Poder Executivo

AutorJadir Cirqueira De Souza
Ocupação do AutorMaestría en Derecho Público de la Universidad de Franca - SP, especialista en Procedimiento Civil de la Universidad Federal de Uberlândia - MG y Licenciado en Derecho por la Universidad Gama Filho, Rio de Janeiro
Páginas213-246

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1 Aspectos históricos

A partir da análise da história do constitucionalismo foi possível observar que, antes do século XVIII não existia a idéia do controle constitucional do Estado, como é realizado nos moldes atuais. Vigorava, como visto o Estado absoluto, sendo, assim, absolutos os poderes dos dirigentes estatais.

As regras gerais que norteava os destinos das sociedades históricas, dirigidas e/ ou, pelo menos organizadas pelo Estado eram no sentido de que os poderes estatais deviam ser concentrados nas mãos de um dirigente e/ou de um grupo militar, religioso ou mesmo de magistrados, tomando-se como base, órgão ou instituição única. Não existia, portanto, pluralidade de instituições capazes de dirigir os destinos de determinada sociedade.

Na verdade, vigorava em sua integridade maior a essência do poder unitário. O comando da sociedade não era pautado por regras cogentes, de natureza superior, nos moldes da atual conjuntura do Direito Constitucional. Assim, prevalecia a vontade do governante – civil, religioso, econômico ou militar, etc – sem qualquer pauta prévia em benefício da sociedade.

Segundo MALUF, nos estados monárquicos antigos, inclusive nos medievais e nas repúblicas gregas e romanas, ainda não existia a divisão funcional dos poderes estatais. No entanto, entre os filósofos das primeiras épocas, tais como Platão, inicialmente, e depois, Aristóteles, já existia preocupação filosófica contra a concentração de poderes nas mãos do Estado, ainda que por outros fundamentos filosóficos. Assim, é certo afirmar que a idéia de limitar e controlar os poderes do Estado, no exercício de suas funções, remonta às antigas civilizações, sempre em dimensões diversas e de acordo com a realidade de cada povo.1Como já esclarecido, a divisão e/ou separação de poderes do Estado, em virtude do possível arbítrio e da exorbitância das atividades e medidas desenvolvidas pelos respectivos órgãos públicos, através de seus agentes, sempre foi um dos prin-

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cípios constitucionais defendidos pela sociedade, uma vez que a concentração de poderes possibilitou a prepotência e o arbítrio dos dirigentes dos órgãos estatais.

A criação dos poderes Legislativo, Judiciário e Executivo foi uma das formas encontradas por Montesquieu, na obra O espírito das leis, de 1748, para compatibilizar, harmonicamente, as respectivas funções legislativas, jurisdicionais e executivas.

As idéias filosóficas constituem o marco histórico mais importante na ruptura dos regimes unilaterais dominantes na Europa. As constituições, sobretudo a norte-americana (1787) e a francesa (1848), encamparam a teoria da divisão de poderes, fato que provocou a inclusão do princípio organizacional dos poderes, nas diversas constituições do mundo ocidental.2Assim, paralelamente e de forma simultânea com a inclusão da teoria da separação de poderes no texto da primeira constituição norte-americana, no século XVIII, também surgiu a discussão científica relativa ao regime de governo: presidencialismo ou parlamentarismo que significam, em síntese, a concentração e/ou o grau de coesão entre as clássicas funções de Estado. Para MALUF o sistema presidencialista foi criação dos norte-americanos e incluído na Constituição de 1787.3

É sabido que no parlamentarismo, o exercício das funções de Chefe de Estado e de Chefe de Governo possuem distintos integrantes nos poderes Executivo e Legislativo. As funções específicas de Chefe de Estado são de responsabilidade do Presidente da República ou do Rei, príncipe ou monarca. Já as funções de Chefe de Governo são de competência do Primeiro-ministro e seu respectivo Gabinete com forte atuação parlamentar, inclusive com responsabilidade funcional do Poder Legislativo.

Como registro histórico, no Brasil, o sistema parlamentarista foi utilizado em duas oportunidades, muito embora existam sérias discussões doutrinárias a respeito, inclusive contestando a adoção do parlamentarismo no país. Para fins didáticos, entretanto, o sistema parlamentarista foi incluído, primeiro, durante o Segundo Reinado e excluído do texto constitucional, em 1889. Depois, entre 1961 e 1963, segundo as lições de MALUF.4Ao longo da história constitucional brasileira, excetuando-se os dois períodos acima, sempre foi adotado o sistema presidencialista com a junção das funções de chefia de Estado e de Governo, na figura do Presidente da República, sendo que, na Constituição Imperial exercia-se, ainda, a direção do Poder Moderador, que, como analisado, perdurou apenas durante o império.

