A política criminal americana e seu papel na criação das cortes de drogas: influências históricas sofridas pelo programa de justiça terapêutica

AutorDaniel Pulcherio Fensterseifer
CargoDoutorando em Ciências Criminais pela PUCRS
Páginas27-42
FENSTERSEIFER, D. P. 27
Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 17, n. 1, p. 27-42, jan./jun. 2014
A POLÍTICA CRIMINAL AMERICANA E SEU PAPEL NA CRIAÇÃO
DAS CORTES DE DROGAS: INFLUÊNCIAS HISTÓRICAS SOFRIDAS
PELO PROGRAMA DE JUSTIÇA TERAPÊUTICA
Daniel Pulcherio Fensterseifer1
FENSTERSEIFER, D. P. A política criminal americana e seu papel na criação
das cortes de drogas: inuências históricas sofridas pelo programa de justiça
terapêutica. Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR. Umuarama. v. 17, n. 1, p. 27-42,
jan./jun. 2014.
RESUMO: O presente estudo discute a criação do Programa de Justiça Tera-
pêutica no Brasil a partir de um enfoque histórico, partindo-se da política cri-
minal de drogas americana e seu desenvolvimento ao longo das décadas, bem
como sua inuência sobre as políticas brasileiras. Trata-se de uma pesquisa bi-
bliográca para a qual foram eleitos dois autores americanos como referência
principal acerca da política criminal americana sobre drogas, bem como outras
obras relacionadas ao tema que contribuíssem na discussão do tema proposto
por David Garland e Jonathan Simon e que pudessem explicar o paralelismo
com o contexto brasileiro ao passar do tempo. Pode-se armar que a política
criminal brasileira sobre drogas sofreu, e continua sofrendo, grande inuência
das políticas americanas. Vislumbra-se que inúmeras medidas tomadas nos Esta-
dos Unidos foram reproduzidas elmente no Brasil, com alguns anos de atraso,
causando consequências semelhantes, especialmente aquelas que se mostram
conrmadoras de um sistema criminal seletivo e de reforço da exclusão social.
Recentemente, entretanto, surge uma ideia que aparenta destoar dessas políticas
negativas e busca minimizar os efeitos da aplicação do direito penal enquanto
reforça o tratamento do que é apontado como principal fator de uma gama de
comportamentos criminosos, qual seja, o uso de drogas. Com o afastamento do
sujeito das consequências penais, aproximando-o de um tratamento, as Cortes de
Drogas buscam reduzir a criminalidade que até então não vinha sendo combatida
de forma adequada, considerando as nalidades propostas pelas políticas crimi-
nais adotadas ao longo do tempo.
PALAVRAS-CHAVE: Política criminal de drogas; Cortes de drogas; Crimes;
Drogas.
1Doutorando em Ciências Criminais pela PUCRS. Professor de Direito Penal e Processo Penal na
Universidade Regional Integrada do Alto Uruguai e das Missões – URI/FW. Bolsista Capes. Advo-
gado Criminalista. E-mail: danielpulcherio@uri.edu.br
A política criminal americana...
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Rev. Ciênc. Juríd. Soc. UNIPAR, v. 17, n. 1, p. 27-42, jan./jun. 2014
INTRODUÇÃO
No nal da década de 80, especicamente na cidade de Miami, foi cria-
da a primeira Corte de Drogas americana, a primeira experiência desse tipo em
todo o mundo. Tal mecanismo surgiu como resultado de um diagnóstico referen-
te à delinquência associada à droga e a política criminal existente àquela época.
O discurso de que “nada funciona” e a insuportabilidade dos índices carcerários
constituíram o combustível para que um grupo de prossionais do direito bus-
casse alguma alternativa ao modelo tradicional de operacionalização da justiça,
tendo em vista que a pena de prisão não cumpriu nenhum dos objetivos a que se
propôs, servindo unicamente como um instrumento de exclusão do sujeito peri-
goso da sociedade, mediante a sua incapacitação.
Ademais, a prisão em nenhum momento possibilitou que os dependen-
tes químicos pudessem tratar ou reetir minimamente sobre essa sua condição,
remanescendo, após a liberdade, esse importante fator desviante que, por si só2,
tem o poder de conduzir o cidadão à prisão, fomentando, com isso, a superlota-
ção carcerária.
Nessa conjuntura, observou-se que o perl da população carcerária es-
tava um tanto alterada, caracterizada por ser uma massa de infratores relaciona-
dos a crimes cometidos em razão do consumo de drogas, ou em outras palavras,
pessoas que cometeram crimes por estarem drogados no momento do delito pra-
ticado ou porque haviam cometido o crime para poder sustentar o próprio vício.
Diante dessa constatação, no ano de 1989 iniciaram-se os trabalhos da primeira
DrugCourt.
Este marco histórico não surgiu abruptamente, ele foi sendo construído
ao longo das décadas do século XX, a partir da evolução da política criminal
americana desde um Estado de bem-estar social a uma guerra contra as drogas.
Política essa que é reproduzida por muitos países ao redor do globo.
Da mesma forma, as Cortes de Drogas também se espalharam no mun-
do desde sua criação, surgindo como uma tentativa de abordar de forma diferente
os delitos relacionados ao consumo de drogas frente à derrota do Estado nessa
“guerra contra as drogas”.
O presente estudo pretende percorrer essa trajetória a m de demarcar
o contexto histórico que aparece por trás das Cortes de Drogas americanas e que
tentam encontrar seu espaço, embora sob uma forma adaptada, no sistema de
justiça brasileiro.
2O presente paper pretende abordar unicamente o contexto histórico no qual surgiu as Cortes de
Drogas, não tendo por objetivo discutir a (des)criminalização do uso de drogas. Nos Estados Unidos,
pessoas que são agradas portando entorpecentes podem ser detidas pela polícia e receberem pena de
prisão. No Brasil, após a nova lei de drogas, n. 11.343/08, não há mais previsão legal de pena priva-
tiva de liberdade para quem é condenado por portar ou possuir droga para consumo próprio (art. 28).

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