Processo Civil

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PENHORA ONLINE QUE INVIABILIZA A ATIVIDADE ECONÔMICA DA EMPRESA DEVE SER SUBSTITUÍDA PELA PENHORA DO SEGURO GARANTIA

Tribunal de Justiça do Paraná

Agravo de Instrumento n. 1.487.787-3

Órgão Julgador: 2a. Câmara Cível

Fonte: DJ, 17.05.2016

Relator: Desembargador Lauro Laertes de

Oliveira

Ementa

Tributário. Agravo de Instrumento. Execução Fiscal. ICMS. Seguro garantia. Recusa da Fazenda Pública calcada na intempestividade da nomeação e inobservância da ordem de gradação legal. Determinação de penhora on-line. 1. Oferta de garantia que, embora intempestiva, realizada antes de qualquer providência tendente à prática de atos constritivos. Equiparação legal do seguro garantia ao depósito em dinheiro e carta de fiança para fins de garantia do juízo da execução fiscal (LEF, art. 7º, II e art. 9º, I e II). Gradação legal do art. 11 da Lei 6.830/80 que diz respeito à penhora ou arresto. Rejeição que não atingiu qualquer requisito formal da apólice. Recusa indevida. 2. Nomeação da garantia. Prazo peremptório. Não obstante, pedido que pode ser analisado como substituição da penhora. Direito do executado (LEF, art. 15, I). Entendimento do Superior Tribunal de Justiça consolidado no ERESP n. 1.077.039/ RJ não mais aplicável. Art. 835, § 2º, do CPC/2015 que equipara a fiança bancária e o seguro garantia judicial ao dinheiro para fins de substituição da penhora. Necessária revisão de entendimento a fim de alinhá-lo às alterações legislativas e à finalidade do seguro garantia para não torná-lo letra

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morta. Figura jurídica que, por sua liquidez e segurança jurídica, é igualmente eficaz ao dinheiro. Ainda que se entenda pela inaplicabilidade da norma inserta no CPC/2015, aplica-se, em concreto, o princípio da menor onerosidade do devedor (CPC/2015, art. 805). Penhora on-line. Ausência de razoabilidade. Paralisação de recursos em montante superior a um milhão de reais. Grave prejuízo ao executado. Recurso provido. (a) “De se consignar que, em uma democracia, é extremamente necessário que as decisões prolatadas pelo Poder Judiciário possam demonstrar um mútuo comprometimento de modo a repetir os acertos do passado e corrigir, de forma fundamentada, os seus erros. (...) Por isso, deve-se perscrutar o modo pelo qual um caso similar vinha sendo decidido até então, confrontando, necessariamente, a jurisprudência com as práticas sociais que, em cada quadra do tempo, surgem estabelecendo novos sentidos às coisas e que provocam um choque de paradigmas, o que sobremodo valoriza o papel da doutrina jurídica e a interdisciplinari-dade do direito.” (MENDES, Gilmar
F.; STRECK, Lenio L. Comentário ao artigo 93, IX. Comentários à Constituição do Brasil. Saraiva/Almedina, 2013. p. 1.325). (b) Manter paralisados recursos em montante superior a um milhão de reais é medida que traz repercussões significativas para qualquer empresa. Nenhuma atividade produtiva que conviva em ambiente competitivo pode, sem graves prejuízos, indisponibilizar quantia dessa monta. A paralisação dos recursos naturalmente deve ser admitida, mas se há meios de evitá-lo, sem prejuízo para o devedor, tais meios devem ser privilegiados pelo julgador. (REsp 1116647/ES – Rel. Ministra Nancy Andrighi – 3ª Turma – DJe 25-3-2011). (c) Elias Marques de Medeiros Neto, em excelente trabalho intitulado “O “já” vigente parágrafo único do artigo 805 do Novo Código de Pro-cesso Civil”, enfatiza sobre o clássico caso de possível e eventual colisão de direitos fundamentais entre a efetivi-dade da execução em prol do credor e o princípio da menor onerosidade ao devedor, indicando farta doutrina nacional e estrangeira sobre a necessidade de se realizar uma execução equilibrada, aplicando-se o princípio da proporcionalidade. Cita Miguel Angel Ferandez Ballesteros, que diz: “la atividade ejecutiva debe velar tanto porque se satisfaga por completo el interés del acreedor ejecutante, como porque no se destruya la existência económica del ejecutado.” (Coleção Grandes Temas do novo CPC, Direito Intertemporal, vol. 7, Editora JusPodivm, pp. 209/217). Grifei. (d) Aqui no caso concreto a penhora em dinheiro pode levar à destruição econômica da devedora e a penhora do seguro garantia satisfaz plenamente os anseios do credor (Estado), decorrente de crédito de tributo (ICMS), sujeito ainda a discussão judicial via embargos à execução.

Relatório

Vistos, relatados e discutidos estes autos de agravo de instrumento n.
1.487.787-3, da 2ª Vara da Fazenda Pública da Comarca da Região Metropolitana de Maringá – Foro Central de Maringá, em que figuram como agravante W.M.S. Supermercados do Brasil Ltda., e agravado o Estado do Paraná.
1. Trata-se de agravo de instrumento contra decisão interlocutória que, nos autos de execução fiscal n. 0000970-06.2014.8.16.0190, indeferiu pedido do executado para a penhora de seguro garantia, sob os fundamentos da recusa manifestada pela Fazenda Pública, por não atender a ordem legal de preferência (LEF, art. 11), pelo direito do fisco de substituição da penhora (LEF, art. 15), porque a execução dá-se no interesse do credor e, por fim, em virtude da intempestividade da nomeação.

