O pobre no direito penal

AutorRené Ariel Dotti
CargoAdvogado e professor
Páginas120-122
120 REVISTA BONIJURIS I ANO 30 I EDIÇÃO 650 I FEVEREIRO 2018
DOUTRINA JURÍDICA
René Ariel Dotti ADVOGADO E PROFESSOR
O POBRE NO DIREITO
PENAL
Há um descompasso fl agrante entre a constituição e a
legislação ordinária quando se trata do preso paupérrimo
Osedutor e generoso tema da situação jurí-
dica da pessoa pobre no contexto da justi-
ça criminal exige algumas observações
preliminares. A primeira delas é sobre os
conceitos sociológico e jurídico de pobre-
za. Quanto ao primeiro, Johnson esclarece
que tal circunstância, em sentido geral, é
“uma situação na qual as pessoas carecem daquilo que
têm necessidade para viver. Os limites de ‘necessidade
para viver’, no entanto, são matéria de defi nição2.Perce-
be-se, desde logo, que esse é um enunciado dependente de
complementação. E, relativamente ao segundo, Helena
Diniz nos diz que o vocábulo tem acepções variadas se-
gundo o ramo jurídico específi co: civil, processual e canô-
nico3. No plano penal, a pobreza é causa de dispensa da
cobrança da multa, pelo desconto no vencimento ou salá-
rio do apenado quando tal abatimento afetar os recursos
indispensáveis ao sustento do condenado e de sua família
(CP, art. 50, § 2º). Relativamente ao processo penal, a obri-
gação de pagar fi ança será substituída por medida caute-
lar diversa da prisão (CPP, art. 325, § 1º, I, c/c o art. 350).
1. A SUPOSTA PROTEÇÃO CONTRA A
POBREZA
A Constituição Federal promete, entre os objetivos
fundamentais da República, “erradicar a pobreza e a
marginalização e reduzir as desigualdades sociais e
regionais”, bem como “promover o bem de todos, sem
preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quais -
quer outras formas de discriminação” (art. 3º, III e IV).
É certo que iniciativas e projetos positivos do governo
federal, como o programa “Minha casa, minha vida”, en-
tre outros, revelam a melhoria de condições humanas e
sociais de contingentes das pessoas pobres. Mas, em re-
lação aos suspeitos, indiciados e réus pobres, o sistema
legal contém somente proclamações otimistas. Há um
descompasso fl agrante entre as declarações de direitos
e garantias constantes da carta política e da legislação
ordinária e o estado das prisões e o tratamento dos pre-
sos. Especialmente dos presos pobres.
2. OS DIREITOS E AS GARANTIAS
FUNDAMENTAIS (I)
Há um princípio, de tempos imemoriais, de que toda
pessoa acusada de um delito tem o correspondente di-
reito à defesa. Em textos clássicos dos direitos funda-
mentais, essa garantia está ligada a outros princípios:
o devido processo legal e a presunção de inocência. Na
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão (1789),
que consagrou o movimento revolucionário francês da
república contra a monarquia, os arts. 7º e 9º dispõem:
Ninguém pode ser acusado, preso ou detido senão nos casos
determinados pela lei e de acordo com as formas por estas
prescritas”; “Todo o acusado se presume inocente até ser de-
clarado culpado e, se se julgar indispensável prendê-lo, todo o
rigor não necessário à guarda da sua pessoa deverá ser seve-
ramente reprimido pela lei”.
Revista_Bonijuris_NEW.indb 120 23/01/2018 21:06:43

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