Transgênicos e sociedade na agenda das pesquisas acadêmicas brasileiras

AutorMaria Cristina Piumbato Innocentini Hayashi - Camila Carneiro Dias Rigolin - Carlos Roberto Massao Hayashi
CargoProfessora Associada do Departamento de Ciência da Informação e do Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos (DCI/PPGCTS/UFSCAR). Doutora e Mestre em Educação (UFSCar). Coordenadora do Laboratório de Estudos Sociais em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos ...
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Política & Sociedade - Florianópolis - Volume 11 - Nº 20 - abril de 2012
Dossiê
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Transgênicos e sociedade na agenda
das pesquisas acadêmicas brasileiras
Maria Cristina Piumbato Innocentini Hayashi1
Camila Carneiro Dias Rigolin2
Carlos Roberto Massao Hayashi3
Resumo
O tema dos transgênicos e de seus impactos tem suscitado debates calorosos
na sociedade e no meio científico e acadêmico. A agenda das pesquisas
acadêmicas sobre este tema tem sido incrementada com a discussão de
questões desde a regulação do risco, a relação entre expertise e decisão
política até a participação social em escolhas científicas e tecnológicas.
Com o intuito de situar o estado do conhecimento destas pesquisas foi
realizado um estudo bibliométrico da produção científica acadêmica
depositada no Banco de Teses da CAPES/MEC. Os indicadores de produção
científica sobre a temática revelaram as marcantes presenças das áreas do
Direito, do Desenvolvimento (Rural, Sustentável, Regional, entre outros) e
da Comunicação; a incorporação da Sociologia, das Ciências Ambientais e da
Economia; a presença ainda tímida de outras áreas de conhecimento, como
a Saúde e a Política Científica e Tecnológica, ao lado da inclusão de outras
perspectivas, como a Ciência da Informação, e as Ciências da Religião.
Palavras-chave: transgênicos, produção científica, análise bibliométrica.
1 Professora Associada do Departamento de Ciência da Informação e do Programa de
Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São
Carlos (DCI/PPGCTS/UFSCAR). Doutora e Mestre em Educação (UFSCar). Coordenadora
do Laboratório de Estudos Sociais em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade
Federal de São Carlos. dmch@ufscar.br.
2 Professora Adjunta do Departamento de Ciência da Informação e do Programa de Pós-Gr a-
duação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos (DCI/
PPGCTS/UFSCAR). Doutora em Política Científica e Tecnológica (UNICAMP, 2009), com
doutorado-sanduíche no Departamento de Antropologia da Indiana University, EUA.
Mestre em Administração e Bacharel em Administração (UFBA). Pesquisadora do Labo-
ratório de Estudos Sociais em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal
de São Carlos. diasrigolin@ufscar.br.
3 Professor Adjunto do Departamento de Ciência da Informação e do Programa de Pós-Gradua-
ção em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos (DCI/PPGCTS/
UFSCAR). Mestre e Doutor em Educação (UFSCar). Pesquisador do Laboratório de Estudos
Sociais de Ciência e Tecnologia Universidade Federal de São Carlos. massao@ufscar.br.
http://dx.doi.org/10.5007/21757984.2012v11n20p99
Política & Sociedade - Florianópolis - Volume 11 - Nº 20 - abril de 2012
Transgênicos e sociedade na agenda das pesquisas acadêmicas brasileiras
Maria Cristina P. I. Hayashi  Camila C.Dias Rigolin  Carlos Roberto Massao Hayashi
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1. O debate sobre transgênicos e seus impactos na
sociedade
Os aspectos positivos e negativos da biotecnologia estão presen-
tes nas discussões em torno dos organismos geneticamente
modificados (OGMs) ou transgênicos4 e a trajetória de construção
do ambiente institucional para regulação da produção e circulação
dos OGMs é ilustrativa das controvérsias associadas à criação de
novas instâncias de governança para tecnologias emergentes.
