Prazo e prorrogação do contrato de serviço continuado

AutorProf. Diógenes Gasparini
CargoProf. Titular de Direito Administrativo da Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Advogado. Mestre e doutor pela PUCSP.
Páginas1-30

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I - Serviço continuado

l.-. FUNDAMENTO. Nos termos de sua atual redação, o inciso II do art. 57 da Lei federal nº 8.666/93, que regulamenta o art. 37 inc. XXI da Constituição Federal e institui normas gerais para licitações e contratos da Administração Pública, está a exigir uma interpretação que, de um lado, ponha às claras todo o seu potencial de utilização e, de outro, que discuta as dúvidas levantadas por alguns de seus interpretes. A isso nos propomos neste ensaio cujo objetivo, vê-se, é essencialmente prático.

O art. 57, caput, dessa lei estabelece, como regra, que a duração dos contratos regidos por esse diploma legal ficará adstrita à vigência dos respectivos créditos orçamentários, e indica, em seus incisos, as hipóteses em que dito prazo, desde logo, pode ser outro, maior. Portanto, os contratos assim excepcionados não precisam observar dita regra, podendo ter prazos maiores desde o início. É exatamente o que ocorre com os contratos indicados no inc. II desse artigo. Com efeito, dispõe esse mandamento que os contratos que têm por objeto a prestação de serviços a serem executados de forma contínua, podem ter sua duração prorrogada por iguais e sucessivos períodos com vista a obtenção de preços e condições mais vantajosas para a Administração Pública, limitada essa duração a sessenta meses. Em texto corrido, esses são os dispositivos da Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública, cuja análise nos termos propostos pretendemos levar a cabo.

  1. -. CONCEITO. O art. 57, caput, da Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública, estatui que a duração dos contratos regidos por essa lei ficará limitada à vigência dos respectivos créditos orçamentários, enquanto o inc. II retira dessa regra os contratos que têm por objeto a prestação de serviços a serem executados de forma contínua. A exceção aí descrita somente prestigia contrato de prestação de serviço e, ainda assim, de serviço cuja execução deva ser de forma contínua. Portanto, serviço de execução contínua é o que não pode sofrer solução de continuidade na prestação que se alonga no tempo, sob pena de causar prejuízos à Administração Pública que dele necessita. Por ser de necessidade perene para a Administração Pública, é atividade que não pode ter sua execução paralisada, sem acarretar-lhe danos. É, em suma, aquele serviço cuja continuidade da execução a Administração Pública não pode dispor, sob pena do comprometimento do interesse público. Assim também é definido por CARLOS PINTO COELHO MOTTA (Eficácia nas Licitações e Contratos, 6ª ed., Belo Horizonte, Del Rey, 1997, p. 277). LEON FREJDA SZKLAROWSKY (BLC nº 12 - dez. de 1994 - p. 557), entre outros, assevera que serviço de execução contínua "é o que não se pode interromper, faz-se sucessivamente, sem solução de continuidade"... "é o que exige continuidade".

    Serviço que não possa ser assim definido deve observar, quanto ao prazo contratual, a regra geral prescrita no art. 57, caput. Nesse sentido, JORGE ULISSES JACOBY FERNANDES (BLC nº 2 - fev. de 1996 - p. 75) analisando legislação anterior semelhante afirmou, em lição ainda válida, que: "Não se enquadram no dispositivo, que adiante será comentado, compras de qualquer natureza, ou obras". Contrato cujo objeto seja uma obra, um fornecimento ou um serviço de execução não-continuada, não pode ter, por ocasião de sua celebração e com base nesse inciso, prazo maior que o aí regulado. Esses contratos, salvo hipótese legal específica para obra, devem observar essa genérica determinação.

  2. -. CARACTERÍSTICAS. Os serviços de execução contínua são caracterizados pela perenidade e necessidade de sua prestação. Disso dá-nos conta JORGE ULISSES JACOBY FERNANDES (BLC nº 2 - fev. de 1996 - p. 75) ao afirmar que "não apenas a continuidade do desenvolvimento, mas a Page 3 necessidade de que não sejam interrompidos, constituem os requisitos basilares para que se enquadrem como prestação de serviços a serem executados de forma contínua". Observe-se que, mesmo com tais características, são inconfundíveis com os serviços públicos, pois sua titularidade pertence ao particular que os presta à Administração Pública que deles necessita em caráter perene. Os administrados, salvo, por evidente, indiretamente, deles não usufruem.