Desde a independência do Brasil, com a promulgação da carta imperial de 1824, ao longo da evolução histórica do presidencialismo brasileiro, ocorreu notável

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crescimento das funções e da importância institucional do Poder Executivo federal, nos moldes das monarquias absolutistas européias.

Por conta dessa anomalia institucional, que impregnou o Brasil, a partir das Ordenações portuguesas, que vem se perpetuando ao longo da história constitucional brasileira, grande parte da sociedade brasileira ainda acredita que as funções executivas são superiores às legislativas e às jurisdicionais, embora, seja sabido, doutrinariamente, na esfera legal e no plano jurisdicional, que as funções e atividades são independentes e harmônicas, de acordo com o art. 1º da CF.5Foi destacado que a administração do Estado, realizada pelo Poder Executivo, ganhou crescente complexidade e abrangência, desde a inauguração do Estado brasileiro, a partir da Constituição de 1824.

Na época imperial, vigorava o Estado absolutista e/ou unitário. O Poder Executivo não possuía limites e parâmetros legais a serem cumpridos, exceto aqueles fixados na respectiva CF, porém, acintosamente descumpridos pela chefia imperial. Na verdade, no Estado unitário brasileiro, não existia real forma de controle entre os poderes, apesar da regulamentação constitucional em vigor. Enfim, o poder reinava absoluto.

É certo que, na primeira geração de direitos, conforme destacado na evolução histórica dos direitos fundamentais, na linha desenvolvida por BOBBIO6, o Estado através do Poder Executivo teria como meta exclusiva, garantir a integralidade dos direitos individuais. Foi a fase do Estado de Direito. É nessa fase histórica que o Poder Executivo recebe seu obstáculo primário: a força da lei que protegia os direitos individuais frente ao arbítrio dos governos.

Em seguida, já no início do século XX, com a Constituição Federal de 1934, aumentou a gama e a complexidade das atribuições estatais, uma vez que o Estado federal, principalmente, através do Poder Executivo, recebeu a incumbência constitucional de organizar, regulamentar e algumas vezes, dirigir a economia e garantir os direitos sociais, inclusive implementá-los em benefício da sociedade, através da adoção de políticas públicas sociais. Foi a fase do Estado Social de Direito. Aqui, além de ser pautado pelo respeito à lei, cabia ao Estado, através do Poder Executivo, implementar o Estado do bem-estar social.

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Finalmente, na linha evolutiva, chegou-se à atual fase do Estado Democrático de Direito. O Estado passou a ser encarregado de implementar os aspectos inerentes à cidadania e à democracia, respeitando-se os cânones do vigente sistema constitucional. Caberia, portanto, ao lado das funções específicas dos demais poderes, ao Poder Executivo, o dever de dirigir, organizar e implementar as ações do Estado e garantir – utopicamente – vida digna ao cidadão brasileiro.

Ultrapassada a visão de que o Poder Executivo existe para proteger a socie-dade, mediante a adoção de políticas públicas e ações governamentais em acordo com o atual figurino constitucional, ainda na linha histórica, no dia 27 de abril de 1993, foi realizada uma consulta plebiscitária com o objetivo de que os eleitores escolhessem sobre a manutenção do sistema presidencialista ou a adoção do sistema parlamentarista. Majoritariamente, a consulta popular manteve o presidencialismo e aboliu-se, categoricamente, eventuais discussões legislativas sobre a adoção do parlamentarismo no Brasil.

O Brasil manteve-se fiel, mais uma vez ao presidencialismo, fato que provocou severa crítica de TAVARES7:

Nota-se que essa vasta prática presidencialista deve-se, em parte, à tradição de política brasileira, que é marcadamente centralizadora. Vislumbra-se a necessidade de, no sistema brasileiro, o Presidente da República ser mais responsável e prestar contas efetivas ao Parlamento, mas, ao mesmo tempo, observam-se dificuldades diante de uma Casa Legislativa onde Ministros são inoperantes, corruptos e sem responsabilidade, o que obriga a barganhas políticas com seus partidos dominantes.

No plano histórico, portanto, observa-se que o Brasil sempre foi fiel ao sistema presidencialista e, portanto, com decisiva proeminência e força do Poder Executivo.

Em conclusão, ao longo da história brasileira sempre foi perceptível a forte influência das ações e/ou medidas de autoria do Poder Executivo sobre os destinos da sociedade brasileira, fato que mantém, por força da concentração de poderes constitucionais, infelizmente, abominável dependência dos demais poderes da República.

2 Poder Executivo

Na atual conjuntura constitucional, o Poder Executivo é dirigido pelo Presidente da República. O dirigente político constitui a instância máxima do poder, pois o sistema é verticalizado e definido, hierarquicamente, no plano constitucional e regulamentado na esfera administrativa federal. Enfim, trata-se do mais alto grau de poder dentro da estrutura administrativa federal.

O Poder Executivo possui divisão, características, princípios e atuação diversa dos demais...

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