O princípio da insignificância sob um olhar inspirado em Ferrajoli: a leitura do consumo de drogas em precedente do STJ

AutorBruno Espiñeira Lemos
CargoProcurador do Estado da Bahia
Páginas165-184
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Revista Judiciária do Paraná – Ano X – n. 9 – Maio 2015
O princípio da insignicância sob um olhar inspirado
em Ferrajoli: a leitura do consumo de drogas em
precedente do STJ
Bruno Espiñeira Lemos1
Procurador do Estado da Bahia
Resumo: O presente trabalho discute o entendimento do
Superior Tribunal de Justiça acerca da (não) incidência do
princípio da insignicância no crime previsto no art. 28 da Lei
11.343/06 (RHC 35.920-DF) e sua dissonância com a perspectiva
garantista de Ferrajoli e com outros julgados que envolveram o
princípio da insignicância em matéria penal.
1. Introdução
N      vêm ganhando destaque
as questões envolvendo a aplicação do princípio da insignicância.
A ideia do presente debate me veio ao lume diante de profícua discussão
com o jovem e competente advogado Victor Minervino Quintiere, que bem
trabalhou esse tema no seu mestrado, e nessa perspectiva é que se pretende
abordar a (não) incidência do referido princípio com relação ao crime pre-
visto no art. 28 da Lei de Tóxicos (Lei 11.343/06), amparando-nos no refe-
rencial teórico de Ferrajoli e em precedente do Superior Tribunal de Justiça.
Por essa razão, dividiu-se o trabalho em duas partes: i) Luigi Ferrajoli
e os fundamentos do garantismo penal; ii) consumo de drogas no Brasil, o
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Bruno Espiñeira Lemos
princípio da insignicância em matéria penal e o precedente do Superior
Tribunal de Justiça.
A primeira parte encontra substância na obra Direito e Razão, de Luigi
Ferrajoli, desde os custos do direito penal, passando pelas doutrinas (não)
iluministas de separação entre o direito e a moral, com o objetivo de se al-
cançar, nalmente, as considerações sobre os fundamentos do garantismo
penal na perspectiva desse autor.
Por m, na segunda parte do artigo analisa-se o princípio da insigni-
cância em matéria penal em conjunto com sua aplicação pelo Superior
Tribunal de Justiça no crime do art. 28 da Lei 11.343/06.
2. Luigi Ferrajoli e os fundamentos do garantismo penal
2.1 Os custos da justiça e da injustiça
Segundo Ferrajoli, o direito penal seria “uma técnica de denição, de
individualização e de repressão da desviação”2.
Nesta perspectiva, as restrições inerentes ao direito penal consistiriam:
i) na denição ou proibição dos comportamentos legalmente classicados
como desviantes; ii) na sujeição coercitiva ao juízo penal de todos aqueles
suspeitos de terem violado as normas penais; iii) na repressão ou punição
daqueles que tenham sido julgados culpados por haver transgredido as
proibições supramencionadas3.
A proibição de comportamentos, a sujeição coercitiva do indivíduo ao
juízo penal e a consequente punição daqueles que tenham sido julgados
geram, na visão de Ferrajoli, custos não apenas para os culpados por sen-
tenças condenatórias mas também para os inocentes4.
Para citar um dos referidos custos, temos o denominado “custo da
justiça”, intitulado por ele de “cifra da ineciência” que, em sua percepção,
consistiria nas escolhas penais do legislador como, por exemplo, a respei-
to das proibições, penas e procedimentos a serem adotados em determi-
nado ordenamento jurídico5.
Ademais, é denido como “custo da injustiça” ou “cifra negra” da cri-
minalidade – esta última nomenclatura utilizada por sociólogos – a quan-
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