Memorial na ADPF 320

AutorCentro de Estudos sobre Justiça de Transição da UFMG
Páginas135-182
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MEMORIAL NA ADPF 320
Centro de Estudos sobre Justiça de Transição da UFMG
Resumo: O memorial que se segue apresenta os argumentos tra-
zidos pela Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Po-
líticos do Instituto de Estudos sobre Violência do Estado – IEVE,
por meio do Centro de Estudos sobre Justiça de Transição, para
sua admissão no feito da ADPF 320. Com este ingresso, busca-se
demonstrar os fundamentos para o julgamento de procedência do
pedido formulado pelo PSOL quanto ao reconhecimento de que a
Lei de Anistia de 1979 não deve constituir obstáculo para a inves-
tigação e processamento de agentes públicos por graves violações
de direitos humanos ou crimes contra a humanidade, assim como
por crimes de desaparecimento forçado ou sequestro, praticados
durante a ditadura de 1964-1985, impedindo qualquer exegese que
possa ocasionar extinção de punibilidade por anistia ou prescrição,
assim como o julgamento de procedência do pedido do Exmo. Sr.
Procurador-Geral da República no sentido de que, nos termos do
art. 10 da Lei 9.882/1999, haja “(...) comunicação a todos os poderes
de que a persecução penal de graves violações a direitos humanos
deve observar os pontos resolutivos 3, 5, 9 e 15 da sentença da Cor-
te Interamericana de Direitos Humanos em face do Brasil no caso
GOMES LUND, em razão de seus efeitos vinculantes para todos os
órgãos administrativos, legislativos e judiciais do Estado brasileiro.
A COMISSÃO DE FAMILIARES DE MORTOS E DE-
SAPARECIDOS POLÍTICOS DO INSTITUTO DE ESTUDOS
SOBRE VIOLÊNCIA DO ESTADO – IEVE, portadora do CNPJ
73946055/0001-62, com endereço na Rua Coração da Europa, 1.395,
Bairro Bela Vista, São Paulo/SP, com o auxílio do CJT – CENTRO
DE ESTUDOS SOBRE JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO, grupo de
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Justiça de transição em perspectiva transnacional
pesquisa voltado aos estudos da justiça de transição no Brasil e no di-
reito comparado, e por intermédio de seus advogados devidamente
constituídos nos termos da procuração anexa, vem respeitosamente,
requerer seu ingresso no feito em epígrafe, na condição de amicus
curiae, nos termos do art. 7º, § 2o, da Lei 9.868/1999.
Apresenta, desde já, MEMORIAL, requerendo sua devida
autuação, bem como o julgamento de procedência do pedido feito
pelo PSOL – PARTIDO SOCIALISMO E LIBERDADE, no sentido
de reconhecer a obrigação dos órgãos do Poder Judiciário brasileiro
de respeitar a decisão da Corte Interamericana de Direitos Humanos
no Caso Gomes Lund, permitindo a investigação e persecução penal
de agentes públicos por crimes contra a humanidade praticados du-
rante a ditadura de 1964-1985, nos termos da presente ARGUIÇÃO
DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL 320.
O Partido Socialismo e Liberdade (doravante PSOL) propôs a
presente arguição de descumprimento de preceito fundamental vi-
sando a que este Egrégio Supremo Tribunal Federal declarasse que
a Lei 6.683/1979 não se aplica às “(...) graves violações de direitos
humanos, cometidos [sic] por agentes públicos, militares ou civis,
contra pessoas que, de modo efetivo ou suposto, praticaram crimes
políticos; e, de modo especial, que tal Lei não se aplica aos autores de
crimes continuados ou permanentes, tendo em vista que os efeitos
desse diploma legal expiraram em 15 de agosto de 1979 (art. 1º)”
(destaques do original). Requereu-se, também, que esta Colenda
Corte determinasse o cumprimento por todos os órgãos do Estado
brasileiro de todos os pontos decisórios da conclusão da Sentença da
Corte Interamericana de Direitos Humanos (doravante CteIDH) no
Caso Gomes Lund v. Brasil (“Guerrilha do Araguaia).1
Foram admitidos no feito, na qualidade de amici curiae,
o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil (CONIC) e o
Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (CFOAB).
O Conselho Federal de Serviço Social manifestou-se repudiando
1. CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Caso Gomes Lund e
Outros (“Guerrilha do Araguaia”) vs. Brasil. Sentença de 24 de novembro de 2010.
Disponível em: .cr>. Acesso em: 1º jan. 2011.
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Justiça de transição em perspectiva transnacional
a anistia para crimes de lesa-humanidade praticados pela ditadura
civil-militar. O Procurador-Geral da República apresentou parecer
manifestando-se pelo conhecimento e procedência parciais dos pe-
didos formulados na ADPF 320. Prestou informações o Congresso
Nacional. A Presidência da República manifestou-se demonstrando
ciência em relação às ações penais propostas pelo MPF que visam
à responsabilização por crimes contra a humanidade, indicando a
impossibilidade de anistia e prescrição para tais atos. Em sua ma-
nifestação, a Advocacia-Geral da União também busca demonstrar
que não têm sido constituídos por parte do Poder Executivo óbices à
propositura de tais ações.
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A Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos Políticos do
Instituto de Estudos sobre Violência do Estado – IEVE – vem há dé-
cadas lutando no Brasil para o esclarecimento de mortes e desapare-
cimentos forçados ocorridos no contexto da ditadura de 1964-1985.
Com a abertura da Vala Clandestina de Perus, em 1990, em São Pau-
lo, seus trabalhos se intensicaram. O IEVE tem como objetivos:
(...) promover a continuidade das investigações sobre as cir-
cunstâncias das mortes e localização dos restos mortais das
vítimas da ditadura militar, dando prosseguimento às pes-
quisas nos arquivos da polícia política, os DOPS, e demais
arquivos e locais que as possibilitem. Tem como objetivos,
também, identicar os responsáveis pela tortura, assassina-
tos e ‘desaparecimentos’ políticos e incentivar medidas judi-
ciais para a reparação moral e material das vítimas da repres-
são política. Pretende, também, organizar e fornecer fontes,
incentivar pesquisas acadêmicas, jornalísticas e da sociedade
em geral, contribuindo para o debate e o desvendamento da
história do passado recente do Brasil.2
2. Cf. http://www.desaparecidospoliticos.org.br/quem_somos_instituto.php?m=2.
Acesso em: 26 jan. 2015.

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