Precedente Judicial
Autor | Thiago Henrique Ament |
Páginas | 32-59 |
PJ
I
A Lei n. 13.015/14 no âmbito do recurso de revista e o Código de Processo Civil de 2015, nas
suas disposições gerais sobre os processos nos tribunais e os meios de impugnação das decisões
judiciais (arts. 926 a 927), incorporam ao Direito brasileiro diversos aspectos da teoria dos prece-
dentes judiciais desenvolvida principalmente nos países da família da common law.
O sistema do novo Código de Processo Civil reconhece a importância e valoriza o respeito
ao Direito Jurisprudencial estabelecendo que “ostribunais devemuniformizarsuajurisprudênciae
mantê-la estável, íntegra e coerenteart(58) No mesmo sentido, estabelecia o § 4º do art. 896 da
CLT quanto à obrigatoriedade de os Tribunais Regionais do Trabalho procederem à uniformização
de sua jurisprudência.(59) Contudo, com a redação conferida pela Lei n. 13.015/15, infelizmente,
referido dispositivo celetista teve uma vida muito curta e foi expressamente revogado pela letra
odoartdaLein(60) na contramão da tendência de se garantir uma evolução or-
denadadajurisprudênciavericadaatémesmoemoutrosramosdoDireitobrasileiro
Sob outro enfoque, ao estabelecerem um procedimentoespecícoparaprolaçãodedecisões
formalmente vinculantes,(61) a Lei n. 13.015/15 e o art. 927 do CPC de 2015 ensejam discussão so-
(58) Neste sentido, também assinala Bueno que o “caput do art. 926 quer evidenciar qual é o papel que o CPC de 2015
quer emprestar à jurisprudência dos Tribunais a título de racionalização e uniformização dos entendimentos obteníveis como
resultado da prestação jurisdicional. Jurisprudência parece, aí, ter sido empregada como palavra genérica para albergar as
súmulas e também os ‘precedentes’”. (BUENO, Cassio Scarpinella. Manual de direito processual civil. 2. ed. São Paulo: Saraiva,
2016. p. 600).
(59) CLT, art. 896, § 4º: “Ao constatar, de ofício ou mediante provocação de qualquer das partes ou do Ministério Público
do Trabalho, a existência de decisões atuais e conflitantes no âmbito do mesmo Tribunal Regional do Trabalho sobre o tema
objeto de recurso de revista, o Tribunal Superior do Trabalho determinará o retorno dos autos à Corte de origem, a fim de que
proceda à uniformização da jurisprudência”. (Redação dada pela Lei n. 13.015, de 2014).
(60) Art. 5º Revogam-se: I — os seguintes dispositivos da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei
n. 5.452, de 1º de maio de 1943: o) §§ 3º, 4º, 5º e 6º do art. 896.
(61) Nos países da civil law, durante muito tempo as decisões jurisprudenciais foram consideradas meramente persuasivas.
Todavia, hoje, verifica-se que a inclusão dos precedentes entre as fontes formais do direito é uma tendência mundial, tal como
verificado na Itália e Espanha, por exemplo. Neste sentido, confira-se: BARROSO, Luís Roberto; MELLO, Patrícia Perrone Campos.
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bre aproximação ou não do Direito brasileiro ao sistema common law no qual, tradicionalmente, o
precedente é produzido de forma difusa e reconhecido pelo juiz do caso sucessivo, o qual será o
responsável por lhe atribuir o poder vinculante que possa merecer. Logo, o estudo dos conceitos
edasdiferençasentreprecedentejurisprudênciaesúmulaaguraseindispensávelparaaexata
compreensão da alteração pretendida pelo legislador processual trabalhista e comum.
No presente capítulo, serão revisitados os principais conceitos da teoria dos preceden-
tes e que orientam o seu funcionamento nos países da common law, fazendo-se uma análise
sobre como o tema tem sido disciplinado no Direito Processual brasileiro e uma crítica sobre
a forma que o TST tem ou não levado em consideração as suas próprias decisões anteriores
em casos similares.
C
Precedente, em sentido amplo, é uma decisão sobre um caso concreto cujo fundamento
normativo poderá ser utilizado para decisões futuras em casos semelhantes. O precedente pode
ser dividido em três partes: a) as circunstâncias fáticas da controvérsia; b) a tese ou motivação da
decisãocojulgamentodopedidocomaaplicaçãodanormadenidanamotivaçãoFazendose
uma análise a partir dos elementos da sentença, a estrutura do precedente poderia ser comparada
ao relatório, fundamentação e dispositivo.
Numa acepção mais estrita, o precedente é compreendido como a razão de decidir no caso
concreto, também conhecida como ratio decidendi (no Direito inglês) e holding (no Direito america-
no). Ambos os conceitos referem-se à parte vinculante da decisão. O precedente não se confunde
com a decisão, portanto.
Na medida em que não possa servir de fundamento para um julgamento futuro, nem toda
decisão constitui um precedente. Aliás, uma decisão somente poderá tornar-se um precedente na
hipótese de surgimento de um novo caso, cuja solução tenha por fundamento a primeira decisão.
A decisão não será um precedente, por exemplo, quando se limitar a aplicar a literalidade de um
texto de lei já obrigatório ou a repetir fundamento de decisão anterior, sem acrescentar qualquer
novo elemento normativo para reger casos futuros. Conforme Marinoni,(62)
Nestadimensãoca claroqueumprecedentenãoésomente umadecisãoquetratou
de dada questão jurídica com determinada aptidão, mas também uma decisão que tem
qualidades externas que escapam ao seu conteúdo. Em suma, é possível dizer que o
precedenteéaprimeiradecisãoqueelaboraatesejurídicaouéadecisãoquedeniti-
vamente a delineia, deixando-a cristalina.
Ao proferir uma decisão, o magistrado constrói, necessariamente, duas normas jurídicas: a)
a primeira, de caráter geral, decorre da sua interpretação dos fatos da causa e sua conformação
ao direito positivo; b) a segunda, de caráter individual, representada pela decisão da hipótese
especícaemanálisepormeiodaaplicaçãodanormadenidanaprimeiraetapa(63)
Trabalhando com uma nova lógica: a ascensão dos precedentes no direito brasileiro. Disponível em:
dl/artigo-trabalhando-logica-ascensao.pdf>. Acesso em: 3.11.2016.
(62) MARINONI, Luiz Guilherme. Precedentes obrigatórios. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2016.
(63) Nesse sentido, também, confira-se: MITIDIERO, Daniel. Fundamentação e precedente: dois discursos a partir da decisão
judicial. Revista de Processo: RePro, v. 37, n. 206, p. 61-78, abr. 2012.
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