Processo constitucional: o processo como locus devido para o exercício da democracia

AutorFernando Laércio Alves da Silva
CargoProfessor Adjunto I da Universidade Federal de Viçosa/MG
Páginas157-188
Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume 16. Julho a dezembro de 2015
Periódico Semestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. ISSN 1982-7636. pp. 157-188
http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/index
157
PROCESSO CONSTITUCIONAL: O PROCESSO COMO LOCUS DEVIDO PARA O
EXERCÍCIO DA DEMOCRACIA
1
CONSTITUTIONAL PROCESS: THE PROCESS AS A DUE PLACE TO THE
EXERCISE OF DEMOCRACY
Fernando Laércio Alves da Silva
Professor Adjunto I da Universidade Federal de Viçosa/MG.
Doutorando em Direito Processual pela PUCMINAS. Mestre em
Direito pela UNIFLU. Bolsista CAPES.
fernando.laercio@ufv.br
RESUMO: Em 1984, José Alfredo de Oliveira Baracho publicou, no Brasil, a obra intitulada
Processo Constitucional, por meio da qual pioneiramente apresentou os elementos de conexão
entre Constituição e Processo, levando a uma radical mudança na perspectiva pela qual se
concebe o Direito Processual e sua importância para a construção do Estado Democrático de
Direito. Mais de trinta anos depois, intensas tem sido as pesquisas jurídicas a partir da teoria do
processo constitucional não apenas nos tradicionais campos do Direito Processual, como
também em ramos do direito público como o direito constitucional, direito administrativo e
direito eleitoral. Não obstante isso, ainda se percebe certos equívocos e incompreensões tanto
em relação aos elementos estruturais do processo constitucional como em relação a sua
importância para o Direito. Diante disso, o presente trabalho tem por objetivo a retomada dos
elementos estruturais do processo constitucional de modo a tentar afastar quaisquer equívocos
ainda existentes quanto à abrangência e a profundidade dessa importante teoria processual.
PALAVRAS-CHAVE: Processo constitucional; democracia; modelo constitucional de
processo; teoria geral do processo.
1
Artigo recebido em 30/09/2015 e aprovado em 27/11/2015.
Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume 16. Julho a dezembro de 2015
Periódico Semestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. ISSN 1982-7636. pp. 157-188
http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/index
158
ABSTRACT: In 1984, José Alfredo de Oliveira Baracho published in Brazil, the work entitled
Constitutional Process, by which pioneered presented the connecting factors between
Constitution and Process, leading to a radical change in perspective from which one sees the
Procedural Law and its importance for the construction of a democratic state. More than thirty
years later, intense has been the legal research from the theory of the constitutional process not
only in traditional fields of Procedural Law, as well as in branches of public law and
constitutional law, administrative law and electoral law. Nevertheless, still perceive certain
misconceptions and misunderstandings both in relation to the structural elements of the
constitutional process as well as its importance to the law. Thus, the present study aims to the
resumption of the structural elements of the constitutional process in order to try to remove any
remaining misconceptions as to the scope and the depth of this important procedural theory.
KEYWORDS: Constitutional procedure; democracy, contradictory; constitucional processo
model; general theory of process
SUMÁRIO: 1. Considerações introdutórias. 2. A inafastável relação entre Estado Democrático
de Direito e Processo. 3. Processo constitucional: o processo como metodologia de garantias
dos direitos fundamentais. 4. Considerações finais. Referências bibliográficas.
1. Considerações introdutórias
Nos últimos vinte e cinco anos, inúmeros estudos têm sido desenvolvidos no Brasil com
o objetivo de promover a releitura ou reconstrução dos diversos campos do saber jurídico a
partir do arcabouço principiológico constitucional. Este processo de constitucionalização do
direito, identificado por Virgílio Afonso da Silva com amparo na doutrina de Louis Favoreu
– como constitucionalização-transformação, se caracteriza pela “mudança do conteúdo dos
outros ramos do direito provocada pela constituição”
2
como consequência da
2
SILVA, Virgílio Afonso. A Constitucionalização do Direito: Os direitos fundamentais nas relações entre
particulares, p. 48.
Revista Eletrônica de Direito Processual – REDP. Volume 16. Julho a dezembro de 2015
Periódico Semestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. ISSN 1982-7636. pp. 157-188
http://www.e-publicacoes.uerj.br/index.php/redp/index
159
constitucionalização dos direitos e liberdades, impregnando, em sua essência, todos os campos
do Direito.
A partir desse movimento, torna-se comum falar-se, por exemplo, em direito civil
constitucional, direito penal constitucional, direito do trabalho constitucional, direito ambiental
constitucional, direito administrativo constitucional, expressões utilizadas prodigamente pelos
autores destes tradicionais campos do pensamento jurídico, sempre no intuito de trabalhar seus
institutos a partir de uma nova perspectiva, qual seja, a perspectiva dos princípios
constitucionais.
Essa nova metodologia de trabalho do (e no) Direito, no Brasil, como já mencionado, é
relativamente recente, remontando à década de oitenta do século passado. Isso porque, somente
a partir do fim do governo ditatorial e, principalmente, da promulgação da Constituição Federal
de 1988, foi que se encontrou campo fértil para seu florescimento
3
.
Tudo isso se deve à opção constitucional realizada em 1988 de se reinstituir
4
no Brasil a
estrutura de um Estado Democrático de Direito, “que se empenha em assegurar aos seus
cidadãos o exercício efetivo não somente dos direitos civis e políticos, mas também e sobretudo
dos direitos econômicos, sociais e culturais, sem o quais de nada valeria a solene proclamação
daqueles direitos”
5
.
É exatamente esse compromisso constitucional de empenhar-se em assegurar aos
cidadãos o efetivo exercício de seus direitos no Estado Democrático de Direito que leva à
mudança do conteúdo dos diversos campos do Direito. Neste contexto, a relação entre
Constituição e Processo, sem demérito à relação estabelecida entre a Constituição e os demais
campos jurídicos, se mostra de natureza ímpar.
3
De fato , embora na Europa a constitucionalização dos direitos e das liberdades tenha se desenvolvido de longa
data (referências são a Declaração Universal dos Direitos do Homem da ONU, de 1948 e as Constituições da
Alemanha, originalmente chamada Lei Fundamental de Bonn e, desde a reunificação alemã, Lei Fundamental da
República Federal da Alemanha, de 1949, e da Itália, de 1947), no Brasil, como em quase todos os demais Estados
latino-americanos, somente após o encerramento do ciclo dos governos ditatoriais foi possível alcançar tal intento.
4
André Del Negri questiona se, de fato, é possível falar-se em reinstituição ou retorno da democracia no Brasil,
tendo em vist a o fato de, em quase duzentos anos de emancipação política em relação a Portugal, nunca se ter
conseguido no Brasil implantar e manter a democracia de maneira estável e se gura (Controle de
Constitucionalidade no Processo Legislativo: teoria da legitimidade democrática, p. 76).
5
MENDES, Gi lmar Ferreira; MÁRTIRES COELHO, Inocêncio; GONET BRANCO, P aulo Gustavo. Curso de
Direito Constitucional, p. 149.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT