca informacao, ou a situacoes nas quais os gestores nao conseguiram compreender o ambiente e adequar a decisao ao contexto (FERRARO, 2007).

    Goodman (1993) ressalta que as falhas ocorrem em funcao de diferentes interferencias, entre as quais se podem assinalar as seguintes: a busca de informacoes feita a margem do processo decisorio; as informacoes para suportar a decisao sao coletadas depois de a decisao ter sido tomada; as informacoes coletadas para uma determinada situacao sao, normalmente, utilizadas para outros fins que nao o proposito original; sempre se busca informacao alem do necessario; mesmo tendo a informacao necessaria, gestores reclamam da falta de informacao; excesso de informacao, alem da capacidade do executivo de ler e interpretar.

    Simon (1977), ao estudar a decisao, chegou a uma classificacao que aloca, em um extremo, decisoes complexas, nao estruturadas, e, no outro extremo, decisoes programadas, de cunho mais operacional. Ao abordar decisoes que nao obtiveram sucesso, imagina-se que sejam do primeiro tipo, ou seja, decisoes mais estrategicas, nao programadas, que exigem do executivo um nivel de reflexao maior, onde a incerteza esta mais fortemente presente. Nesses casos, a intuicao passa a ter um papel importante na tomada de decisao.

    Considerando esse contexto, este artigo tem por objetivo fazer uma reflexao a respeito da intuicao no contexto de tomada de decisao e apresentar uma proposta de protocolo de pesquisa para a realidade brasileira, buscando compreender como a intuicao e a decisao interagem, dadas as lacunas existentes na literatura. Para isso, o artigo esta estruturado da seguinte forma: a secao 2 aborda a intuicao, ainda como um ponto a ser investigado, e os aspectos lacunares da questao, que requerem a realizacao de novos estudos; na secao 3 e apresentado um conceito para a intuicao, elaborado a partir de outros tantos estudos sobre o assunto; na secao 4 foram selecionados alguns instrumentos que tem por objetivo captar a intuicao, com destaque para dois elementos importantes: a experiencia do individuo e as emocoes a que estamos suscetiveis, ambos abordados na secao 5; a secao 6 apresenta os desvios cognitivos; somente entao se propoe uma forma de estudar o processo intuitivo, tema da secao 7. As consideracoes finais sao apresentadas na secao 8.

  2. A TOMADA DE DECISAO E A INTUICAO

    Na literatura sobre tomada de decisao nao parece haver um consenso entre os estudiosos sobre a dualidade racional/irracional, objetivo/subjetivo. Com o avanco da tecnologia e dos estudos praticados pela neurociencia, observou-se que ha uma forte interligacao dos sistemas cerebrais (sejam eles mais ou menos estruturados) e passou-se a investigar o modo como a decisao e afetada por ela (LEHRER, 2009). O estudo do processo decisorio deu origem a modelos sobre a melhor forma de decidir, ou os passos a seguir para tomar uma boa decisao. Um bom exemplo pode ser encontrado em Hammond, Keeney e Raiffa (2004), que apresentam quais seriam os cuidados necessarios para chegar a uma decisao inteligente, como uma especie de percurso de 8 etapas: problema certo, objetivos claros, alternativas viaveis e variadas, analise das consequencias, selecao das alternativas, enfrentar a inseguranca, analise de perfil de risco, decisoes encadeadas. Essas etapas, contudo, nao sao necessariamente as mais adequadas para todo tipo de decisao, e certamente nao o sao para decisoes de cunho mais estrategico, onde o ambiente e mais caotico, incerto, complexo, de cunho nao operacional (SIMON, 1965).

