A Relativização de Prerrogativas do Estado Frente a uma Releitura dos Parâmetros Internacionais de Proteção aos Direitos dos Migrantes

AutorGuilherme Martins - Rafael Patrus - Adriana de Paula
CargoGraduandos na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
Páginas173-204
A RELATIVIZAÇÃO DE
PRERROGATIVAS DO ESTADO FRENTE
A UMA RELEITURA DOS PARÂMETROS
INTERNACIONAIS DE PROTEÇÃO AOS
DIREITOS DOS MIGRANTES
Guilherme Martins,
Rafael Patrus e
Adriana de Paula1
Submetido(submitted): 10 de julho de 2010
Aceito(accepted): 01 de agosto de 2011
Resumo: O presente artigo pretende examinar a aplicabilidade dos di-
reitos humanos ao fenômeno da migração internacional, principalmente
os limites da discricionariedade estatal em confronto com os direitos dos
migrantes ilegais. Para tanto, analisar-se-á, primeiramente, o direito à
circulação e à residência no contexto da migração. Posteriormente, serão
verificadas as garantias que devem ser observadas pelos Estados em casos
de deportação, desde aquelas referentes à detenção às relativas ao devido
1 Graduandos na Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG)
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A relativização de prerrogativas ... Guilherme, Rafael e Adriana
processo legal. Finalmente, serão estudadas as consequências da quebra
do núcleo familiar do migrante pela deportação, mormente em casos em
que haja crianças envolvidas. A base legal utilizada consistirá precipua-
mente da jurisprudência comparada da Corte Interamericana de Direitos
Humanos e da Corte Européia de Direitos Humanos, tendo em vista as
peculiaridades de cada continente. Subsidiariamente, recorrer-se-á à juris-
prudência da Corte Internacional de Justiça.
Palavras-chave: Migração – Direitos Humanos – Deportação.
Abstrac t: is article aims to examine the applicability of human rights to
the phenomenon of migration, mainly the limits of State’s discretion in front
of the rights of illegal migrants. Firstly, the right to freedom of movement and
residence in the context of migration will be analysed. en, the guarantees
that States must fulfil in cases of deportation, such as those related to
detention and to the due process of law, will be critically examined. Finally, the
consequences of the break that occurs on the family nucleus when the migrant
is deported will be studied, especially in cases in which there are children
involved. e legal basis will consist mostly in the comparative jurisprudence
of the Inter-American Court of Human Rights and the European Court of
Human Rights, considering the continental differences. Alternatively, the
jurisprudence of the International Court of Justice will be used.
Key words: Migration – Human Rights – Deportation.
O direito à circulação e à residência no contexto da migração in-
ternacional
O direito à circulação e à residência, assegurado por uma gama
de documentos internacionais,2 constitui condição imprescindível ao
2 O direito em comento é previsto no art. 22 da Convenção Americana sobre Direitos
Humanos (CADH), bem como no art. 2 do Protocolo nº. 4 à Convenção Europeia para
a Proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais (CEDH), no art. 12
do Pacto Internacional de Direitos Civis e Políticos (PIDCP), entre outros.
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REDUnB v.10 | p. 173-204 | 2012
desenvolvimento de todo ser humano.3 No caso Masacres de Ituango
v. Colombia, a Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte
IDH ou Corte Interamericana) reiterou seu entendimento jurispru-
dencial no sentido de que tal garantia traduz o direito de circular
em liberdade no território de determinado Estado e escolher o lugar
de residência.4 O abalizado doutrinador Cançado Trindade salienta
que o direito à circulação e à residência provém do reconhecimento
do direito de permanecer no próprio lar,5 em que se encontra implíci-
to o direito de sair do país e retornar a ele.6
Entretanto, é imperativo esclarecer a quem se dirige o direito
de permanecer e trasladar livremente no território de determinado
Estado. Em conformidade com o que dispõe a redação dos diplomas
legais,7 são titulares inconcussos de tal direito os nacionais e estran-
geiros legalmente situados no Estado. Todavia, em atenção às trans-
formações vividas pela dinâmica internacional nas últimas décadas,
afigura-se indispensável reaver o sentido de tal pressuposto.
Segundo posicionamento da Organização das Nações Uni-
das (ONU), o significado atual do direito à circulação e à residência
deve ser ampliado para levar em conta as modificações no mercado
mundial, as crises financeiras e os movimentos populacionais, per-
meados pela insegurança advinda da globalização econômica e da
exclusão social.8 Nesse sentido, revela-se necessário reconhecer a si-
3 Corte Interamericana de Direitos Humanos (Corte IDH). Caso de las Masacres de
Ituango v. Colombia (Mérito), § 206; Idem.. Caso de la Masacre de Mapiripán v.
Colombia (Mérito), §168; Idem. Caso de la Comunidad Moiwana v. Suriname (Mérito),
§110; Idem.. Caso Ricardo Canese v. Paraguay (Mérito), §115.
4 Organização das Nações Unidas (ONU). Comitê de Direitos Humanos. Comentário
Geral nº 27, 1999, §§ 1, 4, 5 e 19.
5 CANÇADO TRINDADE (2000, parte IV).
6 ACNUR (1993, p. 10).
7 Conforme consta da CADH e do PIDCP: “toda pessoa que se encontre legalmente no
território de um Estado (...)” e do Protocolo n. 4 à CEDH: “qualquer pessoa que se
encontre em situação regular em território de um Estado (...)”.
8 OGATA, Sadako. Discursos proferidos pelo ACNUR na Cidade do México, 29.07.1999,
e em Havana, 11.05.2000: Los Retos de La Proteción de los Refugiados, Cidade do
México/México, ACNUR, 1999, p. 2, 3 e 9; e Challenges of Refugee Protection,
Havana/Cuba, ACNUR, 2000, p. 4, 6 e 8.

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