Nascimento e desenvolvimento de um processo arbitral

AutorAntonio Sodré
Páginas27-38

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O nascimento de um processo arbitral pode se dar basicamente por duas maneiras, mas sempre partindo da vontade de ambas as partes. A maneira mais comum é quando um contrato contenha a chamada “cláusula compromissória” ou “cláusula arbitral”, ou seja, quando as partes, ao firmarem o contrato, se comprometeram a levar eventuais divergências ao juízo arbitral, afastando a Justiça comum.

A cláusula compromissória é aquela cláusula que substitui a cláusula de eleição do foro e também é conhecida por convenção de arbitragem. Na verdade, mesmo que o contrato tenha a cláusula compromissória, com a concordância das partes em levar as eventuais divergências à arbitragem, é importante que também se eleja o foro para, eventualmente, executar a sentença arbitral ou, subsidiariamente, complementar procedimentos que necessitem de coerção (medidas acautelatórias).

Hoje em dia, é muito comum a inclusão de cláusulas compromissórias nos contratos, inclusive nos contratos sociais das empresas. Para se ter uma idéia, no mercado de capitais, a empresa que queira participar do chamado Novo Mercado, ou seja, da etapa mais alta na hierarquia da Bolsa de Valores, terá que, obrigatoriamente, prever em seus estatutos sociais que os conflitos entre acionistas e a empresa ou entre os acionistas entre si a respeito da empresa serão solucionados por meio de arbitragem.

A cláusula compromissória pode ser simples, também chamada vazia, ou cheia, também chamada detalhada. Isto quer dizer que a vontade das partes de levarem eventuais divergências para o processo arbitral pode estar expressa por uma simples frase que preveja a solução de conflitos decorrentes daquele contrato por meio da arbitragem, citando-se, por exemplo, a lei de arbitragem. Por outro lado, esta manifestação de vontade pode estar expressa por uma cláusula bem detalhada, contendo, exemplificadamente, além da simples opção pelo sistema arbitral, a indicação da Câmara de Arbitragem que conduzirá o

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procedimento, com observância do seu respectivo regulamento; a previsão de regras para a escolha dos árbitros, podendo, inclusive, pré-estabelecer os nomes dos próprios árbitros; de prazos para a prolação da sentença; o local e o idioma da arbitragem; se a decisão será baseada apenas no direito ou se poderá ser usada a eqüidade, etc.

A nossa prática indica que a cláusula cheia é a mais vantajosa, pois ela reduz áreas de atrito na instalação da arbitragem.

Outra forma de se iniciar uma arbitragem é por meio da celebração do compromisso arbitral, mesmo que a divergência já seja objeto de uma ação judicial em curso e mesmo que o contrato preveja o uso da Justiça comum.

A celebração do compromisso arbitral pode ocorrer por meio dos advogados das partes - desde que tenham mandatos para tanto -, seja por instrumento particular com a presença de duas testemunhas, seja por escritura pública. Em seguida, deve-se comunicar ao juiz do processo judicial a decisão comum das partes, bem como a desistência de ambas do processo.

É importante que o compromisso arbitral contenha a qualificação completa e o endereço das partes e dos árbitros. Se houver a eleição de uma Câmara de Arbitragem, seus respectivos regulamentos deverão ser observados pelas partes, inclusive no que tange aos custos e aos honorários dos árbitros. Entretanto, as partes podem optar por realizar a arbitragem sem eleger uma Câmara para conduzi-la. Neste caso, deve-se definir os valores que serão pagos a título de honorários dos árbitros.

Um ponto de suma importância que o compromisso arbitral deve definir com clareza é a controvérsia existente entre as partes e as pretensões de cada uma.

Deve-se também incluir no compromisso arbitral o local onde irá ser processada a arbitragem, o idioma que será utilizado (principalmente nos casos de arbitragem internacional), se os árbitros irão decidir apenas com base na lei ou se poderão basear-se na eqüidade, quem arcará com a sucumbência, ou seja, as custas da arbitragem e os honorários advocatícios.

Todas as Câmaras que conhecemos e onde já atuamos têm a sua tabela de custas pré-definida e não dão início ao processo sem um depósito prévio. É o mesmo princípio da Justiça Comum, na qual é preciso recolher as custas iniciais para se protocolizar a petição inicial.

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Quanto ao processo judicial que já fora iniciado, uma vez pagas as custas, o juiz encerrará o feito. Neste meio tempo, o processo arbitral já estará em curso.

2.1. Câmaras arbitrais

Quando as partes convencionam que eventuais divergências do que contrataram serão dirimidas por arbitragem, podem, também, determinar qual o procedimento ou determinar que o procedimento obedecerá às regras de uma determinada Câmara de Arbitragem.

A questão da Câmara de Arbitragem ou do órgão em que se processará a arbitragem pode se resumir no seguinte: a Lei de Arbitragem não obriga que a arbitragem seja processada perante este ou aquele órgão (art. 21, da Lei n°
9.307/96).

Assim, a cláusula arbitral pode ou não indicar a Câmara que conduzirá a arbitragem. Isso quer dizer que, caso não haja definição, as partes podem escolher a seu livre arbítrio se irão se utilizar dos serviços de uma Câmara organizada ou não. Neste último caso, que pessoalmente não aconselho, os árbitros irão organizar os serviços de secretaria e ficarão responsáveis pelo serviço de apoio, tais como: digitação, cópias, intimações, arquivos, etc. Tais custos são inevitáveis e, em uma Câmara organizada, eles podem ser menores. Apenas arbitragens mais simples devem ser conduzidas fora de uma entidade especializada.

Por questões práticas, surgiram no Brasil, nos últimos anos, alguns órgãos que prestam este serviço, o que facilita em muito os trabalhos de secretaria de um processo arbitral. O importante é observar a seriedade e a qualidade dos serviços.

Se as partes optarem por eleger uma Câmara de Arbitragem, estas devem verificar, além da seriedade e idoneidade da mesma, seu regulamento e seus custos antes. Tivemos que recorrer ao Poder Judiciário uma única vez, na tentativa de compelir a outra...

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