Organização Sindical

AutorJosé Claudio Monteiro de Brito Filho
Ocupação do AutorDoutor em Direito das Relações Sociais pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo
Páginas101-139

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Como afirmamos no primeiro capítulo, no item relativo à divisão do Direito Sindical, esta é, por nós, feita em três aspectos, o primeiro deles relativo à organização sindical.

Dentro dele, além da parte introdutória e da história1, aparecem em destaque a criação, organização e a administração das entidades sindicais. É o que, neste capítulo, será abordado, depois que, no capítulo 3, houve o necessário estudo da liberdade sindical.

Para isto, é preciso observar que, dentro das organizações sindicais, ocorre, naturalmente, um destaque para o sindicato, o que se refletirá nesta obra.

Resta necessário, entretanto, verificar que, na doutrina, é comum a utilização do vocábulo sindicato não só em sentido estrito, que no modelo brasileiro é uma das entidades componentes do sistema, mas, também, em sentido amplo, designando-se, nesta ocasião, o sindicato como sinónimo de toda e qualquer organização sindical.

Impossível fugir a isto, pelo que, em certos momentos, usaremos o vocábulo no primeiro sentido e, em outros, no sentido remanescente. De qualquer sorte, é nossa intenção, sempre que necessário, fazer a distinção, principalmente quando a utilização estiver sendo feita dentro do significado genérico a que aludimos.

Uma segunda observação, antes de passarmos para a análise dos aspectos que compõem este capítulo, ainda se impõe: a que diz respeito à forma como ele está estruturado.

Aproveitando a divisão feita por Octavio Bueno Magano, separamos a análise em dois pontos: estrutura externa e estrutura interna2. Dentro destas duas estruturas serão abordados os aspectos relativos à organização sindical.

4.1. Estrutura externa

A estrutura externa, por dizer respeito ao processo de criação e organização das entidades sindicais, é a primeira que deve ser analisada. Dentro dela, embora

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fosse aparentemente lógico iniciar pelo processo de criação das entidades sindicais, começaremos pela organização.

É que, dentro de modelo rígido como o brasileiro, resulta obrigatório, em primeiro lugar, indicar as organizações sindicais que podem ser criadas, assim como o sistema em que estão inseridas para, depois, dispor como se dá sua criação, bem como a fusão, a incorporação, a extinção e a dissociação.

4.1.1. O sistema confederativo

Já afirmamos, tratando da liberdade sindical, que o Brasil, a partir da Constituição Federal de 1988, passou a adotar sistema sindical híbrido, em que existe liberdade de associação e administração, e restrições à liberdade de organização, de exercício das funções e de filiação e desfiliação.

No tocante à liberdade de organização, afirmamos, ainda, que ela sofre restrições em quatro aspectos: na unicidade sindical, na base territorial mínima, na sindicalização por categoria e na manutenção do sistema confederativo.

Em relação a este último aspecto, a redação do art. 8e é clara, ao dispor:

Art. 8e, IV —a assembleia geral fixará a contribuição que, em se tratando de categoria profissional, será descontada em folha, para custeio do sistema confederativo da repre- sentação sindical respectiva, independentemente da contribuição prevista em lei.

O inciso, embora trate da contribuição confederativa3, deixa patente a manutenção do já existente sistema de representação sindical.

É sobre o sistema confederativo que trataremos agora, verificando como ele está estruturado.

0 sistema confederativo da representação sindical, como concebido e imposto, no Brasil, apresenta estrutura de forma piramidal.

Na base, temos os sindicatos; no centro, as federações e, no ápice, no topo, as confederações.

Obedecida esta forma, é preciso, ainda, respeitar o seu agrupamento, que se dá por critério de homogeneidade, como verificamos no capítulo anterior. Não há, assim, liberdade para a vinculaçao entre as diversas entidades sindicais que compõem a pirâmide.

É que ele se organiza tendo em conta as outras restrições constitucionais existentes à liberdade de organização, ou seja, a unicidade sindical, a base territorial mínima e a sindicalização por categoria, principalmente esta última.

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Desta forma, a estrutura é concebida com base nas atividades e profissões existentes (na última hipótese quando se trata de categorias profissionais diferenciadas), dentro de um encadeamento lógico4

Este sistema, observe-se, como se verifica com Magano, já existe desde a edição do Decreto n. 19.770/31. Diz o autor:

"No que respeita à integração do sindicato com outras entidades, previu expressamente o decreto em tela que três sindicatos pudessem formar uma federação e que cinco federações fossem aptas a constituir Confederação. A lei vigente inverteu essa regra, exigindo cinco sindicatos para formar uma federação e três federações para constituir uma Confederação. No Decreto n. 19.770/31, conquanto não se houvesse estabelecido a forma de integração das entidades sindicais, deixou-se entrever que esta deveria ser a do para-lelismo hierárquico consagrado pela legislação vigente. Isso se infere do § 1e do seu art. 3e, onde se estatuiu: 'para estudo mais amplo e defesa mais eficiente dos seus interesses, é facultado aos sindicatos de profissões idênticas, similares ou conexas, formarem suas federações de classe ...' Não poderia, consequentemente, existir federação formada por sindicatos de profissões não conexas. Assim, os grupos homogéneos de trabalhadores deveriam organizar-se paralelamente com os grupos homogéneos de empregadores. E deveria ser uma organização hierarquizada, porque a confederação se sobrepunha às federações e estas aos sindicatos."5

Ele, pela sua compulsoriedade, revela-se, como já aduzimos, em total descompasso com modelo que esteja baseado na liberdade sindical. Tomando como parâmetro a Convenção n. 87 da OIT, observamos que ela, no art. 5e, prescreve:

As organizações de trabalhadores e de empregadores terão o direito de constituir federações e confederações, e de a elas se filiarem, e toda organização, federação ou confederação terá o direito de se filiar a organizações internacionais de trabalhadores e empregadores.

Este dispositivo deve ser interpretado, claro, dentro do espírito, do sentimento que norteia a Convenção n. 87, ou seja, de que a liberdade sindical é o princípio maior a reger a união de trabalhadores e empregadores e, por isto, toda e qualquer restrição imposta pelo Estado, quer por ato discricionário, quer por disposição contida no ordenamento jurídico, é incompatível com ele, se não for razoável e decorrente do interesse público.

Este entendimento pode ser depreendido das seguintes decisões do Comité de Liberdade Sindical do Conselho de Administração da OIT:

"608. Una organización de trabajadores debe tener derecho a ingresar en Ia federación y confederación de su preferencia, a reserva de Io dispuesto en los estatutos de Ias

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organizaciones interesadas y sin ninguna autorización previa. Las federaciones y confede-raciones mismas decidirán si aceptan o no Ia afiliación de un sindicato, de conformidad com sus propios reglamentos. [...]

612. Una legislación que impida Ia constitución de federaciones y confederaciones en que pudieran unirse los sindicatos o federaciones de diferentes actividades en una misma localidad o región, está en contradicción com el artículo 5 dei Convénio n. 87.

613. Es incompatible com el artículo 5 dei Convénio n. 87 el echo de que pueda exisitir solo una confederación en un país y que el derecho a constituir federaciones quede ne-cesariamente limitado a las federaciones que puedan ser constituídas por los sindicatos enumerados en Ia ley y por los nuevos sindicatos que pudieran ser registrados com el consentimiento dei ministro."6

Não que a liberdade sindical, neste caso, seja a de poder formar e/ou aderir a federações, a confederações e, até, a centrais sindicais. Não, a liberdade é mais do que isto. É poderem trabalhadores, em sentido amplo, e empregadores decidir como será a sua forma de organização sindical, e se haverá, ou não, estrutura que interligue as diversas entidades existentes.

Como afirma Gino Giugni, "Nos sistemas de liberdade sindical, é assegurada a liberdade jurídica de constituir organizações com qualquer orientação ou estrutura"7

É por isto que, dentro destes sistemas, verificamos a criação, em certos casos, de estruturas simplificadas, como se pode afirmar ser a dos Estados Unidos da América, com a existência de sindicatos, em diversos níveis e uma única central, a AFL-CIO8, como, por outro lado, podem existir estruturas complexas, como é o caso da Espa-nha, com mais de uma central (ou sindicatos com amplitude nacional e atuando em todos os ramos e profissões) e diversas unidades menores, algumas com e outras sem personalidade jurídica própria, o que, de fato, só importa aos interessados, que fazem os ajustes necessários ao seu relacionamento com o Estado e com a classe oposta, de acordo com suas necessidades e com sua vontade.

De qualquer forma, concordamos com António Ojeda Avilés que, falando de forma genérica, embora tomando como base o exemplo espanhol, narra o processo de integração que motiva os sindicatos a, primeiro, formar unidades de ação e, depois, paulatinamente, a formar federações, confederações e centrais sindicais, elas também, em certos momentos, formando unidades de ação, tudo como forma de estabelecer melhor controle sobre as ações que precisam ser desenvolvidas e que necessitam de ação conjunta9

É que, acreditamos, a integração é um processo...

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