Patentes Farmacêuticas e direito à saúde

AutorMarcos Vinício Chein Feres - Gustavo Candian Filardi
CargoUniversidade Federal de Juiz de Fora. Diretor e Professor adjunto da Faculdade de Direito da UFJF, Mestre e Doutor em Direito Econômico pela UFMG - Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista de iniciação científica do Programa BIC da Pró-Reitoria de Pesquisa da UFJF
Páginas31-52
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Patentes farmacêuticas e direito à saúde
Scientia iuriS, Londrina, v. 15, n. 2, p. 31-51, dez. 2011
PATENTES FARMACÊUTICAS E DIREITO À SAÚDE*
PHARMACEUTICAL PATENTS AND THE RIGHT TO HEALTH
Marcos Vinício Chein Feres**
Gustavo Candian Filardi***
Resumo: O presente trabalho tem por objetivo a análise do instituto
das patentes de segundo uso médico, não expressamente regulamentado
na ordem jurídica brasileira. Nesta tarefa, valer-se-á do marco teórico da
Teoria do Direito como Integridade. Por meio da análise dos princípios
morais e políticos que subjazem e legitimam a concessão do direito à
patente, verifica-se a adequação das patentes de segundo uso médico.
Metodologicamente, essa interpretação do sistema de atribuição de
direitos à patente revela uma reconstrução crítica da relação entre
incentivo à inovação e acesso a medicamentos.
Palavras-chave: Direito como integridade. Comunidade personificada.
Patentes farmacêuticas. Segundo uso de meedicamentos.
Abstract: This article focuses in the analysis of the patents of subsidiary
medical use, not expressly regulated in the Brazilian legal system. In
order to study this specific hypothesis of property rights, the theoretical
reference of this research is the theory of Law as integrity. Through the
analysis of political and moral principles which legitimate the concession
of the patent right, it is possible to verify the appropriateness of the
second use of a medical drug. Methodologically, this interpretation of
patent rights represents the critical reconstruction of the relationship
between the incentive to innovation and the access to pharmaceuticals.
Key-words: Law as integrity. Personified community. Pharmaceuticals
patent. Second use of medicines.
* Este artigo tem o financiamento do Conselho Nacional de Desenvolvimento
Científico e Tecnológico (CNPQ) e da Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado De
Minas Gerais (FAPEMIG).
** Universidade Federal de Juiz de Fora. Diretor e Professor adjunto da Faculdade
de Direito da UFJF, Mestre e Doutor em Direito Econômico pela UFMG. Email:
mvchein@gmail.com.
*** Universidade Federal de Juiz de Fora. Bolsista de iniciação científica do Programa
BIC da Pró-Reitoria de Pesquisa da UFJF. Email: gucand@hotmail.com
DOI: 10.5433/2178-8189.2011v15n2p31
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Marcos Vinício Chein Feres; Gustavo Candian Filardi
Scientia iuriS, Londrina, v. 15, n. 2, p. 31-51, dez. 2011
INTRODUçãO
A concessão de patentes farmacêuticas, principalmente nos países em via
de desenvolvimento, sempre foi um tema bastante complexo e moralmente
questionado. De um lado, argumenta-se em prol dos interesses das empresas
inovadoras e dos que investem grande parte do seu tempo em suas atividades
de pesquisa, colocando à disposição da sociedade novos medicamentos. De
outro, tem-se o interesse da população menos favorecida, muitas vezes privada
de seu direito constitucional à saúde em virtude dos altos preços fixados pela
indústria farmacêutica e pela falta de recursos e ineficiência do Estado em
gerir políticas públicas que efetivamente promovam o acesso irrestrito às novas
drogas desenvolvidas. E é, neste polêmico contexto, que se inserem as patentes
de segundo uso médico, isto é, patentes que têm por objeto de proteção a nova
indicação terapêutica de compostos químicos ou princípios ativos já conhecidos
e integrados ao domínio público.
Por não haver disciplina específica no ordenamento jurídico brasileiro
que regulamente sua concessão, tal instituto tem se tornado a força motriz de
intensas disputas políticas e institucionais, gerando incoerências e divergências
nas decisões públicas. Segundo a Agência Nacional de Vigilância Sanitária
(ANVISA), as patentes de segundo uso médico representam uma séria ameaça à
saúde pública, à medida que restringem o acesso a medicamentos ao prorrogarem,
por um tempo ainda maior, o monopólio comercial conferido pelo direito
de exclusiva, retirando do domínio público a possibilidade de se produzirem
genéricos. De outra parte, o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI),
contrariando o posicionamento da ANVISA, considera este instituto, além de
legal, como de fundamental importância para o desenvolvimento econômico e
tecnológico de países periféricos no cenário farmacêutico mundial. Conforme
entendimento desta autarquia, as patentes de segundo uso médico são mais
adequadas à capacidade da indústria farmacêutica nacional, em razão de o
capital investido para a exploração de compostos químicos e princípios ativos
já existentes ser menor do que o empregado no desenvolvimento de novas
entidades químicas.
A falta de consenso entre INPI e ANVISA sobre a pertinência ou não dos
pedidos de patentes de segundo uso médico, além de revelar incoerência entre os
atos de Estado, acaba por fazer com que os pedidos para a concessão do direito
de exclusividade fiquem estagnados no INPI  o que é demasiado danoso à
política de ampliação do acesso à saúde e às novas drogas desenvolvidas. Faz-se,

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