Processo de Execução

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Ocupação do AutorAdvogado. Juiz aposentado do TRT da 9.ª Região
Páginas60-71

Page 60

1. Comentário

Como vimos em Capítulo anterior, o processo representa o método ou a técnica de que se vale o Estado para dirimir os conflitos interindividuais de interesses juridicamente tuteláveis. A tônica no elemento de juridicidade é sobremaneira relevante, pois o nosso ordenamento processual, preservando o seu conteúdo ético, não dá guarida a pretensões juridicamente impossíveis — ou, melhor: juridicamente inatendíveis.

O processo do trabalho, por sua vez, constitui o instrumento posto à disposição dos órgãos integrantes da Justiça do Trabalho para a composição das lides — individuais ou coletivas — envolvendo empregados e empregadores, assim como outras pessoas que se compreendam na competência constitucional dessa Justiça Especializada (CF, art. 114).

A doutrina, colocando em realce a natureza do provimento jurisdicional, a que o exercício do direito de ação geralmente conduz, reconhece a existência de três classes de processo: a) de conhecimento; b) de execução; e c) cautelar. A CLT trata dos processos de conhecimento e execução em Título comum (X), conquanto em Capítulos distintos (I e V, respectivamente). Desconhece a CLT o processo cautelar, conforme pudemos demonstrar em outra obra, pois o que está nos incisos IX e X do art. 659 desse texto não é uma providência tipicamente acautelatória, como se tem pensado, e sim medida semelhante à que é concedida em ação de mandado de segurança (As ações cautelares no processo do trabalho. 5.ª ed. São Paulo: LTr, 2005. p. 76-80). O que se pode admitir é que essa medida possua “traços” de cautelaridade.

O CPC de 2015 foi reestruturado de maneira diversa do Código de 1973, pois abandou a tríplice divisão em: a) processo de conhecimento; b) processo de execução; e c) processo cautelar, passando a prever: a) tutela de urgência; b) processo de conhecimento/cumprimento da sentença; c) processo de execução.

Em decorrência disso, o processo do trabalho apresenta, na atualidade, a seguinte estrutura: a) processo de conhecimento; b) processo de execução; c) tutela provisória (esta última, tomada por empréstimo ao CPC).

1.1. Processo de conhecimento

No processo cognitivo, provoca-se o exercício da função jurisdicional do Estado para que este diga, com o caráter neutral que lhe impõe a lei (CPC, art. 139, I), e mediante sentença de mérito, com qual dos litigantes está o direito. Podemos sustentar, portanto, que o objeto desse processo é um provimento que aprecie o mérito da ação, embora a

Page 61

própria norma processual preveja alguns casos em que, excepcionalmente, o processo se extinguirá sem resolução das questões de fundo (CPC, art. 485, I a X).

É oportuno observar que a cognição traduz a relação que se estabelece entre o juiz (ser cognoscente) e os fatos da causa (objeto cognoscível). Sob esse aspecto, fica clara a existência de cognição também nos processos cautelar e de execução. O que se passa é que, nos dois últimos processos referidos, a “carga” cognitiva é algo rarefeita, quase imperceptível, ao passo que no de conhecimento ela é intensa, chegando, por isso mesmo, a dar nome ao próprio processo em questão.

Adotando como critério a natureza da resolução judicial que se pede ou que é emitida, a doutrina estabeleceu uma subclassificação do processo de conhecimento em:

  1. declaratório; 2. condenatório; e 3. constitutivo. No primeiro, o provimento jurisdicional limita-se a declarar a existência ou a inexistência ou do modo de ser de relação jurídica, a autenticidade ou falsidade de documento (CPC, art. 19); no segundo, ao lado da declaração, que lhe é implícita, coloca-se determinada sanção (condenação) ao réu; no terceiro, em que também se faz ínsita a declaratividade, opera-se a modificação da relação ou da situação jurídica material intersubjetiva, havida ou ainda existente.

  2. A sentença declaratória será positiva ou negativa, segundo reconheça a existência ou a inexistência da relação jurídica; cumpre observar, contudo, que serão sempre declaratórias as sentenças que rejeitarem os pedidos formulados pelo autor (declaratórias-negativas), nada obstante este pretendesse obter um provimento condenatório do réu. Em outras hipóteses, como na de ação declaratória puramente negativa, a rejeição assume caráter de conteúdo declaratório-positivo.

