A nova Babilônia

AutorJosé Roberto Fernandes Castilho
Páginas180-196
José Roberto Fernandes Castilho
180
[ I ]
A nova Babilônia”
Se as lhas do povo devem ser servidas
como delicados manjares no banquete
do vício, para saciarem as paixões dos
ricos, permiti-lhes ao menos que cheguem
à idade em que possam compreender a
natureza do sacrifício que se lhes pede.
W.T. Steade
1 Apresentação
Zacharias d’Aça, ou melhor, Francisco Zacarias de Araújo da
Costa Aça (1839-1908) foi um professor, tradutor do inglês e obs-
curo escritor português, membro da Academia Real de Belas-Artes
A cidade entre o direito e a história
181
e amigo de Alexandre Herculano e Antonio Feliciano de Castilho.
Notabilizou-se antes por ser um exímio caçador. Deixou obra vo-
lumosa, na qual, além de artigos de jornal, incluem-se títulos como
Caçadas Portuguesas (1899) e Lisboa Moderna (1906). Porém não é
tanto isso que interessa aqui.
O que interessa aqui é o impactante registro histórico que faz
Aça acerca de Londres, na segunda metade do século XIX, como in-
trodução ao texto de W. T. Steade publicado no Pall Mall Gazette e
que teve larga circulação. É a Londres diurna (do trabalho) e, sobre-
tudo, a noturna (do vício) que é descrita no momento então presen-
te, como ca evidente na sucessão de “hojes” no texto. O famoso e re-
volucionário jornal inglês Pall Mall Gazette – que começou a circular
em 1865, denunciando causas sociais – publicara, em 1865, um dos-
siê acerca da prostituição em Londres e, no ano seguinte, o texto foi
traduzido em Portugal e saiu em livro, com a longa análise prévia de
Zacarias d’Aça. O texto irá muito além do fato da prostituição para,
tal como uma reportagem, informar aos leitores aquilo que acontecia
em Londres – os seus “escândalos” de várias ordens, até estatísticos.
Aquele inovador jornal tirou seu nome de uma rua chique e
elegante do centro de Londres126, onde se localizavam diversas lojas
ou “magazines” e também a sede de diversos clubes privados da elite
– e monossexuais. “Instituição retintamente inglesa, Manoel de Sou-
sa Pinto chama o “club” de “forma elegante de solidariedade” (Fe-
minário, 1911). Dentre outros nomes, Engels, Bernard Shaw, Oscar
Wilde, escreveram para o vespertino. Lembre-se ainda que pouco
antes este jornal, em 1883, reproduziu o paneto do pastor Andrew
Mearns a respeito das condições de moradia dos pobres londrinos
– “e Bitter Cry of Outcast London” –, o que contribuiu para o for-
talecimento da legislação de proteção social, de 1885 (“Housing of
126Pall Mall” constitui, no caso, nome próprio e designa um centro comercial. Ao
pé da letra, entretanto, o termo designa algo como “loja de tecidos nos” (“pall”).

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