Penal e processo penal

Páginas43-49

Page 43

AMEAÇA ESPIRITUAL SERVE PARA CONFIGURAR CRIME DE EXTORSÃO

Superior Tribunal de Justiça

Recurso Especial n. 1.299.021/SP Órgão Julgador: 6a. Turma

Fonte: DJ, 23.02.2017

Relator: Ministro Rogerio Schietti Cruz

EMENTA

Penal. Recurso especial. Estelio-nato e extorsão. Alegação genérica de violação do art. 619 do CPP. Súmula n. 284 do STF. Art. 599 do CPP. Falta de prequestionamento. Mal espiritu-al. Ineficácia da ameaça não configurada. Vítima que, coagida, efetuou o pagamento da indevida vantagem econômica. Princípio da consunção. Falta de prequestionamento. Desclas-sificação para o crime do art. 284 do CP. Súmula n. 7 do STJ. Exasperação da pena-base. Violação do art. 59 do CP não configurada. Pena superior a 4 anos e inferior a 8 anos de reclusão. Regime inicial semiaberto. Observância art. 33, § 2º, "b", do CP. Atribuição de efeito suspensivo ao recurso especial. Prejudicialidade do pedido. Possibilidade de execução imediata da pena. Entendimento do plenário virtual do supremo tribunal federal. Recurso parcialmente conhecido e não provido. Agravo regimental na tutela provisória julgado prejudicado.

  1. O recurso especial que indica a vio-lação do art. 619 do CPP sem especificar a tese que deixou de ser analisada no acórdão recorrido, é deficiente em sua fundamentação e atrai a aplicação do óbice da Súmula n. 284 do STF. 2. Inviável o conhecimento da tese de malferimento do art. 599 do Código de Processo Penal se o acórdão recorrido não emitiu juízo de valor expresso sobre o conteúdo do dispositivo federal ou sobre a tese jurídica que se busca discutir na instância excepcional. Eventual ofensa ao princípio da correlação não pode nem sequer ser acolhida de ofício, pois a recorrente foi julgada estritamente pelos fatos narrados na denúncia, ainda que o Ministério Público não haja pleiteado, expressamente, a aplicação do art. 71 do CP. 3. A alegação de ineficácia absoluta da grave ameaça de mal espiritual não pode ser acolhida, haja vista que, a teor do enquadramento fático do acórdão, a vítima, em razão de sua livre crença religiosa, acreditou que a recorrente poderia concretizar as intimidações de "acabar com sua vida", com seu carro e de provo-car graves danos aos seus filhos; coa-gida, realizou o pagamento de indevida vantagem econômica. Tese de violação do art. 158 do CP afastada. 4. O pedido de aplicação do princípio da consunção não foi deduzido nas contrarrazões do apelo do Ministério Público, na apelação criminal da defesa e tampouco por ocasião da oposição dos embargos de declaração e, por tal motivo, deixou de ser enfrentado pelo Tribunal de origem, o que caracteriza a ausência de prequestionamento e impede, no ponto, o conhecimento do recurso especial. 5. Não há, na dinâ-mica dos fatos descritos pelo Tribunal de origem, elemento que autorize, de plano, o acolhimento da tese de que a recorrente agiu com o intuito de, com fórmulas e rituais, resolver os problemas de saúde supostados pela vítima, praticando, em verdade, o crime de curandeirismo. Para afastar a conclusão da instância ordinária, de que a recorrente, desde o início, valeu-se da liberdade de crença da vítima e de sua fragilidade para obter vantagem patrimonial indevida, seria necessário reexaminar fatos e provas, providência incabível no recurso especial, a teor da Súmula n. 7 do STJ. 6. Devi-damente motivada a fixação da repri-menda inicial acima do mínimo legal, não há falar em violação do art. 59 do CP. Em relação ao crime de estelionato, o acórdão registrou que a recorrente "explorou os sofrimentos da vítima, bem como obteve ganhos ex-pressivos", elementos que justificam o acréscimo da pena-base em apenas 2 meses de reclusão. Quanto ao crime de extorsão, a instância ordinária exasperou a reprimenda em 8 meses de reclusão, haja vista que a recorrente, além de consumar a extorsão, obteve com a conduta o proveito de R$ 20.000,00. Correta a mais severa fixação da pena nesta hipótese, quan-do comparada, por exemplo, com a conduta de agente que consuma a extorsão, mas não exaure o crime, vale dizer, não obtém a indevida vantagem econômica que desejava.

  2. Por força do concurso material, as penas foram aplicadas de forma cumulativa, não havendo reparo a ser feito no regime inicial semiaberto, que observou o art. 33, § 2º, "b", do CP.

  3. Julgado o recurso especial, sem êxito, não há falar em atribuição de excepcional efeito suspensivo ao reclamo para obstar a execução imediata da pena, providência que está em consonância com entendimento fir-mado pelo Plenário Virtual do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do ARE n. 964.246, sob a sistemática da repercussão geral. Agravo Regimental na Tutela Provisória no Recurso Especial prejudicado.

