Nietzsche e a democracia

AutorEmerson Ademir Borges de Oliveira
CargoPós-Doutorado em Democracia e Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra. Professor Assistente Doutor nos cursos de Graduação, Especialização, Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade de Marília. Coordenador da Pós-Graduação Lato Sensu e Coordenador-Adjunto do Programa de Mestrado e Doutorado da Universidade de...
Páginas47-65
Rev. direitos fundam. democ., v. 24, n. 1, p. 47-65, jan./abr. 2019.
DOI: 10.25192/issn.1982-0496.rdfd.v24i11102
ISSN 1982-0496
Licenciado sob uma Licença Creative Commons
NIETZSCHE E A DEMOCRACIA
NIETZSCHE AND THE DEMOCRACY
Emerson Ademir Borges de Oliveira
Pós-Doutorado em Democracia e Direitos Humanos pela Faculdade de Direito da
Universidade de Coimbra. Professor Assistente Doutor nos cursos de Graduação,
Especialização, Mestrado e Doutorado em Direito da Universidade de Marília.
Coordenador da Pós-Graduação Lato Sensu e Coordenador-Adjunto do Programa de
Mestrado e Doutorado da Universidade de Marília. Advogado e parecerista. Mestre e
Doutor em Direito Constitucional pela Universidade de São Paulo.
Resumo
Por muito tempo, fruto da filosofia antiga e, de certa forma, também
da renascentista, a democracia foi erigida a um modelo de “ídolo”, um
regime perfeito que deveria ser seguido pelos modelos reais. Basta
lembrar como Rousseau a chamava de “governo dos deuses”. O
trabalho de Nietzsche, nessa seara, rompeu com a ideia dos ídolos,
dentre eles a democracia, identificando como quimera a crença em
tais tradições ou modelos perfeitos. Embora seu trabalho tenha sido
de excelente grado nesse tocante, é certo que Nietzsche é um
desconstrutivista. Por essa razão, cabe-nos analisar a questão da
idolatria democrática e, com base na genealogia nietzschiana, tentar
propor o debate acerca de um “modelo” realizável de democracia.
Nas atuais circunstâncias institucionais, a identificação de um modelo
de democracia que apresenta graves falhas e ranhuras é
imprescindível para saber até que ponto se busca atingir um modelo
democrático, ou se a busca, na verdade, representa uma ilusão
vivenciada em pleno seio da democracia. O objetivo deste trabalho,
para além da desconstrução de Nietzsche, foi instigar o debate
acerca da configuração da democracia que desejamos vivenciar,
considerados o lugar e o momento histórico. A pesquisa é
eminentemente bibliográfica e o método indutivo.
Palavras-chave: Democracia. Ídolos. Modelos realistas.
Abstract
For a long time, as a result of ancient and, in a way, Renaissance
philosophy, democracy was erected into a model of "idol", a perfect
regime that should be followed by real models. Just remember how
Rousseau called it the "government of the gods." Nietzsche's work, in
this area, broke with the idea of idols, among them democracy,
EMERSON ADEMIR BORGES DE OLIVEIRA
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Revista de Direitos Fundamentais & Democracia, Curitiba, v. 24, n. 1, p. 47-65, jan/abr, de 2019.
identifying as chimera the belief in such traditions or perfect models.
Although his work has been excellent in this respect, it is certain that
Nietzsche is a deconstructivist. For this reason, we must analyze the
question of democratic idolatry and, based on the nietzschean
genealogy, and try to propose the debate about an achievable
"model" of democracy. In the current institutional circumstances, the
identification of a model of democracy with serious flaws and grooves
is essential to know the extent to which a democratic model is sought,
or whether the search, in fact, represents an illusion experienced in
the midst of democracy. The aim of this work, besides the
deconstruction of Nietzsche, was to instigate the debate about the
configuration of democracy that we hope to experience, considered
the place and the historical moment. The research is eminently
bibliographic and the inductive method.
Key-words: Democracy. Idols. Realistic models.
1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A democracia foi construída enquanto expressão extremamente relativizada,
admitindo-se regimes tão distintos no interior do seu conceito, a partir da combinação
dos seus diversos elementos. A propósito, basta lembrar o conceito que lhe dera o
Tribunal Constitucional Alemão, em decisão de 23 de outubro de 1952: “a ordem
democrática corresponde àquela de um Estado de Direito, fundado sobre a
autodeterminação do povo, de acordo com a vontade da maioria, sobre a liberdade e a
igualdade, excluído todo o poder violento e arbitrário” (CAGGIANO, 2011. p.9).
A partir de então, visualizando os problemas que enfrentavam os regimes
democráticos, ergueram-se teorias acerca das quais a democracia, em si, estaria
calcada num plano ideal, servindo como espelho para as democracias práticas. Assim,
em abstrato, a democracia, ainda que irrealizável, funcionaria como objetivo para os
regimes democráticos.
Ocorre que, diante das dificuldades e das variáveis que apontamos, não é
possível, sequer em abstrato ou teoricamente, desenhar os contornos de uma suposta
democracia ideal, a servir de base para os regimes reais. Toda análise democrática é
permeada pela subjetividade, pela historicidade e pelo contexto geopolítico. E,
inexistindo no plano ideal, não pode servir de base a qualquer desenvolvimento
democrático.
O objetivo deste trabalho é inverter esse pressuposto que elenca a democracia
a um nível de idealização, a partir das ideias de Nietzsche, para romper com tal
perspectiva e admitir que, a despeito dos modelos e conceitos sobre a democracia,
esta somente se desenha na prática, a partir da análise de alguns elementos sobre os
quais exista um certo consenso de existência, mas não de nível qualitativo.

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