O que o direito deve esperar do futuro?

AutorMarcello Sgarbi
CargoAdvogado
Páginas258-258
258 REVISTA BONIJURIS I ANO 32 I EDIÇÃO 662 I FEV/MAR 2020
PONTO FINAL
Marcello SgarbiADVOGADO
O QUE O DIREITO DEVE ESPERAR DO FUTURO?
Apergunta tem relevância
e não é nova, mas deve
ser feita a partir de ou-
tra premissa: será que
o direito entende que precisa
mudar? Nesta breve ref‌lexão,
vou pedir escusas e utilizar a
palavra direito como se fosse
um sujeito de direitos. Esta-
mos no século 21, as mudanças
na sociedade estão se mos-
trando a olhos vistos e, mesmo
aqueles que não se dão conta
delas, estão cuidando dos seus
negócios diários de outra ma-
neira. As inovações tecnológi-
cas trouxeram alterações no
comportamento de todos – e
no direito não foi diferente.
Os operadores do direito
hoje atuam de forma distinta
do que se fazia há alguns anos.
Questões de ética prof‌issional,
publicidade e comportamento
de magistrados, procuradores
e advogados são debatidas dia-
riamente e expostas em mídias
sociais (a “grande novidade do
século”), ou seja: o direito pas-
sou a ser parte do cotidiano da
sociedade e não mais somente
dos prof‌issionais da área. Hoje,
como muitos dizem, as pessoas
não conhecem os nomes dos
jogadores da seleção brasileira
de futebol, mas sabem os no-
mes dos integrantes do Supre-
mo Tribunal Federal.
Isto foi dito para af‌irmar
que precisamos ref‌letir sobre o
que será do direito. Será que os
conceitos formatados por anos
de aplicação e estudos de gran-
des doutrinadores do passado
ainda nos servem? Com a reali-
dade que nos cerca (novos mo-
delos de negócios, muitos deles
disruptivos, como Uber, Airb-
nb, criptomoedas), o modelo
teórico atual para a def‌inição
e regulação destas atividades
caducou. Não se trata de sim-
plesmente proibir – pois assim
f‌icaríamos à margem do de-
senvolvimento mundial – mas
também não se trata de fazer
meras adaptações do modelo
teórico atual para as novas tec-
nologias.
O território à frente é novo
e, humildemente, ouso discor-
dar de quem diga o contrário.
A proliferação das instituições
de ensino, em especial de direi-
to, trouxe pouca ou nenhuma
qualidade a este. O modelo
de pensar o direito ainda é do
século 19. É certo que hoje o
fazemos com roupagens tec-
nológicas com o auxílio da
internet, supostas metodolo-
gias ativas no ensino, livros
digitais, processo eletrônico
e outras novidades; mas o ra-
ciocínio conceitual do direito
segue sustentado em bases ul-
trapassadas. Não conseguimos
entender que é hora de mudar
conceitos, não mais fazer atua-
lizações dos antigos. Verdade
que o direito nunca conseguiu
estar em dia com a realidade,
posto que esta é, e sempre foi,
dinâmica. Não ignoro isso. O
que af‌irmo é que as mudanças
hoje são radicais como nun-
ca foram, e o direito está mais
defasado do que nunca. Estes
novos paradigmas afetam o
modo de vida de bilhões de
pessoas. A informação está
acessível como nunca este-
ve, quase em tempo real e de
forma mundial, salvo alguns
poucos recantos politicamente
atrasados do planeta.
Não tenho a solução (seria
pretensão desmensurada af‌ir-
mar isso), mas digo que preci-
samos repensar o direito em
suas bases conceituais. O leigo
questionará: qual a importân-
cia disso? A resposta: o futuro
do planeta. Com isso entendo
que não estamos discutindo
o problema real, realmente
empenhados em mudanças,
pois estas requerem altera-
ções profundas, que irão tirar
todos da zona de conforto, das
suas bases conceituais clássi-
cas. Isso apavora e, mais, fere
o ego dos grandes pensadores
do direito. Pensadores que
dominam o modo de pensar o
direito há tempos, mas sempre
de forma a f‌incar suas bases
no passado. Sim, a única coi-
sa que o direito deve esperar
do futuro é que não pode ser
mais o mesmo nem se basear
exclusivamente nas suas fon-
tes do passado.n
Rev-Bonijuris_662.indb 258 15/01/2020 15:14:48

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