PROJETO URBANO E PLANEJAMENTO PARTICIPATIVO: conexões e desconexões na reconstrução e recuperação ambiental de Lajedinho/BA

AutorLiana Viveiros Oliveira, Aparecida Netto Teixeira, Marília Moreira Cavalcante
Páginas226-246
PROJETO URBANO E PLANEJAMENTO PARTICIPATIVO: conexões e desconexões
na reconstrução e recuperação ambiental de Lajedinho/BA
Liana Viveiros Oliveira1
Aparecida Netto Teixeira2
Marília Moreira Cavalcante3
.
RESUMO: O artigo discute uma experiência associada de projeto urbano e planejamento participativo ocorrida em
Lajedinho/BA, cidade com elevado nível de ruralização onde, em 2013, ocorreu uma grave enchente, com vítimas fatais e
destruição parcial da cidade. Com aportes teóricos sobre o plano e o projeto e, considerando as bases jurídicas e
programáticas da política urbana brasileira, analisa a relação entre projeto e plano na formulação de uma agenda pactuada
e socialmente legitimada para as cidades, identificando tensões reveladoras de limites e também de pot enciais de
articulação e interação. Os resultados mostram o quanto a desconexão entre os instrumentos pode acentuar os problemas
urbanos e socioambientais que pretendem solucionar e apontam para a possibilidade de ressignificar o plano diretor e o
projeto urbano, atribuindo sentidos e significados na perspectiva do direito à cidade.
Palavras-chave: Projeto urbano. Plano diretor. Direito à cidade. Lajedinho.
URBAN DESIGN AND PARTICIPATORY PLANNING: Connections and Disconnections in Lajedinho´s Reconstruction and
Environmental Recovery
ABSTRACT:This paper discusses an experience of urban design and participatory planning that took place at Lajedinho/BA,
city with a high level of ruralization where, in 2013, a severe flood occurred, with fatalities and partial destruction of the city.
With theoretical contributions concerning project and planning, and, considering the legal and programmatic basis of
brazilian urban policy, the relation between them is analyzed in formulation of a pactual and socially legitimized agenda for
the cities, identifying tensions revealing boundaries and also of articulation and interaction potentials. The results show how
much the disconnect between the instruments can accentuate the urban and socio-environmental problems both of them
intend to solve and point to the possibility of reframing the master plan and the urban project, attributing meanings from the
perspective of the right to the city.
Keywords: Urban Design. Master plan. Right to the city. Lajedinho.
Artigo recebido em: 20/09/2019 Aprovado em: 07/05/2020
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v24n1p226-246
1 Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Universidade Federal da Bahia (2018) e integrant e do grupo de pesquisa Lugar
Comum (Faufba). Professora efetiva do Curso de Arquitetura e U rbanismo (UCSAL) e Professora colaboradora do
Programa de Pós-graduação em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Social da Universidade Católica do Salvador
(UCSAL). Professora colaboradora da Residência em Arquitetura e Urbanismo/ Especialização, da Universidade Federal da
Bahia (UFBA) desde 2011.E-mail: liana.oliveira@pro.ucsal.br
2 Doutora em Estruturas Ambientais Urbanas pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo -
FAUUSP (2004). Pós-doutorado no PPGAU /UFBA (2009-2010). Coordenadora do Curso de Arquitetura e Urbanismo
(UCSAL) de fevereiro 2015 a março de 2019. Atualmente é Professora do Programa de Pós-Graduação em Planejamento
Territorial e Desenvolvimento Social da Universidade Católica de Salvador (UCSAL). Integra o Núcleo de Salvador do
Observatório das Metrópoles e coordena o Grupo de Pesquisa Gestão Democrática das Cidades (CNPq/UCSAL).E-mail:
aparecida.teixeira@ucsal.br
3 Doutora em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia (2012). Atualmente
é professora do Curso de Urbanismo da Universidade do Estado da Bahia - UNEB e da Faculdade de Arquitetura e
Urbanismo da Universidade de Salvador UNIFACS. Professora colaboradora do Programa de Pós Graduação em
Desenvolvimento Regional e Urbano da UNIFACS.
Liana Viveiros Oliveira, Aparecida Netto Teixeira e Marília Moreira Cavalcante
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1 INTRODUÇÃO
O projeto urbano nas suas diversas feições revitalização, requalificação, reurbanização,
reconversão, regeneração e outras desde os anos 1990 passou a dar o tom das intervenções nas
cidades e ensejou uma vasta produção crítica diante dos processos excludentes engendrados. A sua
concepção vai além de mero desdobramento das diretrizes do plano: pode funcionar como indutor ou
alavanca para reconfiguração da cidade ou pode ser orientado pelo plano. Nos dois casos assume uma
posição de centralidade e é visto como um elemento ativo na perspectiva de redirecionar processos
urbanos, e, nesse sentido, os seus efeitos podem inclusive alterar as orientações do plano ou sugerir
orientações totalmente diversas daquelas que o originaram (VIVEIROS, 2005). A cadeia sucessória
plano-projeto, nessa ótica, é subvertida, até mesmo porque o plano já não lograva a força pretérita de
porta-voz da racionalidade e da ordem nas cidades. É fato que o seu valor como instrumento eficaz de
orientação das políticas públicas oscilou no tempo, de acordo com a capacidade do Estado para
responder às demandas sociais e do mercado, e ainda, das pressões de regulação em diferentes
contextos políticos e econômicos.
Parte-se, pois do entendimento do projeto urbano como instrumento de visualização
espacial das transformações urbanas propostas em determinado contexto social e político, e do plano,
como instrumento gerador de futuros alternativos a partir de uma leitura integrada dos processos
urbanos, seus conflitos e contradições. Pode, assim, apresentar-se como um plano diretor, orientador
da política urbana; como um plano urbanístico, em uma escala mais aproximada de configuração
inclusive, do desenho urbano, ou como um plano de ação, de caráter mais imediato e de
temporalidade, portanto, curta, capaz de organizar e articular a implantação dos projetos no espaço e
no tempo, estabelecendo as conexões entre os projetos isolados. No contexto contemporâneo da
cidade-mercadoria (VAINER, 2000) configuram-se, todos, como elementos de disputa em prol do
direito à cidade.
O plano diretor foi amplamente criticado nos anos 1980 pela sua ineficácia no controle
rigoroso da utilização do solo e pelo viés tecnocrático. As expectativas se voltaram à força das
pressões sociais no sentido de criar um ambiente favorável à implementação de medidas para alcançar
melhores condições de vida (RIBEIRO; CARDOSO, 1990, p. 74), tendo resultado na incorporação de
capítulo específico da política urbana na Constituição Federal de 1988, que torna o plano diretor
obrigatório para cidades com mais de 20.000 habitantes.
Uma compreensão ampla sobre o papel do planejamento urbano e do plano diretor é
construída na perspectiva de respaldar esse instrumento nos princípios orientadores das lutas sociais

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