Personalidade Internacional - Estado

AutorJulio César Borges dos Santos
Ocupação do AutorBacharel em Direito. Professor universitário. Mestre em Relações Internacionais pela Universidade de Brasília. Pesquisador do Direito e das Relações Internacionais
Páginas67-82

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Neste capítulo você aprenderá sobre:

· Os elementos constitutivos e a classificação dos Estados.

· Nascimento, reconhecimento, transformação e fim dos Estados.

· Órgãos do Estado nas relações internacionais.

1. Formação do Estado

Elementos constitutivos

Conforme já estudado, os Estados, juntamente com as organizações internacionais, são pessoas jurídicas de direito internacional público. Compõem-se de: a) população permanente; b) território fixo no qual a autoridade estatal se concretiza1; c) governo (organização política).

Os Estados são os principais sujeitos do DIP. Eles são os sujeitos "primários e fundadores" da sociedade internacional, nas palavras de Aguilar Navar-

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ro. É por sua iniciativa que surgiram outras pessoas internacionais, como as organizações internacionais. O que leva Théodore Christakis a escrever "o direito internacional ama o Estado", que foi o seu criador.2Vale acrescentar que eventualmente poderá ver-se um Estado privado do elemento governo, a exemplo do que ocorre em momentos de extrema anarquia. Do mesmo modo, um Estado poderá em determinadas circunstâncias ver-se privado do efetivo controle de seu território. Assim, nunca será demais lembrar que o ônus maior pela confirmação do princípio da continuidade do Estado recairá sempre e, ininterruptamente, sobre seu elemento populacional.

Classificação

Inúmeras são as possibilidades de classificação dos Estados. Inicialmente, a classificação mais comum é aquela segundo a qual os Estados podem ser divididos de acordo com sua estrutura em simples (poder único e centralizado) e compostos (por subordinação e coordenação).

Estado composto por coordenação - constitui-se numa associação de Estados soberanos todos no mesmo nível de igualdade, com conservação de sua autonomia interna. São exemplos desta modalidade de composição os Estados federais, os Estados confederados, as uniões de Estados (pessoal e real) e a Commonwealth.

Estado federal (federação de Estados) - formado pela união permanente de dois ou mais Estados-membros, cada um dos quais conservando unicamente sua autonomia interna.3

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Confederação de Estados - formada por Estados que para tal conservam sua autonomia e personalidade internacional para a consecução de determinados objetivos comuns.

União de Estados - reunião de dois ou mais Estados independentes sob autoridade de um líder comum. Será pessoal quando acidental ou temporariamente dois Estados passarem a ser governados por um soberano comum. Tal modelo de composição estatal ocorre em geral na forma monárquica de governo. A união será real quando dois ou mais Estados, por força de um ato jurídico interno ou internacional, delegarem a um único órgão seus poderes de representação externa.

Commonwealth - formação sui generis cujo símbolo é a Coroa Britânica. Seus Estados-membros são plenamente soberanos e se encontram no mesmo nível dos demais, não havendo, portanto, hierarquia entre eles. A Commonwealth não possui personalidade internacional.

Estado composto por subordinação - constitui-se numa associação de Estados em diferentes graus de igualdade, do que são exemplos os Estados vassalos, os protetorados internacionais, os Estados exíguos, os Estados satélites e os Estados-clientes.

Reconhecimento de Estado

Tão logo desponta no seio da comunidade internacional um novo Estado deverá ocorrer o seu reconhecimento - expresso ou tácito -, o qual se constituirá em ato discricionário, unilateral, irrevogável e incondicional dos demais Estados.4

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A existência política do Estado é independente do seu reconhecimento pelos outros Estados. Mesmo antes de ser reconhecido, o Estado tem o direito de defender a sua integridade e independência, de promover a sua conservação e prosperidade, e, por conseguinte, de se organizar como melhor entender, de legislar sobre os seus interesses, de administrar os seus serviços e de determinar a jurisdição e a competência de seus tribunais. O exercício desses direitos não tem outros limites senão o do exercício dos direitos de outros Estados, conforme o direito internacional.5Devendo o reconhecimento ser provocado pelo novo Estado por meio de notificação, não existirá, entretanto, um momento específico no qual este deva ocorrer.

Tanto o reconhecimento expresso quanto o tácito poderão ocorrer de modo individual ou coletivo.6

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O reconhecimento poderá ser considerado expresso quando se verificar em virtude de uma declaração unilateral ou resultar de um tratado firmado entre os interessados, e tácito, quando um Estado enviar agentes diplomáticos para o novo membro da sociedade internacional.

Poderá, ainda, o reconhecimento ser individual ou coletivo, este quando diversos Estados, no mesmo documento, efetuam o reconhecimento do novo Estado.7

Reconhecimento de governo

O reconhecimento de governo - ato político inerente aos interesses de cada Estado - não se funda nas mesmas premissas do reconhecimento de Estado. Neste sentido, reconhece-se o governo

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de um Estado que já se encontra fazendo parte do mundo jurídico no qual existe o direito das gentes, ou seja, reconhece-se o governo de um Estado que já é pessoa jurídica de direito internacional. Tal compreensão, entretanto, no dizer de Rezek, aponta para um problema importante: o rompimento da continuidade política em função de golpes de Estado ou revoluções demandará para o novo governo instalado a necessidade de reconhecimento em sede de direito das gentes, porém não se poderá afirmar a mesma coisa se a quebra de continuidade decorrer do próprio governo instalado com o objetivo de prolongar sua estada no poder.

O reconhecimento de governo deve ocorrer sempre que um novo governo se instalar em um Estado, com a violação do seu sistema constitucional, isto é, quando ele alcança o poder por meios não previstos no sistema jurídico estatal.

É de se salientar que se o governo que está no poder der um golpe de Estado para nele se perpetuar, alterando o quadro constitucional, não há a figura do reconhecimento, uma vez que não é um novo governo. Entretanto, é preciso salientar que estas "regras" não são fixas e variam com a nova situação política.8A nosso ver, o reconhecimento do surgimento de uma nova ordem institucional num Estado não implica necessariamente no reconhecimento de sua legitimidade. Em sendo assim, sempre que ocorrer um rompimento na continuidade política de um Estado, surgirá a necessidade de reconhecimento do novo governo que aí se instalar, ainda que ele possua vínculo com os elementos mantenedores da ordem institucional anterior.

Deste modo, um reconhecimento de governo poderá ocorrer expressamente, caso em que se observa a manifestação expressa e deliberada deste juízo por no mínimo outro Estado, ou de modo tácito, quando um outro Estado optará pela simples manutenção das

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relações diplomáticas com aquele no qual tenha surgido o novo governo.

Do exposto, resulta inegável a importância do ato a partir do qual se reconhece um governo, em virtude de tal iniciativa acabar por legitimar determinado Estado a interagir com seus pares no sistema internacional. Assim, reconhecido o governo de um Estado, este poderá, entre outras iniciativas, estabelecer relações diplomáticas, demandar em tribunais internacionais, bem como garantir a seus representantes imunidade de jurisdição, além de algumas outras prerrogativas.

Acerca do reconhecimento de governo, muitas doutrinas foram elaboradas no sentido de esclarecer-lhe os fundamentos. Destacamos as seguintes:

  1. Doutrina Tobar (1907) - De acordo com Carlos Tobar, ministro das Relações Exteriores do Equador o reconhecimento de um governo por Estados estrangeiros deveria condicionar-se à...

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