  4. Recurso especial parcialmente conhecido e, nesta extensão, não provido. Agravo regimental prejudicado.

    Page 44

    ACÓRDÃO

    Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma, por unanimidade, conhecer parcialmente do recurso e, nesta extensão, negar-lhe provimento, e julgar prejudicado o agravo regimental, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

    Brasília (DF), 14 de fevereiro de 2017 Ministro ROGERIO SCHIETTI CRUZ

    RELATÓRIO

    O SENHOR MINISTRO ROGERIO SCHIETTI CRUZ:

    (...) interpõe recurso especial, com fundamento no art. 105, III, "a" e "c", da Constituição Federal, contra acórdão proferido pelo Tribunal de Justiça local na Apelação n. 0015500-25.2007.8.26.0079/50000.

    A recorrente, condenada a 6 anos e 24 dias de reclusão, além de multa, pelo concurso material dos crimes de extorsão (um crime) e de estelionato (3 crimes, em continuidade delitiva), aponta, em suas razões de pedir, violação dos arts. 619 do CPP; 158, 171 e 284, do CP; 33, 59 e 68 do CP.

    Para tanto assere: a) o acórdão não examinou "todas as teses e matérias pretendidas" pela defesa (?. 389); b) ocorreu julgamento ultra petita e negativa de vigência ao art. 599 do CPP, bem como ofensa aos princípios da correlação entre a acusação e a sentença, porquanto "não houve requerimento ministerial para a consecução da citada continuidade delitiva" (?. 397); c) faz-se necessária a revaloração das provas para reconhecer a atipicidade da conduta e a contrariedade ao art. 158 do CP, porquanto não proferiu "qualquer tipo de grave ameaça à pseudo-vítima" ou empregou "violência contra a pessoa à caracterizar o delito" (?. 404); d) está caracterizada "ofensa ao princípio da consunção relativamente aos arts. 171 e 158 do CP" (?. 407) e e) faz-se necessária a "desclassificação das condutas para aquela enquadrada no art. 284 do CP" (?. 411).

    Ultrapassada essas questões, ressalta a "exasperação desmotivada da reprimenda" (?. 416), com "amparo em abstrações e baseados na própria conduta criminosa" (?. 420) e que "igualitariamente, a justificativa apli-cada para o agravamento do regime de cumprimento da pena [...] não me-rece aplausos" (?. 429).

    Requer a anulação do acórdão, a absolvição das imputações, a incidência do princípio da consunção, a desclassificação das condutas para o crime de curandeirismo ou o redimensionamento da pena e do regime prisional.

    Contrarrazões às fis. 517-543.

    O Ministério Público Federal manifestou-se pelo "conhecimento parcial do recurso, desprovendo-o em tal extensão" (?. 584).

    EMENTA

    Penal. Recurso especial. Estelio-nato e extorsão. Alegação genérica de violação do art. 619 do CPP. Súmula n. 284 do STF. Art. 599 do CPP. Falta de prequestionamento. Mal espiritu-al. Ineficácia da ameaça não configurada. Vítima que, coagida, efetuou o pagamento da indevida vantagem econômica. Princípio da consunção. Falta de prequestionamento. Desclas-sificação para o crime do art. 284 do cp. Súmula n. 7 do STJ. Exasperação da pena-base. Violação do art. 59 do CP não configurada. Pena superior a 4 anos e inferior a 8 anos de reclusão. Regime inicial semiaberto. Observância art. 33, § 2º, "b", do CP. Atribuição de efeito suspensivo ao recurso especial. Prejudicialidade do pedido. Possibilidade de execução imediata da pena. Entendimento do plenário virtual do supremo tribunal federal. Recurso parcialmente conhecido e não provido. Agravo regimental na tutela provisória julgado prejudicado.

  5. O recurso especial que indica a violação do art. 619 do CPP sem especificar a tese que deixou de ser analisada no acórdão recorrido, é de-ficiente em sua fundamentação e atrai a aplicação do óbice da Súmula n. 284 do STF.

  6. Inviável o conhecimento da tese de malferimento do art. 599 do Código de Processo Penal se o acórdão recorrido não emitiu juízo de valor expresso sobre o conteúdo do dispositivo federal ou sobre a tese jurídica que se busca discutir na instância excepcional. Eventual ofensa ao princípio da correlação não pode nem sequer ser acolhida de ofício, pois a recorrente foi julgada estritamente pelos fatos narrados na denúncia, ainda que o Ministério Público não haja pleiteado, expressamente, a aplicação do art. 71 do CP.

  7. A alegação de ineficácia abso-luta da grave ameaça de mal espiritual não pode ser acolhida, haja vista que, a teor do enquadramento fático do acórdão, a vítima, em razão de sua livre crença religiosa, acreditou que a recorrente poderia concretizar as intimidações de "acabar com sua vida", com seu carro e de provocar graves danos aos seus filhos; coagida, reali-zou o pagamento de indevida vantagem econômica. Tese de violação do art. 158 do CP afastad...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT