Princípios do direito do trabalho

AutorFrancisco Meton Marques De Lima/Francisco Péricles Rodrigues Marques De Lima
Ocupação do AutorMestre em Direito e Desenvolvimento pela UFC. Doutor em Direito Constitucional pela UFMG/Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Ceará
Páginas68-80

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1. Considerações gerais

Princípios, originariamente, pertencem à geometria e designam verdades primeiras. No Direito, são verdades gerais vinculantes, reconhecidas como normas jurídicas dotadas de vigência, validez e obrigatoriedade. Já registramos:

Princípio significa a base, o ponto de partida e ao mesmo tempo a síntese e o ponto de chegada. Todos os princípios são circulares: o princípio confunde-se com o fim. Assim, temos a forma dos corpos celestes, o movimento planetário, tudo obedecendo à lei circular das coisas do Universo. As leis, quer naturais, quer humanas, são descrições que se prestam para compor o círculo, unindo em pontilhados o espaço compreendido entre o ponto de partida e o ponto de chegada. O ponto de partida e o de chegada são coincidentes e se representam pelo PRINCÍPIO.

O Direito, em geral, não é diferente. Parte-se do princípio — Direito é inter--relação intersubjetiva. Fazem-se as leis (escritas ou consuetudinárias, expressas ou implícitas) para se atingir um fim, ou seja, a perfeita inter-relação intersubjetiva, caminho da justiça e da paz.16

Os princípios gerais do direito são normas fundadas nem sempre na autoridade estatal, mas que possuem intenso vigor normativo, constituindo o fundamento mais firme da eficácia das leis e dos costumes. São preceitos de caráter transcendental, que correm ao mesmo tempo atrás, à frente, ao lado, à sombra, acima, abaixo, por dentro e por fora do sistema positivo escrito e das práticas sociais.

Flórez-Valdés define os princípios gerais do direito como “as ideias fundamentais sobre a organização jurídica de uma comunidade, emanadas da consciência social, que

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cumprem funções fundamentadora, interpretativa e supletória de todo o ordenamento jurídico”17.

Os princípios reúnem ao mesmo tempo as qualidades de base sólida e permanente do Direito e conteúdo fluido e volátil, responsável pela evolução e atualidade jurídicas. Dworkin chama “de ‘princípio’ um standard, que deve ser observado não porque provoque ou mantenha uma situação (econômica, política ou social) desejada, mas como uma exigência de justiça, ou de retidão, ou de qualquer outra dimensão da moral”18.

A propósito, diz Bandeira de Mello:

Violar um princípio é muito mais grave do que transgredir uma norma. A desatenção ao princípio implica ofensa não apenas a um mandamento obrigatório, mas a todo o sistema de comandos. É a mais grave forma de ilegalidade ou inconstitucionalidade, conforme o escalão do princípio atingido, porque representa insurgência contra todo o sistema, subversão de seus valores fundamentais ... 19

2. Princípios peculiares do direito do trabalho

Há os princípios gerais do Direito, como dar a cada um o que é seu, não causar dano a ninguém e proibição de enriquecimento ilícito, e os princípios que informam cada ramo do Direito.

No Trabalho, divisamos duas categorias: a) os princípios gerais de Direito do Trabalho; e b) os princípios de realização ou de concretização do Direito do Trabalho. Estes são subprincípios ou desdobramentos daqueles. Barbagelata (2008, p. 19-29) alude ainda aos princípios de direito do trabalho de 2ª geração, que equivalem aos direitos fundamentais do trabalho, expostos no Cap. III, 5.

Os princípios gerais do DT abrangem o direito individual e o coletivo, representados pelos seguintes: a) da progressão social ou da justiça social; b) da proteção; c) da equidade; d) da autodeterminação coletiva.

Os princípios de concretização são os seguintes: a) in dubio pro operario; b) regra da aplicação da norma mais favorável; e c) regra da condição mais benéfica; d) da irrenunciabilidade dos direitos; e) da continuidade da relação de emprego; f) da primazia da realidade; g) da irretroatividade das nulidades trabalhistas; h) da boa-fé; i) da substituição automática; j) da razoabilidade; l) da irredutibilidade salarial; m) da igualdade salarial20.

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Os de 2ª geração, de que fala Barbagelata, equivalem aos que denominamos princípios gerais do direito do trabalho, acima declinados, aos direitos fundamentais do trabalho, expostos no item 5 do Capítulo III, e aos princípios comuns ao sistema dos direitos humanos: a) princípio da complementariedade e interdependência de todas as normas de direitos humanos; b) primazia da disposição mais favorável à pessoa humana; c) princípios da progressividade e da irreversibilidade; d) adequação aos critérios assentados pelos organismos internacionais competentes; e e) presunção de autoexecução e autoaplicabilidade.

Aplicam-se os princípios sob comento também às relações de trabalho não subordinado, que passaram para a competência da Justiça do Trabalho, como regra, quando o trabalhador for a parte frágil da relação.

Os princípios de direito do trabalho são fonte formal do direito do trabalho e do processo do trabalho, cumprem função conformadora, informadora e ainda de barreira contra invasão do direito comum, cf. arts. 8º, parágrafos, e 769 da CLT.

3. Os princípios gerais do direito do trabalho
3.1. Princípio da progressão social - Justiça social

Progresso significa marcha para frente; avanço; movimento para a perfeição. Progressão social adjudica a melhoria do IDH da população, a vontade constante e perpétua de conseguir avanço intelectual, material e social das pessoas, enfim, melhor qualidade de vida.

O desenvolvimento compreende a soma de todas as políticas e resultados no sentido de obter um progresso material e social. A economia do Brasil ocupa as primeiras posições no mundo; porém, socialmente, o país rivaliza-se com nações que ainda vivem sob regime tribal. Esse fosso que separa o progresso econômico do social rebaixa o nível de desenvolvimento do País. Daí o apelo cada vez mais forte deste princípio.

Na Constituição, a base de apoio são os arts. 3º (“Constituem objetivos da República Federativa do Brasil: II — garantir o desenvolvimento nacional; III — erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais; ...”), 7º, caput (melhoria da condição social do trabalhador), 193 (“A ordem social tem por base o primado do trabalho e por objetivo o bem-estar e a justiça social”) e todo o Título VIII. O art. 170, III, incorpora a regra da função social da propriedade. E o Código Civil de 2002 ampliou para exigir que, além da propriedade, também os contratos cumpram função social.

A legislação afirmativa deste princípio é pródiga. Manifesta nos diversos programas sociais, tais como: proteção do deficiente (Lei n. 7.853/89), seguro-desemprego (regido pela Lei n. 7.998/90), FAT — Fundo de Amparo ao Trabalhador (Lei n. 8.352/91), FINSOCIAL/PIS/PASEP (Lei n. 7.894/89), bem de família social (Lei n. 8.009/90), mãe social (Lei
n. 7.644/87), benefícios da Previdência Social (Lei n. 8.213/91). A Lei n. 8.069/90 institui o Estatuto da Criança e do Adolescente; a Lei n. 8.560/92 regula a investigação de paternidade; a Lei n. 10.421/02 estende à mãe adotante o direito da mãe biológica; a Lei n.
10.173/01 prioriza os processos judiciais das pessoas maiores de 65 anos. O Governo FHC desenvolveu vários programas, como o Bolsa-Escola, o Vale-Gás e outros, agora unificados no Bolsa-Família. O Governo Lula já aprovou a Lei de Renda Mínima (n. 10.835/2003), o

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Estatuto do Idoso (Lei n. 10.741/03), o Programa Fome Zero, combate ao trabalho escravo (Lei n. 10.803/03), o direito de o patrão deduzir no cálculo do Imposto de Renda o valor da contribuição para a Previdência Social em relação ao empregado doméstico (Lei n.
11.324/06), a qual estendeu ao doméstico o direito a férias de 30 dias e a estabilidade da gestante. A Lei n. 11.340/06 reprime a violência doméstica contra a mulher. No ano de 2008, cinco leis social-trabalhistas foram publicadas, reafirmando a progressão social: a Lei n. 11.788/08, que regulamenta a relação de estágio; a n. 11.692/08, que institui o Programa Nacional de Inclusão de Jovens — Projovem; a Lei n. 11.770/08 cria o Programa Empresa Cidadã, facultando o elastececimento da licença-maternidade para seis meses; a Lei n. 11.644/08 acrescenta à CLT o art. 442-A, proibindo a exigência de tempo de experiência por superior a seis meses para admissão; a Lei n. 11.718/08 regulamenta o trabalho rural de pequeno prazo; a Lei n. 12.010/09 modifica o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente), facilitando as adoções, excluindo barreiras que dificultavam a adoção por casais homossexuais; n. 12.288/10, que institui o Estatuto da Igualdade Racial; n.
12.506/11, que regulamentou o aviso-prévio proporcional; n. 12.513/11, que institui o PRONATEC — Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego, alterando as leis do Projovem e do FAT; Lei n. 12.594/12, que institui o SINASE, Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo, alterando o ECA, o sistema de aprendizagens e acrescenta ao art. 429 da CLT o § 2º, para incluir nos...

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