    Naturalmente entende-se que ha uma grande dificuldade em abrir espaco para algo que ainda nao e tao bem compreendido, e que nao e facil de compreender, como a racionalidade perfeita, que assenta o processo decisorio na consideracao dos pros e dos contras de cada cenario, e entao opta por aquele que se apresentar mais eficaz. Weber (2004), por meio de seus estudos sobre a acao social, auxilia na compreensao da motivacao de cada individuo quando da necessidade de decidir sobre algo: se a sociedade age de acordo com certos padroes, estes podem ser analisados de acordo com esquemas conceituais, entre os quais se encontram os tipos de racionalidade. Ou seja, entender a motivacao de uma pessoa, o que a faz tomar uma decisao, de certa forma pode, numa visao gerencialista/utilitarista, dar subsidios para estudos nessa area, de maneira a maximizar o resultado de cada ato. Mesmo porque ha uma aproximacao do modo de acao do individuo considerado racional com a propria teoria economica, ja que o individuo, ao tomar uma decisao, busca subsidios em uma serie de alternativas (comparando custos e beneficios tangiveis) e opta por aquela que apresentar o melhor resultado. E quase como seguir uma receita, onde ha uma especie de lista de pontos, os quais podem ser decompostos e estudados, para que a reflexao possa identificar problemas comuns e solucoes otimas.

    No entanto, nada isso faz sentido a partir do momento em que se aceita que ha algo mais, como a intuicao, que ajuda o individuo em uma situacao que foge da normalidade de suas tarefas, de suas acoes, que demanda outro tipo de resposta, de reacao e, sobretudo, que utiliza informacoes ambiguas, fontes informais, que caracterizem a decisao como estrategica. Ao final, ainda sera levado em consideracao o resultado da decisao; por outro lado, o processo, por mais caotico que seja, aparece em segundo plano. Nao que ele nao seja importante, mas o que interessa ainda e--mesmo tendo todo o conhecimento das etapas, das dificuldades, das limitacoes, do risco o quao perto ou longe a decisao esta do que se propos a alcancar.

    Simon (1977) ressalta que, ao se focar exclusivamente o momento final, ou seja, as consequencias de uma decisao, tem-se uma ideia erronea do que e uma decisao, pois ha outros elementos, como a busca de informacoes, sua interpretacao e a reflexao, que compoem o caminho para a etapa final de decidir. E muito dificil romper com essa comoda visao utilitarista e funcional da decisao, que postula que se pode analisar detalhadamente cada etapa, que cada individuo pode tomar decisoes inteligentes, que basta atentar para as armadilhas e oportunidades e, como num passe de magica, a melhor decisao sera tomada.

    Em uma linha diferenciada, alguns estudiosos, mais ligados a teoria economica comportamental, fazem uma critica contundente ao mainstream. A racionalidade e posta em questao, e a propria consciencia do individuo com relacao ao problema, as alternativas, aos objetivos e colocada a prova. A decisao, como tal, e estudada e apresentada de acordo com o conceito de racionalidade limitada, ou seja, como um processo sequencial, composto de etapas bem definidas. No entanto, o que se verifica e que essa racionalidade assumida permanece muitas vezes inoperante, suplantada por outros elementos que permitem ao gestor decidir sem nem mesmo perceber o caminho, a linha de raciocinio que seguiu, agindo quase que de forma inconsciente. De acordo com Miller, Hickinson e Wilson (2004), o modelo racional esta alem do alcance dos decisores.

    Isso traz importantes consequencias para o estudo da decisao, dos modelos decisorios, dos Sistemas de Apoio a Decisao, ao menos no que tange a decisoes estrategicas. Nao se trata de afirmar que, dados os avancos da ciencia e dos estudos nessa area, eles perderam sua utilidade, ou que nao estao adaptados a uma realidade complexa. Na verdade, ao contrario do que possa parecer, sao excelentes ferramentas, que podem auxiliar o gestor a agir, constituindo uma das fontes que serao consultadas. Ariely (2008) cita uma passagem de Shakespeare, que ilustra, ainda que de forma caricatural, o pensamento corrente:

    Que obra-prima e o...

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