2. O agravante aduz, em síntese, que: a) a decisão agravada contraria a lei, porque o Código de Processo Civil aplica-se subsidiariamente ao processo da execução fiscal (LEF, art. 1º); b) a carta de fiança e o seguro garantia foram equiparados ao depósito em dinheiro para fins de penhora em execução fiscal (LEF, art. 9º, II, § 3º); c) a penhora pode ser substituída por fiança bancária ou seguro garantia judicial, em valor não inferior ao do débito mais 30% (CPC, art. 656, § 2º); d) a execução deve ser promo-vida do modo menos gravoso para o devedor (CPC, art. 620) e a penhora on-line é extremamente gravosa, porque o valor objeto da constrição é fundamental para o fiuxo de caixa da empresa, a fim de pagar fornecedores e funcionários; e) o Superior Tribunal de Justiça, bem como este Tribunal, têm entendido que o princípio da menor onerosidade do devedor deve prevalecer se o caso concreto assim recomendar, uma vez que a ordem legal de bens não é absoluta;
f) após a entrada em vigor da Lei n.
13.043/2014, que equiparou o seguro garantia e a carta de fiança bancária ao depósito em dinheiro para garantia de execução fiscal, a Procuradoria do Estado do Paraná publicou resoluções para estabelecer critérios e condições para aceitação dessas garantias e o seguro juntado aos autos preenche todos os requisitos contidos na referida normativa; g) o fato de a nomeação ter sido realizada fora do prazo legal não mitiga o direito do devedor ao princípio da menor onerosidade; h) a matéria a ser discutida nos embargos, ICMS sobre produtos da cesta básica, possui relevância jurídica e tem sido objeto de debate nos Tribunais. Requer a antecipação dos efeitos da tutela recursal, bem como a concessão de efeito suspensivo, a fim de que seja aceita a garantia apresentada e obstada a penhora on-line determinada. Afinal, pugna seja dado provimento ao recurso para que a pe-

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nhora recaia sobre o seguro garantia e não seja feita a penhora on-line.
3. Efeito ativo e suspensivo concedidos. Recurso respondido (fis. 136-138). Dispensável a intervenção do Ministério Público (Súmula 189/STJ).

Voto e seus fundamentos

4. A controvérsia cinge-se à segurança do juízo na execução fiscal
n. 0000970-06.2014.8.16.0190, mediante apólice bancária de seguro garantia.
5. Em primeiro lugar, colhe-se do instrumento que W.M.S. Supermercados, no oitavo dia (30-4-2015) após a sua citação (22-4-2015) na execução fiscal em referência, ofereceu apólice de seguro garantia, no valor nominal de R$ 1.458.449,04 (um milhão, quatrocentos e cinquenta e oito mil, quatrocentos e quarenta e nove reais e quatro centavos), a fim de garantir o juízo e oferecer embargos à execução fiscal (fi. 31/TJ).
6. A Fazenda Pública recusou a garantia tanto pela intempestividade da nomeação, quanto pela inobservância da ordem de gradação legal (LEF, art. 11). Estes argumentos foram utilizados pelo juízo de primeiro grau na decisão agravada para indeferir a garantia e determinar a penhora on-line, o que foi reforçado pelo Estado em suas contrarrazões.
7. Em decorrência da antecipação dos efeitos da tutela recursal, bem como da concessão de efeito suspensivo ao presente recurso, a garantia ofertada foi inicialmente aceita e a penhora on-line não se concretizou.
8. Em segundo lugar, importa destacar que o caso dos autos cuida da segurança do juízo, mediante oferecimento de seguro garantia e não da nomeação de bens à penhora (LEF, art. 9º, inciso II). Ademais, embora intempestivo, o oferecimento da apólice de seguro foi feito antes de ser tomada qualquer providência da Fazenda Pública tendente a atos constritivos. Por fim, a recusa da Fazenda Pública não teve como fundamento requisito formal da apólice securitária.
9. Em terceiro lugar, vale lembrar que, para garantir a execução, o executado poderá efetuar depósito em dinheiro, apresentar fiança bancária ou seguro garantia que, pelo menos para esses fins, foram equiparados pela Lei
n. 6.830/80 (art. 7º, II e art. 9º, I e II – com alterações promovidas pela Lei
n. 13.043/2014). Não tendo optado por uma dessas hipóteses, o executado poderá, ainda, nomear bens à penhora, sob pena de, não efetivada a garantia por qualquer modalidade, a penhora poder recair sobre qualquer um de seus bens (LEF, art. 10). Inclusive, a ordem legal prevista no artigo 11 diz respeito à penhora ou arresto e não à garantia do juízo por depósito, seguro ou fiança.
10. Essas conclusões podem ser extraídas do acórdão proferido pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp
n. 1.337.790/PR, julgado mediante rito do artigo 543-C do CPC/73, segundo o qual há direito de recusa da Fazenda Pública quando a nomeação de bens à penhora não obedecer à gradação legal. Confira-se:

“Processual civil. Execução fiscal. Nomeação de bens à penhora. Precatório. Direito...

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