Novo processo civil. Métodos adequa dos de solução de conflitos e o direito do trabalho

AutorLorena de Mello Rezende Colnago/Ben-Hur Silveira Claus
Páginas69-79

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1. Introdução

A matéria objeto deste ensaio decorre da natural e obrigatória aplicação de normas processuais civis ao processo do trabalho, que pretende a partir da CLT orientar a regência processual trabalhista, mas que em histórico rasgo de humildade rendeu-se ao antigo e tradicional processo civil, por dicção expressa do art. 769.

A nova regência civil, ratifica essa relação ao deter-minar em seu art. 15 que na “ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ou administrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva e subsidiariamente”.

A correlação é antiga, mas nem por isto serena. Com esta nova disposição “cruzada” do CPC, ter-se-á novo período de interpretação da extensão da aplicação do processo civil ao processo do trabalho, à vista de termos distintos daqueles referidos na Consolidação.

Historicamente a matéria é conhecida e a relação praticada pelos jus laboralistas. Releve-se contudo ser mais complexo por conta de um enorme número de regras esparsas e que acabam por dividir cenário de incidência, como por exemplo – e obviedade – com a Constituição Federal, a lei de Executivos Fiscais.

Em um volume enorme de regras – verdadeiro cipoal normativo – é absolutamente necessário o manejo adequado das mesmas, identificando o que realmente se aplica e o que não se compatibiliza.

Contemporaneamente, tem sido denominado este estudo de o “diálogo das fontes”, assim intitulado pelo jurista alemão Erik Jaime, da Universidade de Heldelberg, e que vem com maestria abordado e “naturalizado” pela Eminente Profa. Cláudia de Lima Marques, da UFRGS. Em imprópria simplificação, arriscaria dizer que basicamente o que se trata é de garantir – o que no direito pátrio mais vigorosamente se impõe – a não aplicação isolada de leis específicas, mas que, ao contrário, o ordenamento jurídico seja interpretado de uma maneira integrada. Deva esta ser de forma sistemática e coordenada.

Também em alguma medida, refuta Norberto BOBBIO, e seus critérios clássicos de solução para a ocorrência de conflitos normativos, as antinomias jurídicas.

Deve-se sim ter a noção ampla de ordenamento jurídico trabalhista e avançar na aplicação daquelas normas cujas convergências se evidenciam.

E é nesse sentido que tenho buscado compor harmonicamente os prestigiados institutos que compõe os Métodos Extrajudiciais de Solução de Conflitos e o nosso Direito do Trabalho.

Registro ainda que é significativa a mudança de paradigma inaugurada pelo novo CPC (já nem tão novo) que fundamenta-se na cooperação e não mais na adversarialidade, ao expressamente dispor no art. 6º que “todos os sujeitos do processo devem cooperar entre si para que se obtenha, em tempo razoável, decisão de mérito justa e efetiva”.

É de registras a recentíssima obra publicada pela Academia Sul-Rio-Grandense de Direito do Trabalho (ASRDT) que reúne importantes doutrinadores – nacionais e estrangeiros – Instituição esta que se apresenta para ocupar o espaço desejado e devido de formulação científica e suporte à matéria trabalhista, quer substancial, quer adjetiva. Buscando conduzir os patamares de discussão a níveis técnicos elevados, vale-se da Comunidade Acadêmica, notadamente seus Acadêmicos Sul-Rio-Grandenses Titulares, Honorários

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e Correspondentes, bem como alguns membros da Academia Brasileira de Direito do Trabalho (ABDT) para abordar, em sua primeira iniciativa editorial, o tema de maior relevância e atualidade para o Direito Processual do Trabalho.

Com a vigência do Novo Código de Processo Civil, já nem tão novo assim, mas de vigência recente por conta da “vacatio legis” prevista, como dito, voltou-se a discutir a extensão da aplicação do art. 769 da CLT. Objeto de anos de observação e discussão – acadêmica e jurisprudencial – sobre estes limites, a Edição de Novo CPC, retoma de maneira clara o trabalho.

Um novo Código Processual que pretende mudar significativamente a lógica do litígio, para, superando a histórica moção de adversarialidade, propor como princípio norteador a colaboração entre os partícipes. De se registrar aqui que essa nova regência prevista expressamente pelo CPC (arts. 5º e 6º) no sentido da colaboração entre os envolvidos, é, desde sempre, linha mestra nos Métodos Extrajudiciais Adequados de Solução de Conflitos. Estes, aliás, fortemente estimulados e prestigiados no novo Código. O novel Diploma Processual está de parabéns pela iniciativa, a qual contribuirá de maneira decisiva para o estabelecimento de interpretações seguras e adequada estabilidade das decisões judiciais. Além de significativa melhora na pacificação social.

Mesmo sem ser objeto deste texto, sendo que outros textos abordam, não se pode deixar de referir a iniciativa do Tribunal Superior do Trabalho na Edição da Instrução Normativa n. 39 para regulamentar a matéria, mas que, no entanto, “data maxima venia” não parece compor o rol de deveres e atribuições de competência da Corte Superior Trabalhista, com alguma evidência de inconstitucionalidade.

É na observação dos Métodos Alternativos de Solução de Conflitos que centraremos a investigação e formularemos as, ainda provisórias, conclusões.

A realidade do mundo do trabalho e do desemprego enseja essa utilização, como rapidamente observo:

O direito ao trabalho é comum e inato à toda a pessoa humana, pois é por meio dele que o indivíduo extrai o necessário sustento para a subsistência própria e de seu núcleo familiar. Na atual conjuntura social, não se afigura possível negar tal relação de dependência.

Não por outra razão, o art. 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos reconhece que: “toda a pessoa tem direito ao trabalho” e, além disso, “tem direito a uma remuneração justa e satisfatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios de proteção social”.

Ocorre que, não obstante seja intrínseco à pessoa humana, esse direito não tem apresentado correspondentes índices de efetividade.

No segundo trimestre do ano de 2016, o Brasil alcançou a maior taxa de desemprego já registrada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cuja apuração teve início no ano de 2012. No total, são 11,4 milhões de brasileiros que estão desocupados, o que corresponde a 11,2% da população em condições de trabalhar1.

Em abrangência mundial, a Organização Internacional do Trabalho estima que até o final de 2016 haverá 199,4 milhões de pessoas desempregadas2, sendo a significativa desaceleração das economias emergentes uma das suas principais causas.

Tais dados são alarmantes, haja vista que, como sustenta José Claudio Monteiro de Brito Filho, “a falta de trabalho acaba gerando o discurso de que é necessário reduzir as condições de trabalho existentes para acolher os trabalhadores excluídos do mercado, em lógica que somente favorece a concentração de riqueza e o alargamento das desigualdades3.

Aliás de, há muito, tal situação ser objeto de análise pela disciplina histórica do Direito do Trabalho. Durante a Revolução Industrial, a insuficiência de postos de trabalho, em detrimento do excesso de mão de obra disponível no mercado, acarretou aquilo que se convencionou chamar de “questão social”4, cujos principais

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exponentes foram o aviltamento salarial, a imposição de jornadas extenuantes e péssimas condições de trabalho, muitas vezes caracterizado como degradante ao obreiro, com consequências igualmente nefastas à família pela utilização de meias forças (mulheres e crianças) no processo produtivo.

De fato, conforme sustentado pela Organização Internacional do Trabalho, “em um cenário em que o PIB cresce pouco, de maneira não-sustentada e baseado em setores com baixa capacidade de gerar postos de trabalho de qualidade, dificilmente pode se esperar avanços na redução do déficit de trabalho decente”5, o que gera uma gama de conflitos sociais na seara trabalhista.

Os conflitos sociais são inevitáveis na sociedade.

Há muito afastou-se a precária solução pela via da vindita, a conhecida Lei de Talião, o “olho por olho, dente por dente” cujos resultados além de impróprios favoreciam, independentemente de razão ou justiça, aos mais fortes. Ao Estado delegou a sociedade o poder-dever de dizer e realizar o direito, a chamada Jurisdição, “Juris et dictio”.

Salvo em honrosas e especialíssimas condições é admitida a reação privada, cercada de limites como proporcionalidade e premência. O instrumento civilizado daí nascente é o Processo. É por esta via que se deve buscar a solução dos conflitos.

O cenário contemporâneo das relações sociais é complexo e está, permanentemente, em vias de mudança, o que reflete, por óbvio, nos conflitos e em suas soluções.

O Admirável mundo novo nos cerca nesta segunda década do século XXI. É surpreendente o que, por vezes não percebemos, mas é a atual realidade. A evolução dos meios de transporte e de comunicação parecem ter-nos levado a este estado de coisas. Vivemos a era da tecnologia e da velocidade. Para tudo. Comunicamo-nos com inimaginável dinâmica e somos capazes de atingir a qualquer localidade do globo em questão de horas. Assistimos a acontecimentos onde quer que eles aconteçam segundos ou minutos após sua ocorrência, em vivas reproduções filmadas e sonorizadas, muitas vezes ao vivo. O mundo parece pequeno. As redes sociais estão aí para comprovar.

Essa condição que nos cerca, nos faz partícipes desse cenário contemporâneo não como meros expectadores ou testemunhas, mas verdadeiros atores protagonistas.

Ao mesmo tempo perderam-se as referências antes vigentes relativas às grandes nações, aos grandes líderes, às instituições, às tradições...

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