Origem Histórica e Etimologia

AutorLuiz Henrique Sormani Barbugiani
Ocupação do AutorMestre em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo (USP)
Páginas19-33

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O recurso, pela sua própria essência, tem a finalidade de promover uma nova análise de uma questão posta em juízo sob a qual já recai uma decisão, podendo ser dirigido tanto ao órgão prolator quanto a um órgão superior de revisão, sendo a segunda hipótese a mais corrente invariavelmente associada ao princípio do duplo grau de jurisdição, conforme se depreende das lições de João Claudino de Oliveira e CRUZ:

A palavra recurso é empregada no sentido técnico e próprio do direito judiciário, ou seja, como disse João Monteiro, no de “provocação a novo exame dos autos para emenda ou modificação de primeira sentença”.

O recurso é o meio pelo qual se provoca o reexame da decisão recorrida e, em regra, por um Juízo superior.

Pelo princípio do duplo grau, a sua função consiste em sub-meter a causa a um segundo exame, que oferece maiores garantias do que o primeiro, porque se beneficia da experiência do órgão judiciário superior e permite evitar os erros

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e sanar as lacunas em que pode haver incorrido a primeira decisão.1(negrito e destaque no original)

Os designativos “embargos” ou “embargo” encontram-se plenamente difundidos em nosso ordenamento jurídico com diversos e, as vezes, antagônicos significados, seja no singular, seja plural, prejudicando uma definição precisa de seu conteúdo ou substrato jurídico, como bem observa Sandro Marcelo KOZIKOSKI, ao afirmar que:

“nem todas as palavras oferecem uma etimologia acessível. É o que ocorre com as locuções ‘embargo’ e ‘embargos’ que, por serem muito empregadas, inclusive com sentidos diver-sos, sofrem uma certa dificuldade quanto à delimitação de sua origem e significado. Ademais, o vocábulo em questão é empregado tanto no singular como também no plural.”2No mesmo sentido, Sérgio SHIMURA esclarece que os termos supracitados transmitem uma noção de impedimento entre outros significados de conotação semelhante, sendo oportuna a transcrição de suas percucientes palavras no sentido de que:

“a expressão ‘embargo’, ou ‘embargos’, traduz a idéia de impedimento, estorvo, obstáculo, embaraço, empecilho. O Código de Processo Civil a utiliza em várias passagens,

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ora no singular, ora no plural, com significados e finalidades distintos.”3Sandro Marcelo KOZIKOSKI, citando Antonio Carlos SILVA, elenca as diversas conceituações dos termos “embargos” ou “embargo” em nosso sistema processual, demonstrando o caráter multifacetário do vocábulo:

Por influência e desdobramento dos institutos herdados do Direito português primitivo, tem-se que o Direito brasileiro contempla inúmeras significações para o termo “embargos”, das quais Antonio Carlos Silva distingue as seguintes: a) meio pelo qual o devedor se opõe à execução, quer fundada em sentença, quer em título extrajudicial, ou à ação monitória;
b) um meio de o devedor comerciante opor-se ao pedido ou à declaração da falência ou dos credores se oporem ao pedido de concordata (respalda tal conceito o Dec.-lei 7.661, de
21.06.1945, que dispõe sobre a declaração judicial da falência); c) um recurso para atacar o acórdão não unânime proferido em apelação ou em ação rescisória; d) um recurso para atacar a sentença proferida em ações de execução fiscal, de valor igual ou inferior a 50 (cinqüenta) OTN, que, por ser dirigido ao próprio juiz prolator da decisão, é denominado de embargos de alçada (Lei 6.830, de 22.09.1980, art. 34,§ 2º); e) um meio possessório ou de impedir a subtração da coisa, tanto nas execuções, como nos arrestos ou nos seqüestros (embargos

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de terceiro); f) excepcionalmente, um meio de pedir a indenização de benfeitorias, podendo-se ainda, neste caso, dizer que são um meio de impedir a retenção, quando as benfeitorias autorizam (embargos de retenção por benfeitorias, conforme art. 744 do Código de Processo Civil); g) um recurso inter-posto contra despacho, decisão, sentença ou acórdão, visando a seu esclarecimento ou complementação, perante o mesmo juízo prolator de tais atos judiciais.4Na história antiga, não se encontram propriamente as origens dos embargos infringentes dentro da ótica processual vigente, ou seja, envolvendo um instituto que implica na comunhão do voto divergente com um amálgama de recurso e pedido de reconsideração, como bem assevera Marcelo NEGRI ao consignar que:

“note-se que em toda a história da Antigüidade não havia nenhum instituto similar capaz de indicar ao menos um embrião do que viria a ser os embargos infringentes, um misto de pedido de reconsideração com recurso, incluindo pressuposto específico de cabimento, o voto divergente.”5Ao analisar os inúmeros significados do designativo “embargos” no ordenamento jurídico brasileiro, Sandro Marcelo KOZIKOSKI, mais uma vez citando Antonio Carlos Silva, extrai como elemento comum do instituto a presença de um recurso ou de uma forma de impugnação voltada para o mesmo órgão respon-

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sável pelo proferimento da decisão judicial com o intuito de possibilitar a sua reforma e, com isso, acaba por esclarecer as linhas mestras do verdadeiro intuito desse instrumento processual:

Há, no entanto, entre os diversos institutos jurídicos um denominador comum. Com efeito, a locução embargos, em sentido lato sensu, diz respeito à espécie de recursos ou mecanismos de impugnação dirigidos ao mesmo juízo prolator da decisão recorrida. De fato, tal como afirmado por Antonio Carlos Silva, “toda vez que o legislador usa a palavra embargos, ele o faz com o sentido de um instrumento que tem por escopo atacar o ato de uma autoridade, devolvendo a esta a possibilidade de rever a decisão ou de melhor refletir sobre a questão posta à sua apreciação”.6(destaques no original)

A origem e a evolução dos embargos infringentes foram notadamente influenciadas pelas escolas romanas, germânicas e canônicas, apesar da doutrina reconhecer que eles não restaram idea-lizados por elas, tendo sua origem no Direito português, sendo conveniente a reprodução do pensamento de Marcelo NEGRI que abalizadamente cita alguns dos renomados processualistas brasileiros que chegaram após árduo estudo a essas conclusões:

Os estudiosos que se dedicaram à análise da história do Direito lusitano, dentre eles juristas consagrados como...

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