Políticas públicas e direitos humanos: uma releitura das relações raciais nas escolas brasileiras

AutorFlavio Santiago - Adriana Duarte de Souza Carvalho
CargoUniversidade de Campinas, Campinas/SP, Brasil - Centro Universitário Claretiano de Batatais/SP, Brasil
Páginas16-33
16
SANTIAGO, Flavio; CARVALHO, Adriana D. de S. Políticas públicas e direitos humanos: uma...
Políticas Públicas e Direitos Humanos: uma releitura das relações
raciais nas escolas brasileiras
Public Policies and Human Rights: a reinterpretation of race relations
in brazilian schools
http://dx.doi.org/10.5007/2178-4582.2013v47n1p16
Flavio Santiago
Universidade de Campinas, Campinas/SP, Brasil
Adriana Duarte de Souza Carvalho
Centro Universitário Claretiano de Batatais/SP, Brasil
O objetivo deste artigo é analisar as Diretri-
zes Curriculares Nacionais para a Educação das
Relações Étnico-raciais e para o Ensino de História
e Cultura Africana e Afrobrasileira, aprovada pelo
parecer CNE 003/04 e sua Resolução 01/04 (Lei
10639/03), que alterou a Lei de Diretrizes e Base
da Educação Nacional, tornando obrigatório o en-
sino de História e Cultura Afrobrasileira e Africana
no currículo da educação básica. A metodologia é
a análise documental das seguintes fontes legais:
a Constituição de 1988 e seus anais; a LDBEN
e as Diretrizes Curriculares para a Educação das
Relações Étnico-Raciais. O trabalho aponta como
esta política pública exigiu uma releitura das re-
lações étnico-raciais e demandou um novo olhar
do educador sobre a heterogeneidade para que os
Direitos Humanos tivessem lugar na escola. Mos-
traremos que construção desse olhar não deve ser
estabelecido dentro da lógica da negação dos direi-
tos humanos, mas ser produzido através da recusa
da homogeneização e da institucionalização de
práticas inclusivas.
Palavras-chave: Direitos humanos - Políticas pú-
blicas - Relações étnico-raciais.
The purpose of this paper is to analyze the
National Curriculum Guideline for Education on
Ethnic-Racial Relations and the African and Afri-
can-Brazilian History and Culture Teaching, appro-
ved by CNE 003/04 Bill and its Resolution 01/04
(10639/03 Act) which have changed the Guidelines
and Basis for National Educational, turning the
teaching of African and African-Brazilian History
and Culture mandatory in the national curriculum
for Basic Education. The methodology used was
the documental analysis of the following legal acts:
the Brazilian Constitution of 1998 and its following
annals, the LDBEN and the National Curriculum
Guidelines for the Ethnic-Racial Relations Educa-
tion. This work shows how this public policy has
demanded a new reading of ethnic-racial relations
and how it has also imposed upon teachers a new
look towards heterogeneity, so that Human Rights
had a place inside schools. We will point out that the
building of this new look should not be established
by denying the logic of the Human Rights but rather
by refusing homogenization as well as by the insti-
tutionalization of practices of inclusion.
Keywords: Human Rights - Public Policies - Eth-
nic-racial relations.
Introdução
A Constituição de 1934 é a primeira, no Brasil, a trazer dispositivos cons-
titucionais veiculadores de direitos sociais à Educação. Em seu capítulo “Da
Educação e da Cultura”, a Constituição de 1934 determina que a União, os
Estados e os Municípios e o Distrito Federal favoreçam o desenvolvimento
17
Revista de Ciências HUMANAS, Florianópolis, v. 47, n. 1, p. 16-33, abr. 2013
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compete aos Estados e ao Distrito Federal criar Conselhos de Educação. É
fundamental enfatizar que a Carta Magna não previa a criação de tribunais aos
quais os cidadãos pudessem se dirigir para exigir seus direitos à educação e à
cultura, caso os mesmos não fossem cumpridos. Dessa maneira, a única forma
de tornarem-se efetivos os direitos à Educação e à Cultura era através dos
Poderes Executivo e Legislativo, por meio da criação de políticas públicas.
Historicamente, as instituições escolares e algumas pesquisas relativas a
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ções étnico-raciais (CAVALLEIRO, 2005) e, principalmente, silenciam sobre
a falta de efetividade dos direitos humanos na instituição escolar brasileira.
O silenciamento da escola e dos professores em relação aos direitos
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minados grupos étnico-raciais, é um dos elementos que contribuem para a
construção de um olhar único, homogeneizado, muitas vezes voltado a um
aspecto sociocultural europeu branco, pregando no sentido étnico-racial uma
educação formal de embranquecimento, em contraposição à sociedade hete-
rogênea que vai à escola.
Os sistemas educacionais, juntamente com os educadores manipulados,
se pautam em ideologia racial eurocêntrica branca. Essa ideologia faz da
branquitude o “sujeito universal e essencial”, até normalizado. Este sujeito,
associado a uma situação de privilégios que desacredita na presença da aus-
teridade de sua posição, é incapaz de compreender a experiência do outro
(ROSSATO; GESSER, 2001), tornando o padrão branco como sinônimo de
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Nas escolas, nos livros didáticos, nos meios de comunicação, faltam in-
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sobre os interesses econômicos que tentaram transformar seres humanos em
objetos. Faltam também informações sobre as iniciativas e lutas dos escravi-
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seus descendentes no que diz respeito à garantia de direitos, como educação,
moradia, trabalho, salário digno, saúde, identidade, religiosidade.
O processo histórico mostra que diferentes ações foram se construindo
aos longos dos séculos para combater o racismo presente na sociedade, pro-
curando desconstruir o ideário colonial que estabelecia formas estereotipadas
e preconceituosas de olhar o negro, sua cultura, e as relações que ele estabele-
ce com o mundo. A luta também era por conquistas no plano legal, que insti-
tucionalizassem direito civis e sociais que foram negados à população negra.
A educação sempre foi pensada pela população negra brasileira como um
meio de resistência e ascensão social; através dela os/as negros/as poderiam
melhorar de vida’. Organizações negras surgem para defender e exigir uma
educação para esta população. Vale ressaltar que a população negra escra-
vizada foi impedida por lei de estudar, podendo, posteriormente, frequentar
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XX, surgiu no Brasil, um movimento político ideológico denominado Im-

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