No plano internacional, os debates sobre a liberação comer-
cial dos OGMs intensificaram-se em função da polarização das dis-
putas comerciais entre os Estados Unidos e a União Europeia (UE).
Enquanto os EUA adotaram uma política de desregulamentação de
produtos transgênicos, a UE criou mecanismos reguladores que
restringiram a sua adoção nos últimos anos. Os principais argu-
mentos que balizam essa disputa comercial baseiam-se na afirma-
ção e na contestação recíproca dos critérios de cientificidade ado-
tados pelos EUA, através do Princípio de Equivalência Substancial,
e daqueles adotados pela UE, através do Princípio da Precaução.
O Princípio de Equivalência Substancial considera que os
OGMs são quimicamente equivalentes aos organismos obtidos
através de técnicas convencionais de melhoramento genético,
não requerendo estudos toxicológicos adicionais. O Princípio
da Precaução considera, por sua vez, que a adoção de uma nova
tecnologia ou produto deve ser adiada enquanto não houver evi-
dências suficientes de sua inocuidade. Presente nos documentos
da Eco-92, Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente
e Desenvolvimento sediada no Rio de Janeiro, e no Protocolo de
Cartagena sobre Biossegurança (PCB) em vigor desde 2003, este
princípio afirma que, na ausência da certeza científica formal sobre
a segurança de determinados produtos e processos desenvolvidos
4 A Lei de Biossegurança (Lei n. 11.105 de 2005) define organismo genetica-
mente modificado (OGM) como o organismo cujo material genético (ADN/
ARN) tenha sido modificado por qualquer técnica de engenharia genética.
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em ciência e tecnologia, é requerida a implementação de medidas
que possam avaliar e prever seus potenciais riscos.
No Brasil, as decisões sobre os OGMs são tomadas no âmbi-
to da Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio). Sua
criação deu-se no âmbito da Lei 8.974, publicada em janeiro de
1995, que estabeleceu normas para uso de técnicas de engenharia
genética e liberação no meio ambiente de organismos genetica-
mente modificados. A referida comissão foi concebida como um
colegiado multidisciplinar, formado em maior proporção por espe-
cialistas, além de representantes de ministérios e de organizações
sociais. Suas principais atribuições estão relacionadas às emissões
de pareceres técnicos sobre biossegurança, meio ambiente e saú-
de. Trata-se, portanto, de uma comissão de experts cuja responsa-
bilidade extrapola a análise de risco, relacionando-se ao assessora-
mento para a formulação, atualização e implementação da política
nacional de biossegurança.
Desde sua constituição, muitas das deliberações realizadas
no âmbito das reuniões da CTNBio foram alvo de controvérsias,
dentro e fora da comissão. A contestação da autoridade da CTN-
Bio expôs, em episódios sucessivos, a complexidade do processo de
construção das instâncias de governança para tecnologias de risco,
a exemplo dos OGMs. No Brasil, este debate se processou em várias
arenas, desde a jurídica até a legislativa, bem como na esfera do po-
der executivo, com um lado a favor e outro contra. O interessante é
que ambos os lados, como tem mostrado Guivant (2002), valeram-se
da ciência como instrumento legitimador de seus discursos, cha-
mando a atenção para a incapacidade (ou a indisponibilidade) dos
atores contrários em questionar a abordagem positivista do conhe-
cimento científico. Deste modo, ambas as coalizões classificavam
os argumentos dos adversários como “ideológicos”, enquanto rei-
vindicavam o status de cientificidade para suas proposições. Um dos
corolários desta postura é que a discussão da construção de arran-
jos participativos que incluíssem a sociedade civil organizada neste
processo decisório foi enfraquecida e careceu de problematização.
Nesse contexto, é válido mencionar o estudo de Guivant
(2006) que realizou análise comparativa das pesquisas desenvol-
vidas no Brasil, na Europa, na Ásia e nos Estados Unidos sobre as

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