As reformas processuais e o devido processo legal: incursões sobre a razoável duração do procedimento e da efetividade processual no processo democrático

AutorGuilherme César Pinheiro
CargoGraduação em Direito (2010) pela Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais. Mestrando em Direito Processual pelo programa de pós-graduação da mesma instituição. Advogado
Páginas77-116
DOI: 10.5102/prismas.v8i1.1253
As reformas processuais e
o devido processo legal:
incursões sobre a razoável duração do
procedimento e a efetividade processual no
processo democrático
Guilherme César Pinheiro1
Resumo
Esta pesquisa visa estudar a efetividade processual e as implicações trazidas
pela garantia da razoável duração do processo. Isso porque tais institutos têm sido
compreendidos de forma equivocada, servindo de subterfúgio para o Estado, visto
que, sob o argumento de fazer com que o processo tenha duração razoável e, por
conseguinte, alcance a efetividade processual, tem-se alterado a legislação proce-
dimental, com o objetivo de suprimir garantias processuais, ao invés de estruturar
o Poder Judiciário. Para tanto, é preciso conceituar o instituto do Devido Processo
Legal, a m de compreendê-lo adequadamente no Estado Democrático. Em segui-
da, trabalhar-se-á o fator “tempo” e a teoria da efetividade processual na principio-
logia do processo. De resto, será apresentada uma contradita à tradicional compre-
ensão dos fatores que determinam a razoável duração do processo, demonstrando
qual é a variável-determinante para o tempo do procedimento.
Palavras-chave: Devido processo legal. Razoável duração do processo. Efetividade
processual. Princípios constitucionais do processo. Direitos e garantias fundamentais.
1 Introdução
Atualmente, alastra-se pelo Estado brasileiro uma verdadeira onda de alte-
rações das leis processuais. O Código de Processo Civil vigente já sofreu cerca de
1 Graduação em Direito (2010) pela Faculdade Mineira de Direito da Pontifícia
Universidade Católica de Minas Gerais. Mestrando em Direito Processual pelo programa
de pós-graduação da mesma instituição. Advogado.
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460 alterações legislativas, por meio de 46 leis.2 Não é diferente com o Código de
Processo Penal, vez que se pretende alterá-lo, parcial ou totalmente, desde 1963,
quando Hélio Tornaghi elaborou um anteprojeto que nem chegou a ser encami-
nhado ao Congresso Nacional. Mas, já se encontram em vigência, desde agosto
de 2008, as leis de números 11.689, que alterou a sistemática do procedimento
de competência do Tribunal do Júri; 11.690, que diz respeito à gestão de provas
no processo penal; e 11.719, que alterou dispositivos referentes à suspensão do
processo, ao procedimento, a emendatio libeli e mutatio libeli.3 Não bastasse isso,
encontram-se em trâmite no Congresso Nacional projetos de leis de alteração total
do Código de Processo Civil e Processo Penal, respectivamente, o Projeto de Lei do
Senado 166/2010 e o Projeto de Lei do Senado 156/09.
Nessa linha de pensamento, foi inserido pela Emenda à Constituição nº 45
de 2004, o princípio da razoável duração do processo e os meios que garantem sua
célere tramitação (art. 5º, LVIII). Segundo o Título II da Constituição, o referido
princípio é direito fundamental4 dos cidadãos, porém parece que o legislador or-
dinário não compreendeu bem isso, porque, paradoxalmente, alegando que busca
garantir a razoável duração do processo e, consequentemente, atingir a efetividade
do processo, tem alterado as leis procedimentais, suprimindo outras garantias pro-
cessuais das partes, ou seja, o que deveria ser uma garantia dos cidadãos (qualquer
do povo) contra o Estado, vem sendo um subterfúgio deste para com aqueles.
2 BRÊTAS, Ronaldo. As reformas do Código de Processo Civil e o modelo constitucional
do processo. In: BRÊTAS, Ronaldo; NEPOMUCENO, Luciana (Org.). Processo civil
reformado. 2. ed. Belo Horizonte: Del Rey, 2009. v. 1. p. 457-496. p. 460.
3 BARROS, Flaviane de Magalhães. (Re)forma do processo penal: comentários críticos dos artigos
modicados pelas leis n. 11.690/08 e n. 11.719/08. Belo Horizonte: Del Rey, 2008. p. 1-3.
4 Adota-se neste trabalho a diferença entre Diretos Fundamentais e Garantias
Fundamentais apresentada por BRÊTAS C. DIAS (2009, p. 466-467), qual seja: entende-se
que, Fundamentais são os direitos humanos expressos e arrolados no artigo 5º da CR/88,
enquanto garantias fundamentais são aquelas de índole processuais compreendidas
também na Constituição que formam um sistema de proteção àqueles direitos
fundamentais, com vistas a garantir sua efetividade. Exemplicando: a propriedade
é direito fundamental (inciso XXII do art. 5º), já o devido processo legal é a garantia
fundamental (inciso LVI do art. 5º) que permite a proteção daquele; a presunção de
inocência é direito fundamental (inciso LVII do art. 5º), enquanto o Habeas Corpus
(inciso LXVIII do art. 5º) é uma das garantias apta a lhe proteger. Daí, explica o autor, a
Constituição referiu-se em Direitos e Garantias Fundamentais.
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Diante dessas razões, este trabalho tem o escopo de analisar, à luz do de-
vido processo legal, o princípio da razoável duração do processo e os meios que
garantam sua célere tramitação e a efetividade processual – que muito se associa
ao princípio em questão.
Para tanto, o presente inicia-se com uma reconstrução do instituto do devi-
do processo legal a partir do Estado Democrático de Direito, a m de compreendê-
-lo adequadamente com o paradigma jurídico-constitucional brasileiro.
Em seguida, serão analisadas, em linhas breves5, algumas teorias da efeti-
vidade processual e o fator “Tempo” na principiologia constitucional do processo,
perquirindo se tais teorias se preocupam com a efetividade processual e da ativida-
de da prestação jurisdicional, ou com os resultados (eciência) dela.
Nessa perspectiva de esclarecimento dos problemas postos, será apresenta-
da uma contradita à tradicional compreensão de quais fatores determinam a razo-
ável duração do processo, esclarecendo qual a determinante-variável para o “tempo
do processo” (procedimento).
Enm, serão abordadas as implicações trazidas às diferentes funções es-
tatais pelo princípio ora estudado, trabalhando também algumas das inovações
sugeridas pelo anteprojeto do novo Código de Processo Civil.
2 O devido processo legal: uma reconstrução à luz do estado
democrático de direito
“Ninguém será privado da liberdade nem de seus bens sem o devido
processo legal”: é o que dispõe o artigo 5º, inciso LIV, da Constituição da Re-
pública de 1988. Todavia, a nossa Carta Política não dene o que é o Devido
5 Estudo aprofundado foi feito por Joaquim Adelson Cabral de Souza em sua dissertação de
mestrado: SOUZA, Joaquim Adelson Cabral de. O discurso da efetividade processual na
contemporaneidade brasileira. 2009. 162 f. Dissertação (Mestrado)-Programa de Pós-Graduação
em Direito, Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2009.

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