Novas conformações metodológicas em relação à jurimetria: discussão teórica e implicações práticas para a regulação de preços no Brasil

AutorRicardo Medeiros de Castro
CargoMestre em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul, com especializações pela UFRGS e FGV
Páginas57-102
Novas conformações metodológicas em relação à Jurimetria... (p. 57-102) 57
CASTRO, R. M. Novas co nformações met odológicas em r elação à Jurimetri a: discussão teó rica e implicaçõe s práticas para a
regulação d e preços no Br asil.
Revista de Di reito Setorial e Regulatório
, Brasília, v . 1, n. 2, p. 57-1 02, outubro 20 15.
Novas conformações metodológicas em relação à jurimetria : discussão
teórica e implicações práticas para a regulação de preços no Brasil
New Methodological Contours regarding Jurimetrics: Theoretical Discus sion
and Practical Implications to Brazilian Price Regulation
Submetid o(
submitted
): 15/12/2 014
Ricardo Medeiros de Castro*
Parecer(
revised
): 05/01/ 2015
Aceito(
accepted
): 25/08/2 015
Resumo
Propósito
O present e artigo pr etende discutir como métodos quantitativos mel horam a
compreensão de fenômenos jurígenos. Acre dita-se haver p ouca utilização n o Brasil deste
ferramental no âmbito jurídico, o que impede o diagnóst ico de injustiças sociais , restringe
a melhoria das instit uições, dificulta discussões de ônus d e prova e ofusca o debate
regulatório de preços.
Metodologia
Após um debat e teórico sobre o tema, o artigo avança com um est udo
econométrico, utilizando-se de 5 modelos, para verificar se teses e dissertações jurídicas
usam linguagem quantitativa. Também, bu scou-se identi ficar quais impactos o event ual
silêncio quant itativo no direito pode gerar.
Resultados
Nenhuma das 1723 tese s e dissertações de faculdades de direito analisadas
(totalidade da amostra ) apresentou regressões econométr icas. Além disto, verificou-se
correlação negativa, inclusive, entre o u so de termos quantitativos em trabalhos
acadêmicos de direit o. Argumentou -se, assim, neste traba lho que o silêncio econômico-
quantitativo no direito impede uma discussão ampla sobre nor mas que torna riam a
sociedade mel hor, inclusive em aspecto s regulatórios.
Implicações prátic as
O artigo lança luz sobre a necessidad e de fomento de uma age nda
interdisciplinar entre direito e econo metria.
Palavras-chav e: jurimetria, economet ria, direito, regulação e métodos quantitativos .
Abstract
Purpose
This paper discusses how quan titative me thods can be used to improve the
understandi ng of juridical pheno mena. As research hypothesis, this arti cle maintains that
this methodology is not f requently used in Brazilian Law, which, in turn, prevents the
diagnosis of social injust ices, hinders the improvement of institutions, makes it ha rder to
discuss burde n of proof and oversha dows the debate of price regulation.
Methodology
After a rev iew of the literature on the theoretical deb ate about the
subject, this study takes an econometric approach, us ing 5 mod els, to ve rify if Bra zilian
*
Mestre em Relações Internacionais pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul,
com especializ ações pela UFRGS e F GV. Advogado formado pela UFRGS. Atualment e é
Especialista de Políticas Pú blicas e Gestão Governamental, at uante no Sistema Brasileiro
de Defesa da C oncorrência desde 2006. E-mail: castrors@hotmail.com.
58
Novas conformações metodológicas em relação à Jurimetria... (p. 57-102)
CASTRO, R. M. Novas co nformações me todológicas em relação à Jurim etria: discussã o teórica e implica ções práticas pa ra a
regulação d e preços no Br asil.
Revista de Di reito Setorial e Regulatório
, Brasília, v . 1, n. 2, p. 57-1 02, outubro 20 15.
Legal Academic Research uses quant itative langu age. Also, it identifies what woul d be
the impact on society resulted from a quantitative-silence o n Legal Studies.
Findings
None of 1,723 thesis of Legal Acade mic Res earch m ade any Econ ometric
regression.
There was a low level of quantitative discussion in the analyzed sa mple. This
finding is particular ly problematic, especially in Brazil, wh ere quantitative debate is
needed to prevent some u nfair legal standa rds, which i n turn hinders the improvement of
society, even in regulatory aspects.
Practical im plications
The arti cle sheds light on the need to foster an interdisciplinary
agenda betwee n Law and Econometri cs.
Keywords: Jurimetrics, econometrics, law, regulation, quantitative methods
1. Introdução
Um eloquente e retumbante silêncio ou, no máximo, um sussurro: esta
parece ser a forma de diálogo ou quase ausência dele que hoje se verifica
envolvendo a intersecção entre economia, econometria e direito, em especial no
Brasil. Ao menos esta é a hipótese que o presente trabalho busca e mpiricamente
avaliar.
