A petição inicial

AutorMarcelo Andrade Campos Silva
Páginas21-32

Page 21

1. 1 - Conceitos

O Poder Judiciário não pode se mover por si, eis que a jurisdição é inerte e depende de provocação expressa da parte (jurisdição contenciosa) ou do interessado (jurisdição voluntária)1, que busca a satisfação de seu direito em juízo por não tê-la obtido de forma autônoma fora deste.

Trata-se, como se vê, de atividade subsidiária à prática cotidiana, ou seja, sua atuação se circunscreve aos momentos em que não se possa satisfazer o direito pelas vias não contenciosas, ou quando a lei exija a chancela estatal para determinado ato.

É o que se lê do artigo 2º do Código de Processo Civil:

Art. 2º - Nenhum juiz prestará a tutela jurisdicional senão quando a parte ou o interessado a requerer, nos casos e formas legais.

A petição inicial é, assim, no caso da jurisdição contenciosa, o meio pelo qual o interessado provoca a atuação judicial, trazendo em si a providência que deseja deste em relação ao réu, que não a atendeu de forma espontânea.

No caso da jurisdição voluntária, a função é outra, de sorte a apresentar ao Estado-Juiz qual ato deseja praticar, dentre aqueles que dependam da atuação estatal.

Isto tem importância prática direta ao julgador, porque é com base na petição inicial que se elabora o arcabouço da sentença, como se verá abaixo ao tratarmos do princípio da congruência.

Page 22

Pode-se dizer que assim ela é um anteprojeto de sentença, e delimitará os limites (objetivos e subjetivos) da decisão de forma direta, por trazer os elementos identificadores da ação (partes, causa de pedir e pedido).

1. 2 - requisitos da Petição Inicial

A petição inicial deverá ser apresentada por escrito e, salvo a hipótese pre-vista no artigo 36 do Código de Processo Civil, deverá ser firmada por advogado legalmente habilitado e atender aos requisitos do artigo 282 do mesmo diploma legal.

Para fins práticos, seguiremos a ordem nele prevista:

1.2. 1 - O juiz ou tribunal a que é dirigida

O endereçamento da petição inicial definirá, seguindo as regras de competência (artigos 86 a 111 do Código de Processo Civil) quem fará a análise desta, devendo seguir também as normas locais sobre organização judiciária.

Gize-se que, em sendo erroneamente endereçada, a petição será também incorretamente distribuída o que, no mínimo, gerará atraso na sua análise pelo julgador competente, que terá de determinar sua remessa a quem compete analisá-la, ou ainda devolvê-la para nova distribuição (quando existir mais de uma a vara competente para seu processamento).

1.2. 2 - Nome, prenomes e qualificação das partes

Aqui se estabelecem os limites subjetivos da lide (salvo as hipóteses de intervenção de terceiros - artigos 56 a 80 do Código de Processo Civil).

Aponte-se que se faz necessária a apresentação mais completa possível (nome, prenome, estado civil, domicílio, profissão, número de documentos e residência do autor e réu), de sorte a evitar embaraços práticos.

Dentre esses, podemos exemplificar a presença de homônimos, ou ainda a impossibilidade do processamento de determinada medida judicial, como o bloqueio on-line de valores monetários (via sistema Bacen-JUD) que depende do fornecimento do número do CPF (cadastro de pessoa física) ou do CNPJ (cadastro nacional de pessoa jurídica) da parte a ser atingida pela medida.

A correlação com a sentença aqui é direta, pois, salvo as ações cujas decisões produzem efeitos erga omnes, quem não for incluído na lide não será por ela afetado diretamente.

Page 23

1.2. 3 - O fato e os fundamentos jurídicos

Nesta parte se definem os elementos necessários a identificação das ações, por meio da chamada Teoria das Três Identidades, que considera que uma ação é idêntica à outra quando tem em comum os sujeitos, a causa de pedir e o objeto (art. 301, § 2º do Código de Processo Civil).

Três são os elementos da ação:
1 - AS PARTES - AUTOR E RÉU (definidas acima);
2 - O OBJETO; e
3 - A CAUSA DE PEDIR (causa petendi).

O objeto se resume naquilo que o autor busca, ou seja, qual a providência desejada do juízo.

Ele é dividido em objeto imediato e mediato.

Por objeto imediato, compreende-se o tipo de providência jurisdicional solicitada (na teoria tradicional: declaratória, constitutiva condenatória; na teoria quinária acrescenta-se a mandamental e executiva latu sensu);

Por objeto mediato, entende-se justamente o bem da vida a ser conseguido por meio da tutela jurisdicional.

A narração fática é, ao contrário do que lamentavelmente se vê rotineiramente na prática (onde o “copia e cola” faz proliferar jurisprudências e transcrições de doutrina, inflando desnecessariamente as peças processuais como consequência funesta das facilidades trazidas pela informática), a parte principal da petição inicial.

Espera-se que, com a virtualização de autos em andamento e com a proliferação das ditas “Varas Virtuais” tal procedimento diminua, eis que há limitação do número de laudas em função do tamanho dos arquivos aceitos.

A descrição fática dará o arcabouço necessário à sentença, e deve ser descrita no relatório desta da melhor forma possível.

Trata-se da causa de pedir, que para o presente define-se como o fato jurídico abstratamente previsto na lei sobre o qual incidirá o direito. Fato como acontecimento da vida, e jurídico pela sua relevância para o direito.

Nas ações de conteúdo positivo é sempre a existência da relação jurídica e a existência do fato o conteúdo da causa de pedir.

Nas ações de conteúdo negativo (ações declaratórias negativas), a inexistência da relação jurídica ou do fato jurídico é o conteúdo da causa de pedir.

Page 24

1.2. 4 - O pedido

O pedido tem relação direta com o conteúdo da sentença e seu dispositivo, porque delimita o que será nela decidido.

Divide-se em pedido mediato, ou seja, o tipo de tutela jurisdicional pretendida e pedido imediato, constituindo o bem da vida que se afirma o autor afirma estar assegurado.

No processo de conhecimento (pela teoria trinária) a tutela pretendida pode ser uma mera certificação do direito (declaração); ou a certificação do direito com eficácia de criar, modificar ou extinguir uma situação jurídica (constituição); ou ainda a certificação do direito com a consequente aplicação de uma sanção ao responsável por sua violação (condenação).

A teoria quinária, cuja força vem se sobressaindo pela tendência de sincretizar o processo civil, acrescenta a tutela mandamental que visa à obtenção de ordem de autoridade (mandamento).

Por último, segundo a teoria quinária, tem-se ainda a tutela executiva latu sensu, que após a decisão condenatória não necessita de procedimento executivo (ou cumprimento de sentença), posto seu cumprimento ser dela diretamente decorrente, como a reintegração de posse ou nas ações com base no art. 461 e 461-A do Código de Processo Civil, exemplificativamente.

A natureza do pedido imediato qualifica a ação em que ele é formulado, donde se falar em ação declaratória, constitutiva, condenatória, mandamental e executiva latu sensu.

É importante ressaltar a direta relação (...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT