Origens e aspectos normativos da Lei das Sesmarias de 1375

AutorAlbenir Itaboraí Querubini Gonçalves
Páginas27-33

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A Lei das Sesmarias foi o instrumento jurídico chave para a efetiva colonização das terras do Brasil. Sua origem decorre de um período muito anterior às próprias navegações e conquistas além-mar de Portugal. Em outras palavras, quer-se deixar reforçada a noção de que a Lei das Sesmarias não foi uma lei criada com a finalidade de colonizar terras conquistadas fora dos domínios do reino português.

Eis, justamente, o objeto central de investigação deste capítulo: analisar as origens e os principais aspectos da Lei das Sesmarias, bem como a sua previsão nas Ordenações do Reino de Portugal, que tiveram aplicação nas terras brasileiras, que eram, aliás, solo português. Igualmente, salienta-se que o estudo das origens da Lei das Sesmarias é importante para compreensão do cultivo enquanto elemento normativo.

1. 1 Origens e aspectos normativos da Lei das Sesmarias de 1375

A origem do regime sesmarial em Portugal remonta ao antigo costume que foi se consolidando ao longo da história portuguesa de dar terras improdutivas para quem as quisesse ocupá-las e explorá-las, com a finalidade intrínseca de produzir alimentos. Adiante, na linha do tempo, Dom Fernando I consolida em lei escrita o costume transmitido pelo costume de dar terras incultas para quem as fizesse produzir, lei

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esta promulgada na cidade de Santarém no dia 26 de junho do ano de 1375. Nesse sentido, é importante destacar que Dom Fernando I não criou a Lei das Sesmarias a partir de pressupostos racionalistas, tais como aqueles empregados na atualidade pelo positivismo jurídico. Ele se utilizou do elemento presente no organismo social vivo do Direito (ratio legis), através do costume transmitido ao longo do tempo pela tradição jurídica. Tal elemento é tradado pela doutrina, a exemplo da afirmação de Cirne Lima que, na época do reinado de Dom Fernando, quando da publicação da Lei das Sesmarias, "já era velha a praxe de se tirarem aos donos as terras cultiváveis, que estes desleixavam, para entregá-las, mediante fôro ou pensão devidamente arbitrado, a quem as quisesse lavrar e aproveitar"1.

Registra-se que vários autores de diferentes épocas, ao tratar do tema das sesmarias, debruçam-se na tentativa de explicar a origem da palavra sesmaria, mas ainda inexiste consenso entre eles sobre esse tema. Sem entrar diretamente no mérito do referido debate, para os fins da presente investigação, é importante destacar que, em sua maioria, os autores associam o termo sesmarias à exploração de atividade agrária, a exemplo das teses de que derivaria do nome de antiga medida agrária, a sexta parte na repartição dos frutos da terra ou do termo latino "cæsina", o qual significa incisão ou corte, em alusão ao corte do arado sobre a terra.2No entanto, independente

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da etimologia da palavra sesmaria, o certo é que ela "designa concessões de terrenos incultos, e desaproveitados a pessoas,

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que sobre eles não tem direito algum antecedente, para efeito de os aproveitarem, e melhorarem pela agricultura."3

Deixando de lado a questão da origem etimológica das sesmarias, faz-se necessário ressaltar alguns pontos sobre as origens mais remotas desse costume de dar terras para o cultivo antes de adentrar no estudo dos motivos que antecederam e impulsionaram a decisão de Dom Fernando em publicar a Lei das Sesmarias. Nesse sentido, torna-se indispensável fazer referências ao trabalho da historiadora portuguesa Virgínia RAU, em sua obra Sesmarias Medievais Portuguesas, que realizou uma aprofundada e erudita pesquisa sobre as origens mais remotas do instituto das sesmarias no contexto da sociedade portuguesa medieval, cuja pesquisa encontra-se lastreada em...

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