De um lado, parece haver uma dificuldade de comunicação entre as áreas
do conhecimento acima mencionadas, caricaturizada pelas preferências de cada
ramo d o saber em relação à Grécia antiga ou à Roma antiga. Os advogados e
juízes, não poucas vezes, fazem referência ao con hecimento de Sócrates e de
seus discípulos. Todavia, basta que letras gregas seja m colocadas em uma
equação econométrica, para que muitos o peradores do direito acabem por ter
dificuldades no trato da empiria formal e quantitativamente qualificada. Talvez
isto ocorra porque tais matérias quantitativas não fazem parte do currículo do
direito, ou porque matemática tenha um peso baixo no vestibular jurídico, ou
talvez porque a prova da ordem e os demais concursos jurídicos não cobrem
conhecimentos econométricos.
A respeito deste fenômeno, David Scheffman e Mary Cole man (p. 117-
118) explicitam que que aplicadores do d ireito geralmente desconhecem
modelos econômicos e aná lise econométrica, rejeitando, às vezes precoce mente,
grande parte da discussão científica e não apenas econômica , em virtude da
pouca familiaridade com o assunto. Como se verá ao longo deste trabalho, a
preferência acientífica é expressamente confessada por alguns autores que,
ironicamente, são classificado s pela academia jurídica, como autores de
trabalhos jurídico-científicos.
De outro lado, alguns economistas, letrados em numeração, possuem a
tentação de primar por modelos teór icos matemáticos, ainda que em detrimento
da realidade, cuja atitude tautológica dificulta a já frágil interação entre as
Novas conformações metodológicas em relação à Jurimetria... (p. 57-102) 59
CASTRO, R. M. Novas co nformações met odológicas em r elação à Jurimetri a: discussão teó rica e implicaçõe s práticas para a
regulação d e preços no Br asil.
Revista de Di reito Setorial e Regulatório
, Brasília, v . 1, n. 2, p. 57-1 02, outubro 20 15.
academias de direito e economia no Brasil.
1
Os Economistas defendem-se, não
poucas vezes, com o mantra “coeteris paribus(MANKIW, 2003, p. 67), de
origem latina, que significa “tudo o mais co nstante. De outro lado, é, no
mínimo, difícil competir com a grande quantidade de brocardos latinos jurídicos,
que clamam existir no direito uma racionalidade peculiar ratio juris, ou
racionalidade do direito. A racionalidade do direito, argumentam alguns, seria
fundada em discussões ético-normativas, mas cujos ter mos e linguagem,
derivados da Roma antiga, muitas vezes, não correspondem ao vernáculo , enfim,
quid latine dictum sit, altum sonatur, ou seja, “tudo que é dito em latim soa
profundo (CEDERBORG, 2013, p. iii).
Não bastassem as origens culturais distintas, alguns profissionais
entendem que suas respectivas áreas corresponde m a legítimos bastiões de seus
saberes especializados. Kenneth Arrow (1974, p. 16) com autoridade acadêmica
que lhe é devida, refere que o economista, por treinamento, pensa a si mesmo
como quem guarda a racionalidade, como quem atribui a racionalidade a outros
e como quem prescreve a racionalidade ao mundo social”.
1
Com efeito, a Autoridade Antitruste Brasileira o Conselho Ad ministrativo de Defesa
Econômica (C ADE) já se deparou co m casos em que teve que anal isar pareceres
econômicos que alegavam não haver racional idade em uma co nduta colusiva, mesmo
diante de prova s diretas de que houve cartel, conforme Pro cesso A dministrativo
08012.009888 /2003-70, co m os s eguintes repres entados: AGA S.A., Li nde Gases Ltda.,
Air Liquide Brasil Ltda., Air Products Brasil Ltda., Indúst ria Brasileira de G ases Ltda.,
S.A. White Martins, White Ma rtins Ltda, White Martin s Gases Industriais Ltda , Carlos
Alberto Cerezine, Gilberto Gallo, Hélio de Francesch i Junior, José Antônio Bo rtoleto de
Campos, Moac yr de Almeida Netto, Newton de Oliveira, Vitor de Andrade Pere z e
Walter Pilão. De acordo com o Voto do Conselheiro Furlan “Alegaçõe s fulcrad as em
projeções de cená rios econômicos po ssíveis e embasadas em estudos eco nométricos
derivados a partir de um fato predefinido têm for ça reduzida quando confrontadas com as
evidências dos autos. Há ev idências diretas de conluio. Há regr as regulando as interações
do cartel. Há acertos explícitos para clientes. Há até mesmo contas correntes nas sedes de
cada empresa para a apuração e divisão de ganhos do acor do ilícito. E, em f ace de to da
essa miríade de provas, surgem pa receres afirmando que o mercado não tem con dições de
suportar u m cartel e que não há evidências de comportamento colusivo. Não h á nenhuma
interpretação v erossímil que a utorize admi tir tais ar gumentos em f ace do ace rvo
probatório dos autos. Empresas e exec utivos não passam anos escrevendo, armazenand o e
trocando entre si documentos comprov ando uma pr ática ilícita que não exec utam. Não é
possível conceber que vári as e mpresas se reunissem para definir regras de um cartel
apenas por esporte. (...). No caso e m tela, o s pareceristas contratados já iniciara m o seu
trabalho na po sse de evidências concretas de colusão . E, ainda assim, tentara m ignorar
essas evidências para afirmar que, na verda de, não existiram os contatos que foram
documentados nos autos. E, com base nessa dissociação da realidade, tentaram apor a
conclusão inex plicável que não existiria cartel no setor.”

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT