Pirandello e a inquietude moderna

AutorAndrea Quilian de Vargas - Rosani Ketzer Umbach
CargoDoutoranda em Estudos Literários na Universidade Federal de Santa Maria - Professora titular do Departamento de Letras Estrangeiras Modernas da Universidade Federal de Santa Maria
Páginas210-226
doi:10.5007/1984-784X.2015v15n23p210
210
|boletim de pesquisa nelic, florianópolis, v. 15, n. 23, p. 210-226, 2015|
PIRANDELLO E A INQUIETUDE MODERNA
Andrea Quilian de Vargas
Rosani Úrsula Ketzer Umbach
UFSM/CAPES/CNPq
RESUMO: O escritor e dramaturgo siciliano Luigi Pirandello viveu entre dois mundos: o atrasado uni-
verso da Sicília no final do século XIX, e a arrojada modernidade do início do XX. Sua obra contem-
pla as mutações dos sistemas de valores e a transformação das condições sociais e históricas da vida,
ao mesmo tempo em que ressalta a impotência do homem diante dessa realidade. Sua poética se
articula segundo a dinâmica e a temática de uma estética decadentista que critica a sociedade e os
postulados de um radicalismo artístico, assim como a ausência de sentido da história e da vida. O
falecido Mattia Pascal, Um, nenhum e cem mil, Seis personagens à procura de um autor e Assim é
(se lhe parece) são obras citadas neste trabalho com o intuito de mostrar que fragmentação, ruptura
com a mimesis e antirrepresentação são uma constante em Pirandello, cuja obra se encontra imersa
na contraditória modernidade.
PALAVRAS-CHAVE: Pirandello. Modernidade. Antirrepresentação.
PIRANDELLO AND THE MODERN UNEASINESS
ABSTRACT:
The Sicilian writer and playwright Luigi Pirandello lived between two worlds: the late Sic-
ily universe in the end of the nineteenth century, and the bold modernity in the beginning of the
twentieth century. His work encompasses the changes in the system of values as well as the social
and historical transformations. At the same time, he highlights the powerless man who was facing
such reality and this becomes a meaningful element in his texts. Pirandello’s poetic constitutes itself
according to the dynamics and theme of a criticizing decadence towards society, the postulates of an
artistic radicalism and the absence of history, and life meaning as well. O falecido Mattia Pascal,
Um, nenhum e cem mil, Assim é (se lhe parece) e Seis Personagens à Procura de um Autor are the
works cited in this paper with the purpose of showing that fragmentation, mimesis disruption and
anti-representation are constant in Pirandello’s works which are immersed in the contradictory mo-
dernity.
KEYWORDS: Pirandello. Modernity. Anti-representation.
Andrea Q. de Vargas é doutoranda em Estudos Literários na Universidade Federal de Santa Maria.
Rosani Úrsula K. Umbach é professora titular do Departamento de Letras Estrangeiras Modernas da
Universidade Federal de Santa Maria.
doi:10.5007/1984-784X.2015v15n23p210
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|boletim de pesquisa nelic, florianópolis, v. 15, n. 23, p. 210-226, 2015|
PIRANDELLO E A INQUIETUDE MODERNA
Andrea Quilian de Vargas
Rosani Úrsula Ketzer Umbach
Não me parece mais, o atual, tempo de escrever livros,
nem por brincadeira. No que diz respeito à literatura,
como a tudo o mais, devo repetir meu costumeiro estri-
bilho: “Maldito seja Copérnico!”
Pirandello, O falecido Mattia Pascal
Tentar compreender a obra de Pirandello em sua totalidade é adentrar uma
prática discursiva inserida em um problemático contexto: a modernidade. Re-
cordemos alguns importantes eventos históricos da época que abrange desde
o nascimento (1867) até a morte (1936) do escritor e dramaturgo siciliano,
sem os quais o mundo econômico, social e cultural não seria como o conhece-
mos. A história moderna é marcada, segundo o escritor e filósofo estaduni-
dense Marshall Berman (1982, p. 15), por grandes descobertas nas ciências
físicas, descomunal explosão demográfica, desenvolvimento de sistemas de
comunicação, Estados nacionais cada vez mais poderosos que lutam com obs-
tinação para expandir seu poder, movimentos sociais de massa e de nações
lutando para obter algum controle. Em Tudo que é sólido desmancha no ar,
Berman afirma que:
Ser moderno é encontrar-se em um ambiente que promete aventura, poder, ale-
gria, crescimento, autotransformação e transformação das coisas em redor
mas ao mesmo tempo ameaça destruir tudo o que temos, tudo o que sabemos,
tudo o que somos. A experiência ambiental da modernidade anula todas as fron-
teiras geográficas e raciais, de classe e nacionalidade, de religião e ideologia:
nesse sentido, pode-se dizer que a modernidade une a espécie humana. Porém,
é uma unidade paradoxal, uma unidade de desunidade: ela nos despeja a todos
num turbilhão de permanente desintegração e mudança, de luta e contradição,
de ambiguidade e angústia. Ser moderno é fazer parte de um universo no qual,
como disse Marx, “tudo o que é sólido desmancha no ar”.1
1 BERMAN, Marshall. Tudo que é sólido desmancha no ar. A ave ntu ra da modernidade. Tr ad.
Carlos Felipe Moisés e Ana Maria L. Ioriatti. São Paulo: Companhia das Letras, 1986, p. 15.

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