  3. -. EXEMPLOS. Certamente calcada no § 2º do art. 31 da Lei federal nº 8.212/91, que dispõe sobre a organização da seguridade social e institui o plano de custeio, a doutrina, de um modo geral, tem se limitado a indicar como sendo serviço continuado os de limpeza, de vigilância e de manutenção, embora outros existam. Nesse sentido é a lição de HELY LOPES MEIRELLES (Licitação e Contrato Administrativo, 11ª ed., São Paulo, Malheiros, atualizada por Eurico de Andrade de Azevedo et alii 1996, p. 197). CARLOS PINTO COELHO MOTA (ob. cit., p. 277) amplia esse rol ao afirmar: "A exemplo, teríamos: limpeza, conservação, manutenção, vigilância, segurança, transportes de valores, cargas ou passageiros". São também dessa espécie os serviços de saúde, quando prestados por particulares aos servidores da Administração Pública, e os serviços de manutenção de jardim projetado por Burle Marx, conforme ensina JORGE ULISSES JACOBY FERNANDES (BLC nº 2 - fev. de 1996 - p. 75).

    Na busca dessa exemplificação não deve o intérprete apartar-se do princípio, segundo o qual os serviços desejados pela Administração Pública devem, como regra caber a seus servidores admitidos mediante concurso de provas ou de provas e títulos. O serviço, ainda que de execução contínua, nesses casos deve ficar a cargo dos servidores assim arregimentados pela Administração Pública, sob pena de ser inconstitucionalmente ladeado o princípio da obrigatoriedade do concurso público (art. 37, II, da CF)para ingresso no serviço público, como ocorreria com a contratação de terceiro para a prestação dos serviços de contabilidade e orçamentação pública.

II - Prazo
  1. -. CONCEITO. Não se sabe ao certo qual a origem da palavra prazo. Para uns procede do vocábulo latino placitum, enquanto para outros advém da expressão, também latina, platea. De qualquer modo significa o tempo para o cumprimento de determinada obrigação jurídica ou o lapso de duração de certa relação jurídica. Da primeira hipótese, por exemplo, é o prazo para os interessados numa licitação protocolarem a entrega à Administração Pública licitante, dos envelopes contendo os documentos de habilitação e proposta, enquanto da segunda, verbi gratia, é o prazo de duração do contrato que vier a ser celebrado com o vencedor da licitação.

  2. -. ESPÉCIES. O prazo para a execução de certa obrigação jurídica é comumente determinado em lei. O prazo de dada relação jurídica é Page 4 estabelecido por lei, fixado pelo particular ou ajustado pelas partes interessadas. O espaço de tempo para o inabilitado interpor recurso hierárquico é prazo de execução prescrito em lei. É exemplo de prazo de duração fixado em lei, o de validade da Carteira Nacional de Habilitação, enquanto o prazo de vigência da proposta licitatória é fixado pelo particular. O prazo de duração de um contrato é exemplo de prazo fixado pelas partes. Daí os prazos unilaterais e os bilaterais. Entre os unilaterais incluímos os legais, por falta de uma melhor classificação no momento. Estes últimos são comumente chamados de prazos contratuais. Desses prazos, para o presente estudo, interessa-nos apenas conhecer mais de perto o prazo contratual.

III - Prazo contratual
  1. -. CONCEITO. Prazo contratual ou convencional é o tempo de duração de um contrato, concertado pelas partes contratantes. Segundo DE PLÁCIDO E SILVA (Vocabulário Jurídico, 10ª ed., Rio de Janeiro, Forense, 1987, vol. III, p. 411), prazo convencional "é o prazo que se ajustou ou decorreu de um acordo entre as partes, que o marcaram ou determinaram". Em palavras simples, prazo contratual é a duração do contrato. Aliás, não é outra a expressão utilizada pela Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública ao prescrever, na cabeça do art. 57, a regra geral para a fixação do prazo contratual.

  2. -. DETERMINAÇÃO. A escolha do prazo contratual é efetivada livremente pelos contraentes, quando cuidar-se de ajuste regido pelo Direito Privado, conforme ocorre na locação. Essa escolha é feita segundo a vontade das partes e consoante seus respectivos interesses. Diferentemente passa-se com os contratos administrativos. Nesses contratos a escolha do prazo cabe á Administração Pública licitante. Salvo exigência legal, essa escolha é discricionária. Significa afirmar que a Administração Pública não precisa justificar a razão da seleção, por exemplo, do prazo de seis meses desde que iniciado e concluído no mesmo exercício. Embora seja assim, é evidente que a dimensão do prazo de certo contrato há de afeiçoar-se ao tempo estimado para a conclusão de seu objeto e aos limites legais. É o caso do contrato de utilização de programas de informática em que o prazo deve ser adequado ao tempo necessário à conclusão do projeto, desde que não vá além de quarenta e oito meses. Vê-se que em relação a ditos contratos resta, ao menos, impróprio dizer-se que o prazo é estabelecido de comum acordo pelos interessados. Mais se reforça esse entendimento na medida em que no momento da escolha do prazo sequer é conhecido o contratado da Administração Pública.

    Escolhido o prazo, faz-se necessária sua consignação no instrumento convocatório da licitação, quando a contratação depender desse procedimento. Se independer dessa medida o prazo deve ser fixado no ato que libera a Administração Pública da obrigação de licitar, conforme estabelece genericamente o § 2 do artigo 54 da Lei federal das Licitações e Contratos da Administração Pública. Tal...

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