Democracia, Participação e Poder Local: Uma Análise da Atuação dos Novos Movimentos Sociais no Estado Democrático de Direito Brasileiro

AutorRejane Esther Vieira; Ana Elise Cardoso Inácio
CargoAcadêmicas do curso de Administração Pública pela Universidade do Estado de Santa Catarina - Escola Superior de Administração e Gerência
Introdução

O limiar de um novo século12 vem reestruturando o mundo e afetando profundamente a função tradicional do Estado e as relações deste com a sociedade. Observa-se uma nova configuração na atuação dos movimentos sociais na sociedade civil brasileira. Apresentam-se com diferentes formatos, são mais heterogêneos e antagônicos, o que permitem a construção de novos espaços de participação. O papel do Estado é questionado e desde então faz parcerias com empresários e executivos do setor privado e organizações não-governamentais do terceiro setor, para suprir e complementar sua gestão.

Nas últimas décadas, a sociedade civil passou a se articular de maneira diferente na sua relação com o Estado. Temos o resgate da importância dos governos locais, a vigência de regimes mais democráticos, a valorização do processo de descentralização, novas articulações entre poder público, sociedade e atividade produtiva, a preocupação com a preservação ambiental e melhoria da qualidade de vida. Esses são elementos importantes para a construção de espaços públicos participativos.

Interessa-nos consignar aqui, de que maneira a democracia participativa auxilia os movimentos sociais, uma relação que decorre do conceito de cidadania e direitos, abrindo caminhos para a ‘participação cidadã’ na gestão de um Estado mais democrático e participativo.

Entende-se que a participação popular e o aumento das capacidades e habilidades dos atores sociais, são essenciais, na busca de soluções para problemas na sociedade atual. A ação coletiva, efetivada e entendida aqui, pelos movimentos sociais, parece ser um dos caminhos a se chegar a uma maior representatividade e a uma busca por qualidades, seja ela dos mais variados âmbitos, como o educacional, saúde, lazer ou tantos outros.

1. Estado Democrático de Direito e a Democracia Participativa: O Contexto Brasileiro

Partindo da análise da evolução histórica do Estado de Direito no mundo, observa-se que os diferentes modelos de Estado construídos ao longo da história moderna estão representados pelo Estado Liberal, no século XVIII, a partir da Revolução Francesa passando para o Estado Social ou Estado Providência, durante o século XIX, e posteriormente, para o de Bem-estar Social e Estado Democrático de Direito, a partir de meados do século XX. A importância de pesquisar o Estado de Direito brasileiro está no processo de ‘construção’ de um novo Estado, mais eficiente, mais cidadão, de caráter social, democrático e principalmente participativo.

Reservou-se, com o movimento global de construção desse Estado de Direito, um espaço destacado à participação. Por meio dela, rompe-se às fronteiras existentes entre o Estado e a sociedade, aproximando-os. Abre-se a busca pela concepção da ‘liberdade’, entendida aqui de maneira mais ampla, identificada pela emergência dos novos direitos. Entende-se que o marco fundamental do Estado de Direito é a democracia, associada aos direitos fundamentais, que direciona a participação popular nas decisões políticas ou reivindicatórias.

O Estado de Direito se constitui por diversos ‘atores sociais e políticos’ da sociedade, pelos cidadãos ativos que buscam atuar em diferentes espaços públicos de participação. Atualmente o Estado de direito se firma no papel da liberdade identificada pelos direitos fundamentais e pelos direitos humanos. Sendo assim sua constituição trás à vontade participativa de cidadãos em incrementar nos espaços públicos um “auxilio” ao Estado na execução de direitos fundamentais, como educação, alimentação, vestuário, proteção social a mulher, idoso, crianças e adolescentes.

O Estado de Direito garante em lei - na carta Maior, Constituição de 1988, a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, o pluralismo político. Assim como, o exercício dos direitos sociais (educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados) e individuais (a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos).

O Estado de Direito garante ainda, que todos brasileiros ou estrangeiros domiciliados no país, estejam submetidos ao mesmo regime de direito, ou seja, ao mesmo conjunto de regras. Entende-se que esta forma jurídica consagra-se pelo princípio da legitimidade na modernidade, onde existe subordinação do poder às leis gerais.

Para PEREZ, o Estado de Direito na atualidade não pode ser considerado simplesmente organizado com base na lei. Destaca que o Estado de Direito é “aquele que possui sua atuação pautada no Direito”3, sendo pela Constituição, pelos princípios gerais do Direito, pelas leis e regulamentos.

Conforme CANOTILHO, o Estado de Direito deve possuir a promoção da liberdade, a realização dos direitos humanos e se serve de um Direito renovado por ferramentas de atuação que aproximem a sociedade e o Estado, que rompa com as fronteiras que os separam e que possibilitem a participação do cidadão.4

O Estado Democrático de Direito é o exercício da democracia e da participação dos cidadãos de maneira plena e clara, onde a população possui também o poder político e participa de forma livre de acordo com seus ideais. Neste sentido, questiona-se a existência de um Estado Democrático de Direito no Brasil.

Fazem parte da realidade brasileira as populações envolvidas e atingidas em situações de injustiça social: as crianças, mulheres, populações indígenas, populações litorâneas e ribeirinhas (pescadores e caiçaras, populações urbanas marginalizadas, quilombolas e afrodescendentes, trabalhadores/as e populações rurais, trabalhadores/as extrativistas, trabalhadores/as industriais e urbanos(as) entre outros.

O Estado de Direito pode ser entendido como uma evolução dos modelos de Estado liberal e social porque envolve em torno de si princípios de proteção da liberdade humana, com o princípio de justiça social, os quais correspondem às ambições do Estado Social. Para

BOBBIO, “O Estado de direito é o Estado dos cidadãos.”5 No Estado de Direito o indivíduo tem uma maior amplitude em relação aos modelos anteriores de Estado porque envolve os direitos privados e públicos.

O Estado de Direito nasce, a partir da incapacidade do modelo liberal, diante da exclusão social acelerada nas sociedades pós-industriais, assim como a negação...

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