A POLITIZAÇÃO 'EXPLOSIVA' DO GÁS DE XISTO: contribuições críticas para o estudo do Fracking

AutorBenilson Borinelli, Sérgio Ricardo Vitiello
Páginas68-86
A POLITIZAÇÃO EXPLOSIVA DO GÁS DE XISTO: contribuições críticas para o
estudo do Fracking
Benilson Borinelli 1
Sérgio Ricardo Vitiello2
Resumo
O controverso método de fracking para a extração de gás de xisto e seus impactos socioambientais têm colocado em
evidência as disputas acirradas em torno das decisões políticas e do estado capitalista. Diante da relevância do tema e do
incipiente número de estudos no Brasil, neste artigo, analisamos como as decisões sobre o fracking vêm sendo abordadas
nas perspectivas funcionalista e cr ítica. Desenvolvemos uma pesquisa bibliográfica e descritiva, apoi ados principalmente na
literatura internacional. Embora as duas perspectivas ofereçam importantes contribuições, são as críticas que melhor
capturam as relações de poder em jogo nas decisões sobre o fracking e fomentam o engajamento contra novas injustiças.
Mais estudos serão necessários no País dada a complexidade do tema e da vigência de projetos pró-fracking que poderão
ganhar força no atual contexto de desregulamentação neoliberal.
Palavras-chave: Fracking. Gás de xisto. Decisão política. Política ambiental. Estado.
“EXPLOSIVE” POLITIZATION OF SHALE GAS DECISIONS: critical contributions to fracking s tudy
Abstract
The controversial fracking method for shale gas extraction and its socio-environmental impacts has brought to light disputes
over political decisions and capitalist state. Given the theme's relevance and the incipient number of studies in Brazil, this
article analyzes how decisions about fracking have been approached fr om functionalist and critical perspectives. We
developed a bibliographic and descriptive research, supported mainly by international literature. While both perspectives
make important contributions, critiques' ones can best capture the power relations at stake in decisions about fracking and
foster engagement against new injustices. Further studies will be needed in Brazil due to the theme complexity, the
continuity of pro-fracking projects and the current intensification of neoliberal deregul ation of environmental policies.
Keywords: Fracking. Shale gas. Political decision. Environmental policy. State.
Artigo recebido em: 11/10/2019 Aprovado em: 23/04/2020
DOI: http://dx.doi.org/10.18764/2178-2865.v24n1p68-86.
1 Administrador. Doutor em Ciências Sociais (UNICAMP). Mestre em Administração Pública (UFSC). Professor Associado
do Departamento de Administração e do Programa de Pós-Gradu ação em Administração (PPGA) da Universidade Estadual
de Londrina (UEL). Coordenador do Grupo de Pesquisa em Política e Gestão Socioambiental. Rodovia Celso Garcia Cid -
Pr 445 Km 380 - Londrina - Caixa Postal 10.011 - Campus Universitário, PR, 86057-970. E- mail: benilson@uel.br
2 Bacharel em D ireito e Geografia. Especialista em Administração Industrial pela Universidade Estadual de Londrina (UEL).
Vinculação: Discente do Programa de Pós-graduação em Administração (PPGA) da Universidade Estadual de Londrina
(UEL). e-mail: sergio.vitiello@uel.br
Benilson Borinelli e Sérgio Ricardo Vitiello
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1 INTRODUÇÃO
Desde os anos 1990, avanços tecnológicos nos Estados Unidos possibilitaram o que
antes parecia impossível, a extração de gás de rochas de xisto, formadas há milhões de anos, por meio
do fraturamento hidráulico, ou fracking, em inglês, em escala e preços atrativos para a exploração
comercial. Desde então, a técnica de gás não convencional, que recorre a explosões com um
composto de centenas de produtos químicos e milhões de litros de água, é apontada como uma
revolução energética (MCELROY; LU, 2013) da matriz dos hidrocarbonetos, na contramão das
demandas por fontes sustentáveis. Favorecida pelo contexto da neoliberalização da natureza global
(CASTREE, 2008) e pela disponibilidade de reservas na grande maioria dos continentes, a técnica
disseminou-se pelo mundo a partir de meados dos anos 2000. Contudo, em diversos lugares, as suas
vantagens econômicas em relação a outras fontes energéticas fósseis vêm sendo confrontadas pelos
potenciais riscos de profundas transformações e impactos sociais, econômicos e ambientais, alguns
ainda não conhecidos completamente (OCHANDIO; D’ ELIA; 2014).
Desde o conhecimento dos seus impactos, em diversos países, o fracking protagoniza
disputas entre forças favoráveis e contrárias à atividade, mobilizando e articulando redes de empresas,
governos, centros de pesquisa, organizações governamentais nacionais e internacionais, grupos e
movimentos locais. Essas forças tentam influenciar decisões governamentais, em diversos níveis, para
resistir, restringir ou favorecer a exploração pelo fracking, alcançando resultados variados (HOLANDA,
2017). Nessas batalhas, as ciências sociais e naturais são convocadas pelas diferentes coalizões,
destacando a centralidade do conhecimento científico para fundamentar e legitimar decisões políticas
sobre os riscos de um fenômeno complexo, incerto, politizado e explosivo (BECK, 2010).
Representando um novo regime de natureza, um tipo específico de tecnonatureza
(VESALON; CRETAN, 2015), o fracking desafia e transforma padrões de desenvolvimento, capitalistas
ou não, de políticas públicas, de riscos e conflitos socioambientais e, por conseguinte, as relações de
forças que disputam as decisões do Estado capitalista na contemporaneidade. Nesse movimento,
mudanças materiais e discursivas engendradas pelo fracking representam um momento crítico para
pensar os limites e o potencial de resistência da sociedade, do Estado e das políticas ambientais em
diferentes contextos e espaços. No Brasil, o uso de fracking para exploração de gás de xisto ganhou
notoriedade em 2013, após o lançamento da 12ª rodada de licitações da Agência Nacional do Petróleo,
Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), que ofertou, sem consulta à população afetada e sem avaliação
de impactos ambientais, 72 blocos de exploração do gás. Como em outros lugares, a politização do
tema mobiliza um grande e variado número de atores, instâncias governamentais, controvérsias e
decisões governamentais. Até o momento, apesar de algumas vitórias da coalizão antifracking

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