Mesa de debates 'A' - Sistema tributário

AutorMalvina Corujo Azevedo Lopes
Páginas19-37

Page 19

Princípios da Moralidade, Razoabilidade, Proporcionalidade e Eficiência: Aspectos Práticos

Prof. Estevão Horvath - Coube-me falar sobre "Princípios da Moralidade, Razoabilidade, Proporcionalidade e Eficiência: Aspectos Práticos". É a velha questão dos princípios, que cada dia está mais movendo o campo jurídico, não só nacionalmente, mas também internacionalmente, essa discussão acerca dos princípios e da importância dos princípios na elaboração da norma jurídica - para quem entende que ordenamento jurídico, de como o sistema é construído - ou na interpretação do ordenamento jurídico, de como ele é construído.

Seja qual for a idéia que se tenha de um sistema, de um ordenamento jurídico, há alguns modos que são seguidos para estruturar esse ordenamento e para dele extrair o que ele tem, o que é aplicável sobre determinada matéria, sobre determinado assunto.

Eu diria que o que nos vai interessar ressaltar a respeito dos princípios (vou usá-los no sentido de norte de interpretação) é que eles são normas jurídicas - portanto, sendo imperativos cogentes -, e não são meras recomendações.

Como dizia o saudoso Prof. Geraldo Ataliba, com relação à Constituição: a Constituição não é uma Carta de sugestões, não é um cardápio: ela determina, ela man-da, ela obriga; ela não sugere, simplesmente, não recomenda. E o que os princípios têm de diferente daquilo que normalmente se contrapõe a eles - as "simples" regras -, que é a sua conflituosidade. Normalmente se diz que quando duas regras estejam em conflito uma delas tem que ser retirada do sistema de alguma maneira. E dos princípios não: quando eles, aparentemente ou de fato, entram em conflito (há realmente alguns princípios que aparentemente apontam um para o norte e outro para o sul), nós temos que procurar sopesar esses princípios e, naquela situação concreta (não vejo como ser diferente, a não ser utilizando cada situação concreta), verificar o que pesa mais naquilo e fazer prestigiar aquele princípio com relação ao outro, sem retirar o outro do sistema.

Começando pela moralidade - que é um princípio que, se nós quiséssemos remontar à velha escola exegética dos "princípios gerais do Direito", ele se enquadraria, deveria estar implícito, em todo Direito, de qualquer lugar do mundo. Na nossa Constituição de 1988 veio previsto em primeiro lugar, pela primeira vez no texto, no art. 5o, quando trata da ação popular, que reza, no inciso LXXIII: "qualquer cidadão é parte legítima para propor ação popular que vise a anular ato lesivo ao patrimônio público ou de entidade de que o Estado participe, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural, ficando o autor, salvo comprovada má-fé, isento de custas judiciais e do ônus da sucumbência".

Page 20

Também é tratado em relação ao crime de responsabilidade do Presidente da República, nos termos do art. 85, que prescreve:

"São crimes de responsabilidade os atos do Presidente da República que atentem contra a Constituição Federal e, especialmente, contra: (...) V- a probidade na administração."

Quer-nos parecer que discorrer sobre a moral seria, além de contraproducente -porque não haveria tempo -, também praticamente inútil, porque jamais chegaríamos a um denominador totalmente comum com relação a todos que estão aqui participando, porque cada um terá seu conceito de moral, embora exista uma zona extrema, e que todo mundo vai saber quando se trata de uma atitude moral, quando se trata de uma atitude imoral.

Moralidade significa a exigência de um mínimo ético a pautar a conduta do Estado e dos contribuintes. Isto, diria eu, decorre - aplicado ao direito tributário - do princípio republicano, como falaria - imagino eu - o Prof. Geraldo Ataliba. Quer dizer, se o Estado é uma criação dos cidadãos que o compõem, não há como imaginar que a criatura se volte contra do criador.

Daí, então, o Estado tem que se pautar com regras de ética com relação àquilo que ele próprio cria e com relação aos cidadãos - no caso aos cidadãos-contribuintes, no que se refere ao direito tributário.

E aqui eu trouxe uma definição de ética tributária da Profa. Regina Helena Costa que me pareceu bastante interessante, em que ela diz que "é o conjunto de princípios e regras que devem ser observados pelo legislador e pelo administrador tributários, que lhes impõem, mais que a estrita obediência às leis, o prestígio aos valores de probidade, lealdade, boa-fé, decência e justiça, enfim". Ali está outro valor, outro conceito, outro princípio inspirador de todo o ordenamento jurídico, sobre o qual se poderia discutir, aqui, durante horas e não se saber exatamente o que é: a justiça - embora cada um tenha seu conceito individual e interno de justiça.

Moralidade, no plano legislativo, significaria a razoabilidade da tributação -com o quê eu concordo plenamente, e creio que esse princípio da razoabilidade é o que paira, na verdade, sobre todo o restante.

No plano administrativo, no que concerne ao direito tributário - arrecadação e fiscalização -, esse princípio da moralidade desembocaria na impessoalidade. Porque - vamos um pouco mais para trás - o que é o direito tributário se não, como já dizia o Prof. Geraldo Ataliba (e muitos outros grandes autores), uma parcela do direito administrativo? É a parte do direito administrativo que cuida das receitas públicas do Estado, das receitas tributárias do Estado.

E, dentro disso, ele tem uma parte peculiar, própria, que é o tributo em si. O restante - que é absolutamente fundamental para que o tributo exista, que ele seja criado, que ele seja cobrado, principalmente fiscalizado, arrecadado - é a porção que denominaríamos de "administrativa" do direito tributário, que tem por nome "direito tributário formal", que justamente vai cuidar da fiscalização, da arrecadação, das chamadas "obrigações acessórias", que são instituídas no interesse da fiscalização e da arrecadação, e que têm que levar em consideração a impessoalidade (que me parece claro decorrer da moralidade).

Moralidade administrativa, prevista também no art. 37 da CF, mas que se espraia - se não fosse só por intuição a dedução disso - ao direito tributário desde o momento em que se reconhece que ele é uma parcela do direito administrativo. Em rigor, a moralidade se espraia por todo o ordenamento jurídico.

Passando à eficiência - até porque rapidez vale, de acordo com o pouco tempo que nós temos, não cinco minutos, como ressaltou a Profa. Malvina, mas é quase isso, para tratar de um tema tão longo. Os

Page 21

Srs. percebem que todos esses princípios que me foram sugeridos para aqui falar constituem, além de princípios, conceitos indeterminados.

Assim, falar sobre moralidade, sobre eficiência, sobre razoabilidade, sobre proporcionalidade, é trilhar caminho de areia movediça, na realidade. Vou, então, procurar trazer o que existe de mais concreto ou, pelo menos, de menos abstrato com referência a essas circunstâncias, a esses postulados.

Para falar sobre eficiência, já iniciaria invocando o art. 37 da Carta Magna, que a ela se refere expressamente nos seguintes termos:

"A Administração Pública direta e in-direta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (...)."

Nós a encontramos outra vez, de forma expressa, na Constituição na parte em que ela trata dos recursos públicos, do controle dos recursos públicos, quando o Tribunal de Contas pode controlá-los, a partir da economicidade. A eficiência também está mencionada em outros momentos, mas aqui eu me refiro à sua ligação com a economicidade - economicidade no seu aspecto mais singelo, que consistiria na relação custo/benefício: com o menor custo possível, atingir-se o melhor que se pode fazer com aqueles recursos.

A Profa. Maria Sylvia Zanella Di Pie-tro diz que o princípio da eficiência pode ser considerado com referência ao modo de atuação do agente público e com relação ao modo de organizar e estruturar a Administração Pública. Quanto ao modo de atuação do agente público, dele se espera o melhor desempenho possível de suas atribuições, para obter os melhores resultados. E com relação ao modo de organizar, estruturar e disciplinar a Administração Pública, também com o objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do serviço público.

Tragamos isso também para o direito tributário (não no serviço público, naquele sentido do direito administrativo propriamente dito, mas como uma atuação do Estado).

A ação de tributar é uma atuação do Estado, e tem que ser realizada, como todas as demais atuações do Estado, de forma eficiente.

Eu trouxe, a título ilustrativo, um parágrafo da Profa. Regina Helena Costa, do seu livro sobre Praticabilidade, que é um livro muito bom e cuja leitura eu recomendo vivamente. Este trecho trata, na realidade, de todo o contexto do Direito Tributário.

Primeiramente, vejamos o que ela denomina de "dever de eficiência". Pode ser, parece ser, uma sutileza terminológica, mas creio que é muito significativo. O princípio da eficiência, na verdade, é um "dever da eficiência".

Constitui exigência do princípio da finalidade pública ou da supremacia do interesse público sobre o particular, segundo o qual a Administração Pública somente está legitimada a perseguir resultados de interesse coletivo. Deste modo, se a eficiência de determinada atuação, em qualquer contexto - portanto, em matéria tributária também -, é mensurável à vista da obtenção do resultado para o qual foi concedida, tratando-se de atividade administrativa, esta somente poderá ser reputada eficiente quando atender ao interesse público, por...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT