Entre os muros da escola: um estudo sobre o bullying

AutorAmara Pricilia de Souza Marques
Páginas465-493

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Apresentação

O estudo objetiva colocar em discussão o tema bullying, analisando sua origem, seu conceito, suas causas e suas consequências no ambiente escolar, visto que este fenômeno teve grande crescimento nos últimos anos e trouxe graves impactos psicológicos, emocionais, sociais e cognitivos na vida dos indivíduos envolvidos nessa problemática. Como metodologia abordada, utilizou-se a análise de referências teóricas de especialistas que abordam esta temática, como também as legislações. Acredita-se que a conscientização, divulgação e sensibilização sobre o tema no ambiente escolar, assim como na sociedade, levará a minimização da prática desse tipo de violência. Entretanto, questiona-se a falta de políticas públicas que dão suporte aos profissionais da Educação, sobretudo o suporte o psicopedagogo.

1 Introdução

O presente estudo tem por finalidade retratar a origem do fenômeno bullying e a sua propagação, em especial no Brasil, suas causas, consequências e estatísticas dentro do ambiente escolar, o qual expõe questões preocupantes, como a falta de conhecimento entre os docentes e profissionais da educação, ou mesmo a naturalização desse tipo de violência dentro dos muros escolares.

As fontes utilizadas para referenciar esse estudo foram à análise de obras de autores especialistas no assunto, como a pedagoga e antropóloga

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Cléo Fante1e o escritor Lélio Braga Calhau2, que discorrem o tema de forma mais aprofundada, trazendo informações e reflexões que permitem entender melhor o fenômeno bullying, sua origem, as formas de práticas; análise das características dos envolvidos nesse processo; as consequências e causas desse fenômeno na vida do indivíduo; e, por fim, uma orientação sobre a responsabilidade da escola e dos profissionais da educação sobre o seu papel na luta contra esse tipo de violência.

A psicóloga Vanessa Ribeiro3, especialista em Direcionamento nos Aspectos Psicossociais nas Situações de Emergência e Catástrofes, e o médico hebiatra Dr. Maurício de Souza Lima, especialista em Adolescência, apresentam algumas informações sobre o assunto, contribuindo, ainda mais, para o enriquecimento da pesquisa e do presente estudo, questões sobre o comportamento do agressor no contexto do bullying e as características que, muitas das vezes, passam despercebidos pelas pessoas do seu grupo de convivência.

Outra fonte de embasamento teórico são os estudos do Sociólogo e Educador, Pierre Bourdieu4sobre a desigualdade social e a violência simbólica, os quais demonstram que os fatores socioculturais geram conflitos e ações discriminatórias entre os indivíduos numa relação desigual, onde a própria instituição escolar se torna, muitas vezes, a propagadora dessas ações contribuindo assim, para a reprodução da violência em questão.

Por conseguinte, o objetivo deste trabalho é possibilitar que haja informação e conhecimento sobre o fenômeno bullying nos ambientes escolares,

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a fim de que tais práticas sejam detectadas, trabalhadas e erradicadas por meio de propostas advindas de salas de discussões, campanhas de prevenções e outras ações visando o bem-estar do individuo, sua liberdade e a garantia de sua dignidade humana.

Tornou-se frequente a mídia abordar reportagens sobre bullying e as consequências graves que refletem tanto na vida das vítimas desse tipo de violência quanto em todos aqueles que os cercam. Entre essas reportagens, podemos citar o ocorrido em uma escola Municipal de Realengo, na cidade do Rio de Janeiro no ano de 2011, quando um jovem, sem motivo aparente ou que justificasse tal atrocidade, entrou na escola fortemente armado e projetou disparos contra alunos e professores presentes ali. Foi 11 vítimas no total, inclusive o autor do crime que se suicidou. Conforme investigações da polícia e depoimentos de ex-colegas de classe do criminoso, ele, antes de pôr em prática sua crueldade, deixou uma carta dizendo o "motivo" que o estava levando a executar o crime. Na época em que era estudante nessa mesma escola, ele teria sido vítima de bullying e sofrido as agressões por colegas de sala.

Tal episódio remete a reflexão do quão grave e devastador podem ser as marcas que a vítima desse mal carrega. As vítimas de bullying, sem exceção, necessitarão de apoio psiquiátrico e/ou psicológico para a superação do problema, pois os transtornos emocionais que surgirão diante das agressões sofridas podem agravar-se consideravelmente, transformando-se em casos permanentes, se não, fatais.

2 Bullying

Segundo Marques e Draper5, a palavra bully é um verbo de origem inglesa, que significa "usar a superioridade física para intimidar alguém". O verbo bully foi associado ao fenômeno bullying, mas, conforme explica Lopes Neto,6a adoção ampliada desse termo foi decorrente da dificuldade em traduzi-lo para diversas línguas.

Para Fante7, o termo bullying não é utilizado em todos os países. Na Noruega e Dinamarca, é conhecido como mobbing, que significa tumultuar; na Suécia e Finlândia, emprega-se mobbing. Na Itália, foi conceituado como prepotenza; na Espanha, intimidación; e, no Japão, utiliza-se yjime.

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Traduzindo para o sentido real da prática da violência, quer dizer: impor a força física superior para afligir e agredir os indivíduos mais fracos, ou seja, atos de violência física ou psicológica, intencionais e repetidos, praticados por um indivíduo ou grupo de indivíduos, causando dor e angústia, sendo executadas dentro de uma relação desigual de poder.

Tais comportamentos não apresentam motivações específicas ou justificáveis, apenas com o intuito de diversão, prazer e poder, para maltratar, intimidar, humilhar e amedrontar suas vítimas, deixando-as indefesas diante da agressão.

Ainda sobre o surgimento do fenômeno bullying, o primeiro pesquisador sobre o assunto, a partir de observações e atos de alunos dentro das escolas, foi o professor Dan Olweus, que iniciou seus estudos na Universidade de Bergan-Noruega, no período de 1978 a 1993. Entretanto, suas pesquisas e estudos só obtiveram grande repercussão após o suicídio de três crianças entre 10 e 14 anos, provavelmente influenciadas por atos de maus tratos dos colegas.

A partir desse fato, a autoridade norueguesa, pressionada pela população, realizou, em escala nacional, a Campanha Anti bullying nas escolas em 1993.

A Pedagoga e escritora Cleo Fante ressalta a importância do pesquisador norueguês ao desenvolver critérios para diagnosticar o bullying:

Dan Olweus, pesquisador da Universidade de Bergan, desenvolveu os primeiros critérios para detectar o problema de forma específica, permitindo diferenciá-lo de outras possíveis interpretações, como incidentes e gozações ou relações de brincadeiras entre iguais, próprias do processo de amadurecimento do indivíduo.8No Brasil, houve adaptação da pesquisa norueguesa pela Associação Brasileira Multiprofissional de Proteção à Infância e a Adolescência (ABRAPIA), em que um questionário foi adaptado de acordo com a cultura nacional, facilitando, assim, a análise do bullying.

Entre os anos de 2000 a 2004, a ABRAPIA pesquisou e constatou que 40,5% dos alunos admitiram estar envolvidos em bullying. Nessa pesquisa foram ouvidos 5.800 alunos de instituições cariocas, sendo duas particulares e nove públicas, do 6ª ao 9ª ano (5ª a 8ª série do antigo ensino fundamental).

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Desse total, 40,5% dos estudantes admitiram que estiveram diretamente envolvidos em atos de bullying, sendo que 16,9% se identificaram como vítimas.

2.1. As formas de Bullying

O bullying apresenta, de modo geral, três situações: bullying físico, bullying verbal e bullying social e/ou relacional. Com o avanço da internet, principalmente das redes sociais, uma nova forma de praticar bullying surgiu, denominada cyberbullying, no entanto, o mais fácil de ser percebido é o bullying físico.

Segundo a Cartilha sobre Bullying do Conselho Nacional de Justiça, o bullying pode se caracterizar das seguintes formas:

Verbal (insultar, ofender, falar mal, colocar apelidos pejorativos, "zoar"); Física e material (bater, empurrar, beliscar, roubar, furtar ou destruir pertences da vítima); Psicológica e moral (humilhar, excluir, discriminar, chantagear, intimidar, difamar); Sexual (abusar, violentar, assediar, insinuar); Virtual ou Cyberbullying (bullying realizado por meio de ferramentas tecnológicas: celulares, filmadoras, internet etc.).9O bullying físico é aquele que, como diz o nome, traz danos físicos para a vítima. O bully, ou agressor, bate, puxa o cabelo, belisca, morde, prende a pessoa em algum lugar ou realiza qualquer outro ato violento por motivo fútil ou sem razão alguma. Como qualquer outro tipo de bullying, ele pode começar na educação infantil e se estender até o ensino médio, agravando no decorrer dos anos, pois o agressor adquire mais malícia e mais força.

O verbal é o tipo mais comum e mais difícil de ser identificado, pela facilidade com que as pessoas dizem coisas impensadas. São as famosas gozações, apelidos, ameaças e fofocas. A diferença entre este tipo de bullying e a mera brincadeira é que na brincadeira todos se divertem com a piada, e no bullying, o alvo da piada sofre.

Outro tipo é o material, que consiste no ato de esconder, sujar, rasgar, estragar, jogar em algum local inacessível, riscar ou danificar os pertences da vítima.

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O moral ou sentimental é parecido com o verbal, mas as principais...

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