A gênese jurídica do patrimônio cultural na constituinte de 1987/88

AutorYussef Daibert Salomão de Campos
CargoDoutorando em História (Universidade Federal de Juiz de Fora) e Mestre em Memória Social e Patrimônio Cultural pela Universidade Federal de Pelotas-RS
Páginas1-8
1
A GÊNESE JURÍDICA DO PATRIMÔNIO CULTURAL NA CONSTITUINTE DE 1987/88
THE LEGAL GENESIS OF THE CULTURAL HERITAGE IN CONSTITUENT ASSEMBLY IN 1987/88
Yussef Daibert Salomão de Campos1
Resumo: Abordar o patrimônio cultural como objeto de pes quisas científicas está longe de ser algo inovador. Mas o tema se apresenta
inesgotável e infinito, pois s ua multidisciplinaridade e as diversas facetas apresentadas na sua apr opriação pelas mais diferentes for mas de
políticas públicas mostram que , a cada dia, um novo olhar p ode ser lançado sobre o referido objeto. O que se pretende co m este trabalho não
é chegar a conclusões definitivas, nem tampouco de monstrar um ponto final nas discussões da gênese e genealogia do patrimônio no Brasil.
Pretende-se, sim, levantar proble mas que possam suscitar refle xões: como se confeccionou o a rtigo 216 da Constituição de 1988, que define
o conceito de patrimônio cultural brasileiro? Por que apresentar o registro, ao lado do to mbamento e outros, co mo instrumento jurídico de
salvaguarda do patrimônio cultural? Quais foram os agentes, políticos e sociais, e nvolvidos no debate? Quais vozes foram ouvidas e quais
foram olvidadas, nesse campo de conflitos e embates? Adianta-se um ponto crucial: esse trabalho, cujo objeto é tema de estudo do autor no
doutorado em História (UFJF), não apresenta resultados, pois es ses ainda não foram atingidos, mas os proble mas que o levaram a ingressar
nesse programa de pós-graduação.
Palavras-chave: patrimônio cultural, C onstituinte de 1987/88, agentes políticos e sociais.
Abstract: Addressing the cultural heritage as an object of scientific research is far from be ing innovative. But t he issue presents itself
inexhaustible and infinite, because its multidisciplinary approac h and the various facets presented in its appropriation by different for ms of
public policies show that every day a new look can be lau nched on that object. The intention with this work is not to reach definitive
conclusions, nor to de monstrate an end to discuss ions of the genesis and genealogy of the heritage in Brazil. It is intended rather to raise
issues that might give rise to reflectio ns, as if fashioned to Article 216 of the 1988 Constitution, which def ines the co ncept of Brazilian
cultural heritage? Why submitting t he registration, building under governmental trust, a nd beside the other, as a legal i nstrument to safeguard
the cultural heritage? What were the a gents, political and social, involved in the debate? Whic h voices were heard and they were forgotten, i n
this field of conflicts a nd disputes? Advance is a crucial p oint: this work, whose object is the subject of study in the author's Ph.D. in history
(UFJF), will not present results, because these have not yet been achieved, but the prob lems that led him to join this program.
Keywords: cultural heritage, Constitue nt assembly in 1987/88, political and social agents.
Considerações iniciais
1 Patrimônio e Constituição
A Constituição brasileira de 1988 é um marco jurídico e político da recente história nacio nal. Conhecida
como a “Constituição Cidadã”, a Carta Polí tica de 1988 nasceu em um momento em que o país se desvencilhou
de mais de duas décadas de do minação autoritária, instituída pelo golpe militar de 1964, passando a sonhar com
dias iluminados pelos faróis da democracia. Mas o processo de desenvolvimento e criação da no va carta magna
brasileira não foi simples e sumário: arrolou-se durante quase dois anos de debates, disputas e conflitos políticos
na elaboração das novas diretrizes constitucionais. Diversos temas foram discutidos d e forma exaustiva, como a
forma de inserção dos direitos e garantias fundamentais do cidadão e da inclusão de novos instrumentos jurídicos
de proteção de bens difusos e coletivos. Entre esses temas destaca-se o patrimônio cultural e a forma elástica
com a qual a lei maior buscou tratá-lo, introduzindo inovações jurídicas (como o registro do patrimônio cultural
imaterial) ao lado de formas tradicionais de preservação (tombamento do patrimônio material).
Todavia, indagamos: quais foram os atores, sociais e polí ticos, envol vidos no processo de elaboração das
determinações constitucionais de preservação do patrimônio cultural? Quais os movimentos sociais foram
marcantes nesse momento constituinte, nos anos de 1987 e 1988? Como se efetivou a preservação do patrimônio
cultural i material como novidade jurídica no Brasil? De onde nasceram as reivindicações de tutela dos sítios
remanescentes de quilombos? Qual a intenção de enumeração de instrumentos jurídicos de preservação previstos
no § 1º do artigo 216 (inventários, re gis tros, vigilância, tombamento e desapropriação)? Com a aplicação e
efetivação do artigo constitucional citado, outros valores da Carta P olítica serão efetivados (cidadania e a
dignidade da pessoa humana; redução das desigualdades sociais; o direito de qualquer cidadão de propor ação
popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público)? Será qu e a lei, em sentido a mplo, pode funcionar
como um instrumento de criação e manutenção de identidades sociais?
Vale apontar que o processo constituinte “foi palco de grandes conflitos de interesse e de opinião que
haviam permanecido latentes, irresolutos ou agravados, durante os anos da repressão”.2 Nesse palco se
enfrentaram p rogressistas, marcados por segmentos da resistência de mocrática ao regime ditatorial, e
conservadores, representados por expressões que apoiaram o golpe militar de 1964.3
1 Doutorando em História (Universidade Federal de Juiz de Fora) e Mestre em Me mória Social e Patrimônio Cultural pela Universidade
Federal de Pelotas -RS. Graduado em Dire ito e especialista em Gestão do Patrimônio Cultural (Jui z de Fora-MG). Atuou como colaborador
da ONG UNESCO Etxea Centro UNESCO del País Vasco, España, Programa Cultura para el Desarrollo. É pesquis ador do LAPA
(Laboratório de Patrimônios Culturais/UFJF). E-mail: yussefcampos@yahoo.com.br.
2 PILATTI, Adriano. A Constituinte de 1987-1988: progressistas, conservadores, orde m econômica e regras do jogo. Rio de Janeiro: Lumen
Juris. 2008, p. 01.
3 Idem, Ibidem.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT