Profissionalização do Treinador de Futebol - Exegese Preliminar do PL n. 7.560/2014
Autor | Luciana Lopes da Costa |
Cargo | Advogada na especialidade em Direito Desportivo e Direito Trabalhista. Membro do Conselho Deliberativo da Sociedade Brasileira de Direito Desportivo |
Páginas | 76-83 |
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Ver nota 1
Em constante crescimento e não havendo mais como se desconsiderar o futebol como uma fatia que movimenta a economia mundial, a transformação do esporte em negócio é uma realidade bem presente nos dias atuais2.
A paixão pelo futebol, outrora quase privilégio dos brasileiros, mas atualmente globalizada, é de tão profundas raízes que acaba transformando a maioria dos apaixonados em verdadeiros técnicos de fato. Como paixão não tem preço e cada vez mais se exacerba, dificilmente essa indústria está fadada ao insucesso. Assim, com o crescimento do "futebol negócio", crescentemente são identificados partícipes do espetáculo que buscam, não apenas o reconhecimento profissional, mas também proteção legal e criação de direitos outrora inexistentes que garantam seus interesses e objetivos, como no caso dos treinadores de futebol, que iremos destacar nesse capítulo.
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Não é incomum, ao falarmos em treinador de futebol, que as primeiras imagens formadas sejam daqueles que hoje, ou no passado, ocupem ou tenham ocupado posição de destaque no desempenho de suas funções como praticantes da modalidade esportiva, e passem normalmente ao comando de equipes que integram a elite do futebol e muitas das vezes, tal fato nos faz esquecer o principal papel desse profissional.
Analisando o futebol como uma das práticas desportivas de maior relevância social, evidente que a função do treinador merece destaque não só pela sua intervenção estratégica na busca de resultados positivos, como também pelo modelo e exemplo que representa através de seu comportamento, influenciando, principalmente, a formação de jovens atletas.
É o treinador, antes de tudo, quem deve primar pela promoção da ética desportiva, pelo desenvolvimento do espírito esportivo e pelo aprimoramento e desenvolvimento de habilidades técnicas e concepções táticas, mas entendemos não ser imprescindivelmente ele quem deve ter o papel principal em fazer a defesa da saúde e segurança dos praticantes sob seu comando, quer quando em treinamentos, em competição ou mesmo na participação e prática nas demais atividades físicas, mas sim aqueles formados em educação física, fisiologistas e médicos, preferencialmente com especialização pertinente ao desporto.
O treinador é um elemento de fundamental importância na estrutura do futebol, pelas implicações e impactos das suas ações no processo desportivo e, nessa qualidade, peça necessária da engrenagem do planejamento e desenvolvimento das atividades das equipes de competição e suas consequentes repercussões na sociedade.
Não é prática atual mas de longo tempo e inadequadamente cristalizada na mente de dirigentes e fértil no pensamento de torcedores, o critério de que a avaliação da capacidade dos treinadores prenda-se única e exclusivamente à vitória dos seus comandados, independentemente de todos e quaisquer outros parâmetros técnicos, intelectuais e científicos. Tal prática centenária atua como elemento prejudicial a um planejamento de médio e longo prazo e interpõe dificuldades na organização e desenvolvimento do trabalho, priorizando o imediatismo, constituindo-se um dos principais obstáculos encontrados, que dispensa maiores estudos para ser verificado.
Trata-se da prática do terror psicológico a que os treinadores são submetidos, não só pela diretoria dos clubes empregadores, como também pelas torcidas, já que não raramente são dispensados após duas ou três derrotas consecutivas, ainda que colecionem sequências de vitórias pretéritas ou possuam qualidades indiscutíveis e não seria nenhum absurdo imaginar que essa avidez pelo imediatismo do resultado, o possível
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despreparo de alguns dirigentes, o considerável grau de miopia mental de muitos torcedores e a busca da reserva de mercado profissional, isolados ou em conjunto, possa induzir ao surgimento de algum projeto de lei que imponha como requisito essencial para o exercício das funções de treinador ou técnico possuir as propriedades dos gênios ou as habilidades dos mágicos.
Atualmente no Brasil, de acordo com a Lei n. 8.650 de 20 de abril de 1993, o desempenho da função de treinador é assegurado, preferencial mas não exclusivamente, aos portadores de diploma expedidos pelas Escolas de Educação Física ou entidades análogas, reconhecidas legalmente e ainda, aos profissionais que, até a data do início da vigência da Lei, hajam, comprovadamente, exercido cargos ou funções de treinador de futebol por prazo não inferior a seis meses, como empregado ou autônomo, em clubes ou associações filiadas às Ligas ou Federações, em todo o território nacional.
Como a lei em vigência utiliza a expressão: "preferencialmente", tem-se que a atividade pode ser desenvolvida por qualquer pessoa que tenha conhecimento da regra da modalidade. Assim não fosse a vontade do legislador ter-se-ia o termo "exclusivamente".
Por esta razão, segundo Leal3, denominados como especialistas, muitos treinadores costumam ser ex-jogadores, que, ao encerrarem suas carreiras, mantêm vínculos com os clubes.
Esta inexigibilidade de preparo técnico, somada...
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