Processo e Previdência: o Crescente Interesse das Cortes Supremas em Matéria Previdenciária

AutorFernando Rubin
CargoAdvogado. Mestre em processo civil (UFRGS)
Páginas9-17

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Excertos

"No âmbito administrativo, a desaposentação é tratada pelo Regulamento da Previdência Social, no artigo 181-B do Decreto

3.048/99, sendo explicitado que as aposentadorias são irreversíveis e irrenunciáveis"

"Já é pacífico no STJ o entendimento de que a legislação exclui expressamente da condição de segurado especial o trabalhador que, atuando no meio rural, deixa o campo e se enquadra em qualquer outra categoria do regime geral da previdência social a partir do primeiro dia do mês em que passou a exercer outra atividade"

"Diante de percepção do auxílioacidente, a tendência natural é a possibilidade de cumulação deste benefício-indenização com a maioria das prestações do RGPS, salvo as aposentadorias"

I Introdução

Em momento de divulga-ção e debate de nossas mais recentes produ-ções doutrinárias em disciplina de direito social1, entendemos relevante analisarmos as últimas prin-cipais questões previdenciárias que vêm sendo enfrentadas no âm-bito do Supremo Tribunal Federal e também do Superior Tribunal de Justiça, alertando para o aumento de temas que passaram a ser debatidos pelas mais altas cortes de justiça do país.

II A questão "EPI" no STF

O equipamento de proteção individual (EPI) tem sua extrema relevância, no cenário previden-ciário e também trabalhista, pela sua utilização na diminuição dos riscos ocupacionais relacionados ao ruído, redução da exposição ao trabalhador a agente insalubre da mesma ordem, determinando, em muitos casos, que deixe de ser re-conhecida a atividade como espe-cial, quando comprovada a sua e?-

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cácia, permitindo que a exposição sonora no ambiente de trabalho fique dentro dos parâmetros legais estabelecidos2.

A respeito do tema, é tradicio-nal postura patronal no sentido de que a utilização adequada do equipamento elide a presença do agente agressivo, mesmo em am-biente de ruído expressivo. O tema finalmente chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF), no final de 2014, sendo desenvolvida tese que exige, na verdade, a análise do caso concreto; mas que trata, em linhas gerais, de proteger o segurado, ao passo que sinaliza para a aplicação da legislação vigente quanto à exposição anômala a ru-ído - atualmente em 85 decibéis, o que está de acordo com a NR-153.

O STF concluiu em 4 de dezembro de 2014 o julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 664.335, com repercussão geral reconhecida, e fixou duas normas que deverão ser aplicadas a pelo menos 1.639 processos judiciais movidos por trabalhadores de todo o país que discutem os efeitos da utilização de EPI sobre o direito à aposentadoria especial.

Na primeira tese, os ministros do STF decidiram, por maioria de votos, que "o direito à aposenta-doria especial pressupõe a efetiva exposição do trabalhador a agente nocivo a sua saúde, de modo que se o Equipamento de Proteção Individual (EPI) for realmente capaz de neutralizar a nocividade, não haverá respaldo à concessão constitucional de aposentadoria espe-cial". A outra conclusão fixada no julgamento, também por maioria de votos, é a de que, "na hipótese de exposição do trabalhador a ruí-do acima dos limites legais de tole-rância, a declaração do empregador no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual (EPI), não descaracteriza o tempo de serviço especial para a aposentadoria".

Embora o argumento do INSS tenha sido abrangido pela primeira tese fixada pelo STF, o plenário ne-gou provimento ao recurso porque, no caso dos autos, o trabalhador era um auxiliar de produção que trabalhou, entre 2002 e 2006, no setor de usinagem de uma empre-sa de Chapecó (SC), onde era ex-posto, de modo habitual e permanente, a ruídos que chegavam a 95 decibéis, sendo essa circunstância abrangida pela segunda tese fixada pelo STF4.

Tal entendimento do STF, portanto, pode ser considerado mais favorável aos interesses do segurado, já que não impede o reconhecimento do seu direito a benefício previdenciário especial, mesmo quando utilizado corretamente o EPI, o que será objeto de exame no caso sub judice.

III A questão "requerimento administrativo" no STF

Outra questão importante examinada pelo pretório excelso re-centemente tangencia-se à necessidade de indeferimento de pedido administrativo para ajuizamento de demanda previdenciária perante o Poder Judiciário Federal - especialmente a partir do paradigmático julgado do STF a respeito: Recurso Extraordinário 631.240, também julgado em 2014.

Inegavelmente, uma das atuais questões discutidas em processo e previdência são as hipóteses em que se faz necessário o requerimento do benefício previdenciário na via administrativa e, especial-mente, as situações excepcionais em que tal requerimento se torna despiciendo5.

Evidentemente que se houver hipótese excepcional em que o se-gurado possa vir a diretamente requerer benesse de caráter alimentar perante o Poder Judiciário, sem que tenha que passar pelo - não raro - melindroso iter administra-tivo, tal situação será cuidadosa-mente considerada e levada a cabo pelo procurador constituído pelo hipossuficiente.

Eis a razão da nossa objetiva investigação nesta passagem, com atualização do posicionamento adotado principalmente pela juris-prudência, em exegese contemporânea do teor da histórica Súmula 89, editada pelo STJ nos idos de 1993, a exigir o requerimento ad-ministrativo previdenciário, não obstante ser desnecessário o exau-rimento desta via.

Passemos, então, a repercutir a recente decisão proferida no RE 631.240-MG que, em sede de repercussão geral - caráter vinculante -, instituiu novo requisito à pro-positura de ações previdenciárias, uniformizando o entendimento a respeito do tema, nos termos da essência da ementa que segue:

"A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é pre-ciso haver necessidade de ir a juízo. A concessão de benefícios previden-ciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendi-mento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou ma-nutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a presta-ção mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo - salvo se depender da análise

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de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração -, uma vez que, nesses casos, a condu-ta do INSS já configura o não acolhi-mento ao menos tácito da pretensão. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito;

(ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracteri-zado o interesse em agir pela resistên-cia à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e

(ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Au-tarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, es-tará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. Em todos os casos acima - itens (i), (ii) e (iii) -, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, o qual deverá intimar a autora - que alega ser trabalhadora rural informal - a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão adminis-trativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir."6

Tratando-se, portanto, de aposentadorias previdenciárias, independentemente se processadas perante o rito sumaríssimo ou o rito comum ordinário na Justiça Federal, ratifica o STF que se faz indispensável o requerimento administrativo, sendo judicializado o confiito tão somente a partir de cabal comprovação de indeferimento do pleito pela agência do INSS.

Por outro lado, entende-se que as demandas revisionais, aqui incluída a questão de revisão da RMI a...

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