Mobilidade humana e relações de trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Ocupação do AutorDesembargador do Trabalho de carreira do Tribunal Regional do Trabalho da 8ª Região
Páginas401-408

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1. Efeitos da globalização

Cuidaremos, neste capítulo, de demonstrar os efeitos ou as consequências da atual globalização no mundo em que vivemos, sob dois enfoques principais: a mobilidade humana e as relações do trabalho.

Na primeira, iremos destacar como está se processando, nos dias correntes, a circulação de pessoas, interna e internacional, vista por diversos ângulos da convivência social. No segundo, indicaremos alguns pontos que podem ser identificados como opções para as relações de trabalho como corolário desse processo de globalização, considerando especialmente a situação do migrante.

Uma coisa é possível fixar, desde o início: as modificações introduzidas pela globalização atual, que vão desde mudanças nos sistemas políticos, ideológicos e econômicos aos experimentos culturais, científicos e tecnológicos, são irreversíveis. No ambiente do trabalho, encontra-se a humanidade em uma rua sem saída1, cuja direção é seguir em frente, e enfrentar, corajosamente e com confiança, as adversidades que estão sendo e continuarão a ser encontradas na expectativa de que as dificuldades sejam superadas.

A circulação internacional de trabalhadores, com o problema do trabalhador migrante, é tema que tem ensejado múltiplas conferências e diversas manifestações legislativas internacionais, mesmo porque envolvem em torno de 115 milhões de pessoas, segundo dados da OIT, incluindo 25 milhões de refugiados. Por isso, é uma preocupação que tem motivado importantes debates relativamente aos problemas das imigrações, sobretudo das irregulares, em número cada vez mais elevado. Esses fluxos geram graves problemas, dentre os quais os seguintes: trabalhadores clandestinos ocupando postos no mercado de trabalho do Estado territorial; os seus acompanhantes igualmente procurando o setor laboral para desenvolver; o crescimento das demandas nos serviços de educação e saúde, aumentando o número de enfermidades; a ampliação da quantidade de pessoas subempregadas e o assustador crescimento da economia informal; a incidência de baixos salários porque há mais oferta de mão-de-obra; a ocorrência de remessa de divisas pelos clandestinos para o exterior (o país de origem); a redução dos níveis de segurança pública, e, em consequência, o aumento do número de delitos. Algumas soluções têm sido propostas, incluindo a celebração de acordos regionais, bilaterais ou multilaterais; a redução das diferenças econômicas e sociais e a transferência de tecnologia, sem dúvida a grande barreira.

Ademais, fixemos que, se o número de autorizações para trabalhadores imigrantes regulares no Brasil, em 2013, foi de 62.387, menos que as 73.022 autorizações de 2012, nosso país, registra em torno sessenta mil a trezentos mil estrangeiros indocumentados2, ou seja, clandestinamente instalados. Lembremos que o Estatuto do Estrangeiro (Lei n. 6.815/80) está ultrapassado e que cresce a cada momento a entrada de latino-americanos (especialmente peruanos e bolivianos), africanos e chineses no território nacional, que permanecem à míngua de qualquer proteção.

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2. As migrações humanas

Existem diversas formas de se examinar o fenômeno das migrações humanas. Em síntese inicial, quando tratamos de mobilidade humana significa que estamos verificando a possibilidade de o homem se deslocar de um lugar para outro, pouco importando as condições físicas. Trata-se, ao cabo, de circulação de pessoas.

Existem diversas espécies migratórias: tribais, nacionais ou internas, internacionais, de classes ou individuais, e são diversas as suas causas: políticas, econômicas, religiosas, sociais, étnicas ou aventura.

Do homo sapiens da África, migrando para o Oriente Próximo, de lá para o Ocidente através da Europa, e para o Leste através da Ásia, e daí para a Austrália e, posteriormente, às Américas. Assim teria começado o deslocamento do ser humano.

Hoje, costumamos situar a mobilidade humana conforme o processo migratório que se constata. Assim, a migração permite que sejam identificadas duas situações: se acontece a saída da pessoa de um local para outro, estamos diante da emigração. A entrada da mesma pessoa em outra localidade é identificada como imigração. São as formas mais conhecidas e tradicionais de mobilidade humana.

O que se constata, atualmente, é a existência de alguns tipos de mobilidade que antes já existiam, mas não atraiam a atenção dos estudiosos da forma como nos dias correntes.

Temos a mobilidade urbana, que é a condição em que se realizam os deslocamentos de pessoas e cargas no espaço urbano de uma cidade. Busca-se, pelas políticas de transporte e circulação, a melhoria da acessibilidade e mobilidade das pessoas e cargas nas urbes, melhorando os transportes coletivos e utilizando meios alternativos que permitam inclusão social e sejam adequados ao meio ambiente, evitando tecnologias poluentes que causem danos ecológicos por vezes irreversíveis. Há cidades, especialmente na Ásia, onde é praticamente impossível a vida humana tal como costumamos ter no Brasil. Os índices poluidores são elevadíssimos e a temperatura global ascende a graus insuportáveis. Em São Paulo, v.g., em outubro deste ano de 2014, alcançou 41,5º C em um dia, e caiu para menos de 18º C no dia seguinte.

Em nosso país, a Lei n. 12.587, de 2012, fixou as diretrizes da Política Nacional de Mobilidade Urbana, destacando-se a que prevê a integração entre as cidades gêmeas localizadas na faixa de fronteira com outros países sobre a linha divisória internacional, o que nos leva à circulação internacional de pessoas.

A mobilidade social significa a mudança de posição social sem que se altere o grupo ao qual pertencemos. É a vivência do homem na sociedade, onde se constata possibilidades de troca, ascensão ou rebaixamento de uma pessoa no meio em que vive.

Esse tipo de mobilidade existiu no passado. No feudalismo, a sociedade estratificada de então possuía categorias próprias, cujos estratos eram dos clérigos, dos nobres e dos servos. Mudou essa visão na atualidade, onde passamos a adotar valores liberais e princípios democráticos.

Em algumas culturas, especialmente nas orientais, a posição social decorre da descendência familiar ou algum tipo de papel político-religioso desempenhado. Em outras, ainda há a ascendência do homem sobre a mulher, mo-vida essa discriminação geralmente por fatores religiosos, o que é facilmente constatável nas diversas celebrações litúrgicas orientais. Seria uma espécie de mobilidade familiar, modificável em razão de sexo.

Anotamos que existe a mobilidade ascendente, representada pelo acúmulo de riqueza, apesar de, lentamente, começar a haver uma distribuição menos desigual dessa riqueza entre a população. A descendente é quando ocorre o inverso: a perda de seus recursos e seu consequente empobrecimento.

Essa mobilidade social pode ser também horizontal ou vertical. A primeira refere-se às alterações no status social, como, v.g., o casamento modificando o estado civil das pessoas. A vertical, por sua vez, importa em modificar a classe social a que se pertence: alguém, desempregado e endividado, que recebe um grande prêmio em dinheiro e, de inopino, fica milionário.

Outros dois tipos migratórios são os pendulares e a transumância. As migrações pendulares não têm o caráter permanente da migração, e, portanto, dela não se trata. São deslocamentos específicos, como aqueles que se realizam entre cidades para o trabalho (da cidade dormitório para a cidade do labor); ou em períodos de viagens de férias ou de trabalho eventual. A transumância é o deslocamento temporário de uma população motivado por fatores econômicos ou sazonais, decorrentes de mudanças climáticas. É periódica e frequente no nordeste brasileiro (entre Zona da Mata e Sertão). Ademais, guarda semelhança com o refugiado ambiental, situação que está

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afligindo notadamente os moradores dos países insulares do Pacífico, face à elevação do nível dos oceanos e o iminente desaparecimento de suas pátrias. Tuvalu é um desses casos3.

3. Formas específicas de mobilidade humana

Quando se cuida de mobilidade...

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