Do boudoir ao motel: cultura visual, imagens decorativas e lugares íntimos para o sexo

AutorMarize Malta
CargoProfª. EBA-UFRJ. Doutoranda em História ? UFF
Páginas199-216
DO BOUDOIR AO MOTEL: CULTURA VISUAL, IMAGENS DECO-
RATIVAS E LUGARES ÍNTIMOS PARA O SEXO
Marize Malta
Profª. EBA-UFRJ
Doutoranda em História – UFF
Resumo
O texto discute relações intertextuais entre comportamento, imagens, ambientações
e imaginações, tomando como referência o sexo e os lugares considerados ideais
para sua prática. Espaços íntimos, em casa ou fora dela, com camas e linguagens
visuais específicas, são analisados por meio do que sugerem suas decorações e
representações, do século XVIII aos dias de hoje.
Palavras-chave: cultura visual, atividade sexual, ambientação.
Of boudoir to the motel: visual culture, decorative images and close places for the
sex
Abstract
From the perspective of intertextuality, this text discusses the relationships between
behavior, images, context and imagination, by focusing on sex and the places that
are considered ideal for sexual practices. Spaces of intimacy, both inside and
outside of the home, which are equipped with specific physical and visual props,
are analysed by means of their decorations and representations, from the18th-
century to the present day.
Keywords: visual culture, sexual activity, ambiance.
200 REVISTA ESBOS Nº 19 — UFSC
Qualquer indivíduo pode ser sensato, desde que não tenha
imaginação.
Oscar Wilde
Até o século XVIII, a sociedade européia não considerava imprescindível
retirar-se para um local específico a fim de praticar sexo. Nas camas de aparato
dos reis ou no monte de feno dos camponeses não era necessária a privacidade
de portas vedadas à observação de estranhos nem de decorações de interiores
especiais para o ato sexual. Sabe-se, por exemplo, que o rei de França Luís XIV
deitava-se com madame de Maintenon, a segunda esposa, enquanto conversava
com seu ministro. Contudo, as transformações econômicas, socioculturais e polí-
ticas que se operaram nos setecentos ensejaram novos padrões comportamen-
tais em casa1 e fora dela2, que, pouco a pouco, buscaram na intimidade uma das
formas de individualização do homem coletivo. O sujeito queria estar sozinho ou
ficar com quem desejasse sem a intromissão de quem não havia sido convidado.
Com essa atitude, o sexo se isolava em algum lugar de casa e incrementava-se o
processo de criar imagens porta adentro que evocassem o sexo. Entre quatro
paredes, a atividade sexual passou a ser traduzida por representações visuais
ambientais. Que lugares foram esses? O que incluíam e deixavam de fora para
permitir associações com idéias de sexo?
Se camas e quartos de dormir3 hoje podem suscitar imagens com sexo, é
porque atribuímos a essa combinação - de lugar (o quarto) com objeto (o móvel
cama) - a tradução de práticas sociais vigentes, a representação dominante de
imagens vivenciadas por uma sociedade que tem preferido fazer sexo com portas
fechadas. Mas nem sempre o sexo se faz e se fez associar visualmente em todos
os quartos e camas. Como o quarto de dormir abriga outras atividades além do
sexo e este não é considerado como algo aceitável de ser mostrado em público,
dificilmente a decoração dos quartos inclui apelos visuais que simbolizem as pre-
ferências ou práticas sexuais de seu proprietário. Os dormitórios em geral per-
manecem imaculadamente assentados em representações aceitas pela moral vi-
gente e aparentam, de forma inequívoca, um lugar onde pessoas apenas dormem,
descansam, relaxam.
Imaginemos uma moça que convida, por pura vontade, um rapaz para fa-
zer sexo em seu apartamento; o quarto é decorado do seguinte modo: janelas
cobertas por pesadas cortinas de veludo solferino; cama redonda fartamente es-
tofada; lençóis de cetim vermelho; amplo espelho no teto; carpete macio grená;
paredes revestidas com damasco carmim brocado; luz mortiça. Esses objetos e
revestimentos, nessas cores, nessas condições, nesse lugar, nesse tempo, dessa

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