    No processo do trabalho são sentenças declaratórias-positivas as que reconhecem — e negativas as que rejeitam — a relação de emprego entre as partes, pressupondo-se que o autor havia ingressado em juízo para pedir, apenas, um provimento declaratório; caso ele postulasse, além disso, a condenação do réu ao pagamento de certas parcelas indicadas na peça inaugural, e o órgão judicante viesse a acatar as suas pretensões, resulta evidente que a sentença seria declaratória-condenatória: declaratória, na parte em que reconheceu a presença dos elementos constitutivos da relação de emprego; condenatória, na que impôs ao réu o pagamento das quantias pleiteadas pelo autor. Cientificamente, entretanto, poder-se-ia advogar que a sentença, na espécie em exame, seria condenatória, porquanto ao formular a regra sancionatória traria em si, implícita e logicamente identificável, a declaração de reconhecimento da existência da relação de emprego.

    As sentenças meramente declaratórias não são exequíveis, valendo como simples preceito. Esse esclarecimento vinha estampado no art. 290, caput, do CPC de 1939, que arrematava: “mas a execução do que houver sido declarado somente poderá promover-se em virtude de sentença condenatória” O silêncio do diploma processual civil vigente não pode ser interpretado como um abandono formal àquele preceito e sim como ocasional inadvertência do legislador, ou mesmo uma sua pressuposição de que estava na essência dos provimentos puramente declaratórios ser infensa a possibilidade de serem executáveis. Segue-se que, se a parte quiser exigir da adversa o cumprimento da obrigação correspondente ao direito que lhe foi reconhecido por sentença desta natureza (declaratória), deverá ajuizar outra ação, em que visará à consecução do pertinente decreto condenatório.

    Page 62

    Os efeitos das sentenças declaratórias, regra geral, são retroativos (ex tunc), vale dizer, voltam-se no tempo para apanhar a situação de fato ou de direito no nascedouro, salvo se nisto forem obstados pela prescrição extintiva bienal ou quinquenal (CF, art. 7.º, XXIX; CLT, art. 11).

  3. As sentenças condenatórias afirmam a existência do direito, reconhecem a sua violação e, em consequência, dirigem ao réu um preceito sancionatório, sob a forma de obrigação de entregar coisa certa ou incerta; de fazer ou de não fazer, ou de pagar quantia certa.

    Exemplo de obrigação de entregar coisa certa seria a que tivesse como objeto a devolução de mostruário, pertencente ao empregado-vendedor, que se encontrasse, indevidamente, na posse do empregador; de fazer, a anotação na Carteira de Trabalho; a reintegração de empregado estável; de entregar as guias para a movimentação dos valores depositados no FGTS; de não fazer, a consistente na proibição de transferir o empregado para locaIidade diversa daquela em que deve prestar os seus serviços e de alterar, enfim, em prejuízo do trabalhador, determinada cláusula contratual, etc.

    As sentenças condenatórias possuem apenas eficácia executiva, porquanto a execução forçada não se contém nelas. Como assevera Tomás Pará Filho, “a sentença condenatória é um comando sancionatório, a que a lei adjunge a virtualidade da execução forçada” (apud Coqueijo Costa, obra cit., p. 363).

    Essa classe de sentença cria, pois, um outro direito de ação: o de invocar a tutela jurisdicional executiva do Estado.

    Os efeitos que lhe são inerentes têm sentido retro-operante (ex tunc).

  4. Os provimentos constitutivos criam uma situação ou relação jurídica, seja modificando, seja extinguindo a anterior; os seus efeitos liberam-se imediatamente ao proferimento, motivo por que não comportam execução forçada. Os efeitos temporais dessa modalidade de resolução judicial são ex nunc, ou seja, atuam somente a partir do momento em que se verifica o trânsito em julgado da decisão (sentença ou acórdão).

    Sentença de típico teor de constitutividade, no processo do trabalho, é a que, em ação aforada pelo empregador, com o objetivo de demonstrar a prática de falta grave pelo empregado estável, conclui pela existência do ato faltoso e determina a ruptura do vínculo contratual.

    Há, a propósito, duas espécies de sentenças constitutivas: as necessárias e as facultativas; no primeiro caso, a lei exige que a constituição, modificação ou extinção do estado ou do liame jurídico apenas possa ocorrer mediante provimento jurisdicional (como se dá no exemplo há pouco citado); no segundo, os efeitos jurídicos de certas manifestações de vontade podem ser produzidos extrajudicialmente, como, e. g., na hipótese de dissolução do contrato de trabalho de empregado desprovido de garantia do emprego. É evidente que, se, neste último caso, as partes não se avierem quanto aos fatos que narramos, restará a uma delas o ingresso em juízo, caracterizando, dessa forma, a facultatividade da sentença constitutiva que vier a ser aí proferida.

    Page 63

1.2. Processo de execução

Não passou despercebido à argúcia de Carnelutti que, no processo de conhecimento, vai-se dos fatos ao direito (da mihi factum dabo tibi ius, consoante a vetusta regra romana), ao passo que no de execução se parte do direito (já reconhecido pela sentença condenatória) aos fatos (cuja atividade executória os altera para adequá-los...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT